Se qualquer um de nós, cidadãos comuns, sofresse a acusação que o
hoje desembargador Francisco Orlando de Souza sofreu em 10 de outubro do
ano passado de parte do então delegado da Polícia Civil de São Paulo
Frederico Costa Miguel, estaria em maus lençóis.
Dirigir sem habilitação e embriagado, desacatar, desobedecer,
ameaçar, difamar e injuriar a autoridade policial são os crimes dos
quais o delegado acusou oficialmente (via Boletim de Ocorrência) o então
juiz de Direito após ele se envolver em uma briga de trânsito.
No último fim de semana, um amigo do delegado entrou em contato
comigo pelo Facebook pedindo repercussão do caso. Passou-me seu
telefone. Liguei e após longa conversa decidi pesquisar mais o assunto. O
que descobri me surpreendeu, indignou e preocupou.
As acusações contra o magistrado estão no Boletim de Ocorrência nº
13.913/2011. De acordo com o registrado, o juiz e outro motorista
começaram brigar no trânsito. Quando passaram pela porta da delegacia, o
outro motorista teria parado por sentir-se ameaçado pelo juiz.
Investigadores, de dentro da delegacia, ouviram a confusão e saíram à
rua. Viram o juiz esmurrando o vidro do carro do motorista com quem
discutia. Segundo relatam, quando se aproximaram o juiz passou a
agredi-los verbalmente.
O delegado chega e determina que todos entrem na delegacia. Diante de
várias testemunhas, Orlando de Souza se identifica como juiz e passa a
fazer ameaças enquanto se recusa a colaborar com a elaboração do Boletim
de Ocorrência. O delegado lhe dá voz de prisão.
Dois dias depois (12 de outubro), o presidente do Tribunal de Justiça
de São Paulo, José Roberto Bedran, em sessão especial daquela Corte
defende a nomeação de “delegados especiais” para cuidar de casos que
envolvam magistrados.
Cerca de uma semana mais tarde, o mesmo Tribunal de Justiça de São
Paulo decide promover a desembargador o juiz acusado de tudo isso. Com o
novo cargo, ele terá foro privilegiado para ser processado e julgado.
Paralelamente, no mesmo período o Conselho da Polícia Civil se reúne
rotineiramente para a última avaliação do delegado Costa Miguel, que
como todo delegado em início de carreira estava em experiência. Apesar
de ter tido a sua efetivação recomendada pela Corregedoria da Polícia, o
Conselho delibera pela sua exoneração.
Em questão de dias após a confusão em que o juiz suspeito de
embriaguês ao volante se envolveu, o Tribunal de Justiça toma medidas
para fortalecê-lo e a cúpula da Polícia Civil dá início a um processo
que culminaria com a demissão do delegado que tentou cumprir a lei.
Esse caso cria uma espécie de “jurisprudência” da impunidade. O agora
ex-delegado Costa Miguel está literalmente desempregado. Tudo o que fez
para chegar ao cargo (faculdade, concurso etc.), foi jogado fora. Que
outro delegado – ou mesmo policial – incomodará juízes que infrinjam a
lei?
Eduardo Guimarães - cidadania.com
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