A mídia é acusada de
promover campanha difamatória contra o Judiciário e a Magistratura, mas
não é razoável entender que há algo de errado – ou que represente uma
campanha difamatória intencional – em noticiar fatos que sugerem
suspeita de irregularidades no poder público.
Em mais de 20 anos, no Brasil, o direito à livre manifestação do
pensamento não era plenamente garantido pela Constituição, o que somente
ocorreu a partir de 05.10.1988. Hoje, qualquer um, por mais absurda que
seja sua opinião, tem acesso a vários meios para sua manifestação, em
particular em páginas da web. É bem verdade que a grande maioria nada
tem a dizer, além de se meter a opinar sobre o que não conhece de fato,
mas pode dizer. É inerente ao regime democrático.
Imprensa livre sim, ainda que, vez ou outra, possa não ser justa; que,
num ou noutro caso, parte dela não esteja comprometida com interesses
nobres. Ruim com ela, pior sem ela, lembrando um velho adágio.
Incompreensível a reação de parte dos magistrados e das suas
associações, assim como de alguns dirigentes de tribunais: em vez da
preocupação com a gravidade – e veracidade ou não - das denúncias,
voltam sua artilharia contra a mídia, acusando-a de promover campanha
difamatória contra o Judiciário e a Magistratura.
Recentemente, reunidos em Brasília, estes últimos (dirigentes) emitiram
nota pública que parece prestar homenagem à sedutora teoria da
conspiração, tão frequente na literatura. Com efeito, atribuem o que
supõem ser uma crise de credibilidade institucional à suposta obra – e
influência na mídia - de alguns dos acusados no famoso processo do
mensalão, na iminência de serem julgados pelo Excelso STF. Genuína
mudança (corporativa?) de foco, ou talvez incapacidade de compreender a
história de nossas instituições, suas virtudes e suas imperfeições.
Não é razoável entender que há algo de errado – ou que represente uma
campanha difamatória intencional – em noticiar fatos que sugerem
suspeita de irregularidades no poder público. O que não pode é distorcer
os fatos, acusar sem provas e incentivar julgamentos apressados. A
sociedade democrática deve funcionar assim mesmo, independentemente se a
informação atinge membros do Executivo, do Legislativo ou do
Judiciário. Os bons, honestos e éticos devem apoiar as investigações
e/ou operações que tenham por fim fazer esta limpeza, caso a sujeira
fique comprovada. E que tudo chegue ao conhecimento da opinião pública,
claro, desde que as garantias individuais contempladas na Constituição
sejam respeitadas e do mesmo modo o devido processo legal.
A informação transparente e imparcial é salutar e se harmoniza com a
democracia. Os excessos no exercício do direito de informar devem ser
apurados caso a caso e rechaçados na forma da lei. A imagem ou a
reputação da instituição somente é atingida de forma indireta. Mesmo
assim, isso só ocorre quando a opinião pública não se dá conta de que as
investigações se dirigem contra alguns poucos membros num universo
formado por milhares de pessoas, e não contra todos, ou a maioria, e nem
é dirigida contra o Poder Judiciário, em sua dimensão institucional.
Não se pode responsabilizar quem informa pelo modo como o leitor recebe a
notícia e a interpreta, ou seja, pela opinião que venha a formar com
base na notícia. Paciência que muitos venham a generalizar e a criticar
de modo injusto todo o conjunto e não apenas as partes podres dele. Isso
é um risco que se corre quando se faz opção pela democracia e pelas
garantias que lhe são próprias.
Se não fizemos nada de errado, se cumprimos nossos deveres e temos
convicção da ética e do acerto de nossos atos, temos que nos preocupar
mais com nossas consciências que com nossa reputação. Nenhum dos poderes
da república é soberano, no sentido de ostentar imunidade e proteção
contra a transmissão de notícias desagradáveis, que, eventualmente,
possam atingir sua imagem e reputação perante a sociedade, especialmente
se refletem os fatos como se passaram, sem julgamentos precipitados.
Causa constrangimento e indignação em quem é honesto?
Sim, porém, o que
se pode fazer?
Proibir a imprensa de noticiar?
Defender os que estão
errados?
Creio que não. Quanto mais luz for lançada sobre assuntos desta
natureza, de manifesto interesse público, melhor.
Que aprendamos a
conviver com isso!
Mauro Vasni Paroski
Juiz
do Trabalho titular da 7ª Vara do Trabalho de Londrina (PR).
Especialista em Direito Civil e Direito Processual Civil. Mestre em
Direito Negocial pela Universidade Estadual de Londrina (PR). Doutorando
em Direitos Sociais na Universidade de Castilla-La Mancha, em Ciudad
Real (Espanha).
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