Apesar de datado em pouco mais de dois anos, o texto segue atual - aliás, atualíssimo.
Sem
qualquer esforço ou malabarismo intectual, encaixamos cada palavra à
ridícula ( ou tragicômica ? ) situação que vivemos neste tribunal desde há alguns anos.
Para ser lido com atenção...
Alexandre Morais da Rosa
Juiz de Direito e Membro da AJD
Doutor em Direito (UFPR).
1.
Por que o subsídio dos juizes brasileiros, após a EC 45, é um dos
maiores da América Latina? Ao pensar sobre este tema cabe a advertência
de Milton Friedman: não existe lanche grátis! Dito de maneira mais direta: alguma coisa se esconde por detrás deste movimento, manifestamente ideológico.
2.
No pós Constituicão de 1988 o Judiciário passou a responder com maior
veemência as demandas populares, especificamente no cumprimento das
promessas da modernidade, na efetivação dos Direitos Fundamentais.
Embora não tenha sido a pretensão do próprio Poder Judiciário, no pós88,
a magistratura passou a ser a alavanca de modificacões estruturais, com
o aumento do "custo país", a saber, a atividade comercial precisava
compor o custo da producão com o fator Poder Judiciário, manifestado
pelo binômio previsibilidade e eficiência. Isto porque houve uma postura
de parcela significativa da magistratura no sentido da Justica Social.
3.
A resposta, já antevista no Documento 319 do Banco Mundial, passava por
Reformas pontuais e silenciosas. Não sem razão a publicacão da FGV e
Ministério da Justiça (I Prêmio Innovare) sobre o Judiciário chama-se: A Reforma Silenciosa da Justica. De um lado se estabeleceu reformas pontuais na legislação infraconstitucional mediante dentre estas, outras medidas:
1) súmulas vinculantes;
2) julgamento do mérito sem processo (CPC, art. 285-A);
3) Repercussão geral...
Mas faltava o fundamental.
4.
O fundamental, neste contexto, é a aplicacão das licões de Gramsci, a
saber, era preciso cooptar os atores judiciais e a melhor maneira de
assim proceder é pagando bem. Diz o ditado popular que pagando bem, mal
não tem. E a sabedoria popular, no caso, pode ser invocada, porque com
ela, entende-se porque o subsídio dos magistrados são o teto do
funcionalismo.
5.
Assim, de um momento para o outro, sem alarde, a classe dos juízes,
então pertencente ao que se denominava "média" , ganhou um up-grade;
passou a fazer parte da (Tropa de) Elite que consome e, então, passa a
defender seus privilégios, os quais acabam se confundindo com os demais,
ou seja, todos são, agora, farinha do mesmo saco.
O lanche (subsídio), pois, não foi de graça.
Pagou-se com o fim da Independência e da Democracia.
O
resultado efetivo foi um grande "cala a boca" nos juízes que passaram,
não raro, a adotar uma postura mais complacente, sem alardes, nem
contestações… de ver a banda passar cantando coisas de amor…
6.
Um exemplo disto pode ser colhido com a Lei da Arbitragem. Embora o
Estado possua o monopólio legislativo, compartilha a produção de normas
jurídicas com a esfera privada, cujos limites podem, por vontade,
excluir qualquer regulamentação ou mesmo Jurisdição sobre o objeto do
contrato. Isto pode ser feito mediante o estabelecimento de "cláusula
cheia" de arbitragem, elegendo-se uma Instituto Internacional qualquer
como responsável pela arbitragem…
O Poder Judiciário do Estado fica sem a possibilidade de decidir nada porque está fora da partida. Não joga.
O
Estado, neste contexto, serve apenas como a força policial que dá
segurança fora e dentro do estádio, mas não entra em campo, salvo quando
este está parado. Assim, o Judiciário pode ser chamado a fazer valer as
decisões – que não discute o mérito – demonstrando que as normas
nacionais, neste espaço de exceção que é a arbitragem, mormente
internacional, são o sintoma do Estado eunuco.
É evidente, pois, a privatização do Direito no contexto internacional.
E,
ademais, como as Leis de Arbitragem seguem um modelo supranacional,
resta pouca coisa a fazer. O resultado deste modelo é que as grandes
questões comerciais não entram mais no campo da Jurisdição Brasileira,
salvo quando se quer utilizar a força… o Judiciário é o BOPE da
arbitragem… Esta questão é por demais relevante porque é o sintoma da
privatização do Direito, nas barbas (de molho) de todos… As reformas estruturais são silenciosas e eficientes…
7.
Por aí se pode entender, quem sabe, porque as posturas reacionárias, de
indiferença, voltaram com todo o vigor. Pode ser que agora os juízes
brasileiros estejam mais interessados nas viagens das próximas férias,
em trocar de carro, em comprar as roupas da moda, porque, enfim, na
contabilidade do capital, este foi o preco que se pagou. Existem, claro,
os que se dão conta e que precisam apontar para isto. A estes se dirá
que perderam o juízo...
O Juiz brasileiro não sei se veste prada, mas com certeza quer vestir!
8.
Neste estado de coisas, talvez, o ato que se possa fazer seja o de
apontar para a cooptacão e mostrar que ao mesmo tempo em que os atuais
ganharam tudo, os novos magistrados, pós 2004, não terão mais
aposentadoria integral, justamente foram estes que deram os aneis. A
questão é que quando se dá os aneis, não raro, a mão vai junto... Por
fim, caso tudo que falei tenha sido apenas uma projeção sem sentido para
os outros, terei pelo menos a companhia imaginária de Barthes que
disse: "A vida é, assim, feita a golpes de pequenas solidões.”
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