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domingo, 15 de janeiro de 2012

"Mudemos todos ou não mude ninguém"


Sempre fui favorável ao controle externo do Poder Judiciário. 
Mauro Cappelletti sustentou que os juízes exercitam poder e onde há poder deve haver responsabilidade. Poder não sujeito a prestar contas representa uma patologia ("Juízes irresponsáveis?", 1989, p. 18). Igualmente, Norberto Bobbio assinalava ser um dos princípios básicos do Estado Constitucional a adoção do caráter público como regra e do segredo como exceção ("O futuro da democracia: uma defesa das regras do jogo", 1989, p. 86-87).

Foi notável avanço a criação do Conselho Nacional de Justiça pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004. O CNJ adotou medidas moralizantes, com destaque para a proibição da prática do nepotismo na Justiça brasileira. A vedação repercutiu nos demais Poderes e em todos os níveis federativos.

Contudo, a organização não governamental Contas Abertas divulgou levantamento dos gastos do CNJ com passagens aéreas, diárias, festas, homenagens e publicidade, nos oito primeiros meses de 2011 (
"O Estado de S. Paulo", 16.10.2011, editorial). O indignado cidadão brasileiro pergunta: quem vigia o guardião da boa conduta do Judiciário?

Ademais, o CNJ e as associações de classe dos magistrados deveriam desenvolver campanhas educativas da população sobre o papel do Poder Judiciário. Para transformar a Justiça é preciso que se transforme também a conduta da sociedade brasileira. Mudemos todos ou não mude ninguém.

Sou magistrado há vinte e dois anos e sempre me pautei pela conduta ética. Não me envergonho de revelar que juízes recebem pedidos a todo instante. Qualquer cidadão tem um parente, amigo ou “amigo do amigo” de um magistrado. Usando esses canais, pede “uma mãozinha” no julgamento do seu processo. Como a Justiça brasileira é muito lenta, admitem-se pedidos de mera agilização do andamento das causas. Porém – lamento dizer - na maioria das vezes o “jeitinho” almejado, explícita ou implicitamente, é a decisão a favor do postulante, ainda que contra a lei. Os juízes honestos suportamos recorrentemente o constrangimento de dizer não a esses assédios imorais.

A tão reclamada moralidade é esquecida, para prevalecer o famoso “jeitinho brasileiro”. E concluímos: o Poder Judiciário, o Conselho Nacional de Justiça e as instituições em geral são o espelho da sociedade brasileira.



Rogério Medeiros Garcia de Lima, Desembargador do Tribunal de Justiça de Minas Gerais, doutor pela UFMG e professor universitário (*).

(*) Texto publicado originalmente jornal "O Tempo", de Belo Horizonte

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