Em setembro do ano passado, os ministros do Supremo Tribunal Federal
(STF) entenderam em tirar de pauta e aguardar melhor oportunidade para
julgar matéria constitucional sobre a competência do Conselho Nacional
de Justiça (CNJ), em face de provocação realizada pela Associação de
Magistrados Brasileiros (AMB).
O CNJ foi criado em dezembro de 2004 e o STF, ao adiar
o julgamento, deixou claro que não havia urgência na definição da
competência.
Na ocasião do adiamento tramitavam 55 procedimentos apuratórios na
corregedoria do CNJ, sendo 17 sobre questões relativas a patrimônios
suspeitos.
O CNJ, nos anos de atividade, havia sancionado vários magistrados,
incluído o ministro Paulo Medina, acusado de vender liminares. A
propósito, Medina fora presidente da AMB e recebeu a sanção mais
grave em vigor na Lei Orgânica da Magistratura, o “prêmio” da
aposentadoria compulsória, com vencimentos proporcionais ao tempo de
serviço. No caso Medina, vencimentos iguais aos dos ministros da ativa
do Superior Tribunal de Justiça.
No dia do encerramento do ano judiciário de 2011, quando não havia
mais possibilidade de uma reunião plenária, o ministro Marco Aurélio,
com uma medida liminar, entendeu urgente o que não era. Com a liminar
suspendeu toda a atividade correcional do CNJ e as correições em curso
foram abortadas, como a que se realizava no Tribunal de Justiça de São
Paulo.
Um velho entendimento do ministro Marco Aurélio, encampado pela
AMB relativo à falta de autonomia da atividade correcional do CNJ, virou
imperativo. Assim, interromperam-se as correições e a liminar
“aureliana” fez a alegria dos apenados por faltas funcionais e já
afastados da carreira de magistrado, pois possibilita anulações.
Para arrematar, o ministro Ricardo Lewandowsky deu liminar específica
que proíbe a corregedoria do CNJ de analisar a regularidade de
benefícios de natureza patrimonial recebidos por magistrados paulistas.
A blindagem completa, no entanto, representou a gota d’água para a
indignação de uma sociedade civil que quer transparência e consolidação
democrática. As duas liminares, que não eram urgentes e não poderiam ter
sido concedidas, causaram danos irreparáveis à imagem do Judiciário.
As reações contra a blidagem corporativa moveu iniciativas como a da
Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-federal). E até dados sobre
movimentações atípicas de magistrados e serventuários vieram à tona.
Essa movimentação decorreu de verificações, determinadas pela
corregedoria do CNJ, feitas pelo Conselho de Controle de Atividades
Financeiras (Coaf).
O Coaf é órgão de inteligência financeira (não de policia judiciária
criminal) criado em 1998 com o dever de vigilância. Dessa forma, o Coaf
tem o poder-dever de verificar movimentações fora do patrão
habitual, atípicas. Uma movimentação atípica, como o recebimento de
herança ou prêmio de loteria, é comunicada pelo Coaf para apuração do
órgão competente e diverso.
No momento, como relatado pelo jornal Folha de S.Paulo
na edição de hoje, conselheiros do CNJ preparam uma emenda regimental
para tirar do presidente do órgão (o presidente do CNJ é sempre o
presidente do STF e, no momento, o cargo é exercido pelo ministro Cezar
Peluso) atribuições exclusivas. A meta é permitir que os conselheiros
possam determinar providências voltadas à transparência nos tribunais
e também escolher o secretário-geral do CNJ.
Por outro lado, a tirada de pauta da análise da emenda constitucional
do senador Demóstenes Torres pela Comissão de Constituição e Justiça do
Senado, graças ao empenho de Renan Calheiros, Romero Jucá e outros do
PMDB, gera inconformismo entre parlamentares. A emenda deixa clara a
autonomia apuratória do CNJ. No reinício dos trabalhos parlamentares a
Comissão será pressionada a opinar e permitir a tramitação da emenda
O ministro Marco Aurélio, por evidente, pode e deve defender a tese
que quiser. Só não pode mudar — sem urgência e por liminar — um
sistema que há anos funciona com bons resultados. Mais ainda, mudar
sozinho o que seus pares decidiram não julgar em setembro passado.
Pano Rápido. Marco Aurélio maculou a imagem do
Judiciário e passou a ideia de que os magistrados temem correições e são
contrários à transparência. O biombo da questão da competência,
alardeada pela AMB e encampada por Marco Aurélio, pega muito mal perante
a opinião pública esclarecida.
Wálter Fanganiello Maierovitch
Nenhum comentário:
Postar um comentário