O sonho da casa própria está virando um pesadelo para as famílias
do conjunto habitacional Paulo Gomes Romeo, em Ribeirão Preto, interior
paulista. As cerca de 200 casas populares, entregues pelo governador
Geraldo Alckmin em dezembro, apresentam variadas falhas de construção,
mas mesmo assim foram ocupadas pelos moradores contemplados.
Após receber muitas queixas, o diretor regional da CDHU (Companhia de
Desenvolvimento Habitacional e Urbnano), Milton Vieira de Souza Leite,
foi fazer uma inspeção na manhã de quinta-feira para ver o que estava
acontecendo.
E chegou a uma inacreditável conclusão: "as casas são boas,
os pobres que foram morar nelas é que estão estragando tudo".
"A gente conhece o nível de educação dos moradores. O pessoal veio da
favela. Não está acostumado a viver em casa", afirmou o sábio, em
entrevista gravada pela repórter Gabriela Yamada e publicada na "Folha"
desta sexta-feira.
E disse mais: "Você não consegue mudar a educação delas somente
mudando de local". Para ele, seria necessário um trabalho social a longo
prazo para ensiná-las a morar numa casa.
Entre outras barbaridades, Souza Leite insinuou que, além de ignorantes, os moradores são tarados e vagabundos.
Ao falar do caso de uma moradora que reclamou da pia da cozinha ter
caído ao colocar sobre ela uma cesta básica, resolveu fazer graça, como
relata a repórter:
"O que ela foi comer era outra coisa", disse, insinuando que a pia
caiu durante uma relação sexual. Mais adiante, ao encontrar moradores
dormindo, saiu-se com essa: "Você viu? Não sei se eles estavam dormindo
porque trabalharam à noite ou porque continuam sem fazer nada".
O dirigente da CDHU também responsabilizou os moradores pelas
fissuras encontradas em volta de portas e janelas: "As portas são fixas
com bucha. A camada de revestimento é muito pequena, e a forma como vai
batendo a porta, em uso comum, vai provocar uma fissura".
Ao final da inspeção, Souza Leite procurou tranquilizar os moradores,
garantindo que as casas do recém-inaugurado conjunto Paulo Gomes Romeo
não correm risco de desabar.
Menos mal.
Até o momento em que escrevo este texto, não há notícias de que o
diretor regional Milton Vieira de Souza Leite tenha sido demitido do
cargo.
Uma coisa é certa: os últimos acontecimentos em São Paulo estão
mostrando que não se trata de eventuais acidentes de percurso de uma
administração pública, mas de um método. A culpa é sempre dos pobres.
A política "policial-higienista", que já "limpou" as áreas da
Cracolândia e do Pinheirinho, agora encontrou os responsáveis pelas
casas populares com defeito: os seus moradores.
Espera-se que a PM não
seja chamada para resolver o problema.
Ricardo Kotscho
Um comentário:
Atualização às 17h10:
o diretor regional da CDHU, Milton Vieira de Souza Leite, protagonista do post abaixo, pediu demissão do cargo, segundo informou o portal "Folha. com", em nota publicada às 16h29 desta sexta-feira.
VADE RETRUM
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