Acabo de ler e ver reportagens sobre dois assuntos, que não sei se são um só.
Uma, no Estadão,
sobre as remunerações de até centenas de milhares de reais percebidas
por juizes e desembargadores em São Paulo e no Rio de Janeiro.
Outra, na Folha e no Viomundo, sobre a violência e o desrespeito aos pobres moradores expulsos do Pinheirinho.
Para quem, ainda criança, viu atearem fogo e lançarem cães contra os
favelados da Praia do Pinto e do Morro da Catacumba, há 40 anos, é como
descrer no progresso humano.
Ontem mesmo o Estadão publicava que os nobres desembargadores
consideravam uma violência ser exposto ao público o fato de que alguns
deles – nem se discute se com origem legal ou não – terem movimentações
imensas em suas contas bancárias, embora nome algum tenha sido revelado,
porque as investigações são feitas dentro da prudência da lei, que deve
preservar a todos.
E quem preserva essa pobre gente e seus filhos? Crianças, que os
senhores juízes, quando são seus filhos, cuidam com tanto empenho, com
tantas babás, boas creches, escolas de qualidade e todos os mimos e
carícias?
Suas Excelências, decerto, não são monstros e não deixam de saber que
– não importa que ganhem muito bem por seu trabalho – do fundamento
jurídico da igualdade humana e dos princípios constituicionais da
proteção aos direitos humanos e, sobretudo, das crianças. Inclusive e,
especialmente, das pobres, que não têm senão o Estado para tutelar seus
direitos mais comezinhos.
O que ocorreu em Pinheirinho não se passou no interior de Rondônia,
nas selvas do Pará, ou em outro lugar remoto do qual se pudesse dizer
estar além das fronteiras da compreensão moderna da aplicação da lei
como instrumento de proteção a direitos – e os sociais sempre se
sobrepõem, do ponto de vista do Estado, aos individuais, embora não
possam anula-los – e não a privilégios.
A Suprema Corte brasileira, que considerou relevante proteger os
direitos do Sr. Daniel Dantas, para que este não fosse exposto com
algemas nas mãos, acha correto disparar balas de borracha – nem falo das
de verdade, que se disparou também – contra mulheres e crianças? A
Justiça brasileira acha correto contribuir para o risco de promover
outra Eldorado dos Carajás ali pertinho da maior metrópole do hemisfério
Sul?
O que está acontecendo com o Direito e a Justiça deste país?
Quando se trata de pressionar o Governo Federal para conceder
aumentos ao Judiciário, há declarações públicas, tratativas políticas o
apelo ao bom funcionamento de uma instituição da República.
Quando se trata de defender seus mais frágeis jurisdicionados nem
mesmo um apelo à moderação, à humanidade, ao bom-senso. Havia, na ordem
mandatória do despejo, alguma determinação de que houvesse assistência
social, preparação dos serviços públicos para encaminhar as pessoas a
casas, as crianças a escolas, os carentes à assistência devida?
Ou apenas para enxotá-los, como se fossem cães?
Será que precisamos de um novo Sobral Pinto para constranger a
Justiça brasileira, pedindo que se aplique aos seres humanos do
Pinheirinho a lei de proteção aos animais?
O ovo da serpente, ao qual se referiu a Ministra Eliana Calmon,
eclodiu em São José dos Campos.
Um Judiciário – porque seria desonroso
chamar a isso de Justiça – que é algo que já não se rege nem pela
moralidade e nem mesmo pela humanidade.
Há um campo de refugiados em São José dos Campos.
Lá estão os flagelados.
Não da seca, não das chuvas.
Os flagelados do Judiciário brasileiro, que repete a olímpica indiferença de Maria Antonieta.
Brizola Neto - tijolaço
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