Uma feliz coincidência a publicação pelo Diário de São Paulo de
reportagem sobre a precariedade da Saúde Pública no estado e na cidade
de São Paulo.
Coincidência porque o início da série de reportagens de
Fábio Pagotto se deu no primeiro domingo da quaresma, início da CF-2012
(Campanha da Fraternidade de 2012). A CF deste ano tem como tema
“Fraternidade e Saúde Pública” e como lema “Que a Saúde se difunda sobre
a Terra", frase extraída do livro Eclesiástico (38, 8)*.
O repórter visitou três AMAs (Assistência Médica Ambulatorial) na
capital paulista e, em resumo, detectou o seguinte: filas enormes,
carência de médicos e de funcionários. Em Parelheiros, a espera é em
média de 4 horas para o atendimento, consultas sem os devidos exames e
receita de medicamentos sem o diagnóstico preciso. No Jardim Mirna não
havia clínico geral e no Jardim Campinas não havia médico.
Entrevistado, o cardiologista Paulo Zuppo Júnior revelou que
trabalhou para o SUS por três meses, mas saiu por falta de condições,
pois precisava atender mais de 80 pacientes em plantão de apenas 12
horas, além da falta de remédios, de insumos e de mais profissionais e
agentes de segurança. “Não posso colocar a vida dos pacientes em risco
dessa maneira!”, afirmou. Revelou ainda que o AME (Ambulatório Médico de
Especialidades) de Guaianazes ficou sem pediatra por quatro meses.
Segundo o presidente do Simesp (Sindicato dos Médicos de São Paulo), é
uma vergonha a situação de alguns hospitais, comentando as mortes que
ocorrem no Hospital das Clínicas. Revelou ainda que dos 55 mil médicos
da cidade de São Paulo, 2/3 (mais de 37.000) estão no centro expandido,
enquanto a periferia é carente desses profissionais. Por contradição, é
justamente na periferia que moram os principais construtores desta
cidade.
O governador Geraldo Alckmin reconheceu que faltam médicos nos
hospitais da rede pública do estado e da cidade. Fez mais uma das suas
tradicionais promessas, afirmando que irá apresentar um pacote para
estimular a presença de médicos no SUS. Enquanto isso vai intensificando
a terceirização do atendimento nos hospitais do estado e até no
Hospital do Servidor Público Estadual. Colocou setores do Hospital das
Clínicas - criado para atender gratuitamente a população do estado – a
serviço de pacientes de convênios particulares, oferecendo-lhes o melhor
e mais rápido atendimento, enquanto os mais necessitados esperam em
longas filas, seja para o atendimento, seja para diagnósticos mais
exigentes. E quantos morrem antes de serem diagnosticados?
Quanto ao pacote prometido para estimular a presença de médicos no
SUS, nada mais é que um paliativo, pois todo o sistema de Saúde Pública
está com carências estruturais e precisa ser reestruturado. A
reestruturação exige investimentos que estão sendo canalizados para
empresas particulares (OS – Organizações Sociais), que recebem1/3 do
orçamento da saúde na cidade (mais de R$ 2 bilhões). Essas OSs deveriam
aprimorar o sistema de saúde, entretanto, fazem dele uma fonte de lucro
particular. Enquanto essa reestruturação não vem, as famílias dos
trabalhadores de baixa renda padecem pela falta de atendimento adequado.
É bom lembrar que Geraldo Alckmin, médico, e seu partido (PSDB) estão
no governo paulista desde 1994, portanto, há 17 anos. Foi vice de
Covas, foi titular quando Covas faleceu e eleito governador em seguida.
Seu sucessor, Serra, é do mesmo partido e seguiu a mesma política de
precarização. Eleito em 2010, Alckmin cumpre nada menos que 13 anos à
frente do estado de São Paulo. A decadência da Saúde Pública estadual é,
portanto, de sua inteira responsabilidade. Os desmandos e desvios de
verbas para outros fins são também de sua responsabilidade. Se a Justiça
do estado – e do país - agisse conforme a boa ética, ele e tantos
outros estariam respondendo por crimes contra a vida.
A Campanha da Fraternidade, portanto, encontrou uma boa alavanca no
estado e na cidade de São Paulo, pois as denúncias circuladas por parte
da imprensa vêm dar suporte às suas propostas: chamar a atenção da
população para o caos na saúde pública no Brasil, incentivar à
participação popular nos órgãos de controle do sistema de saúde e
reforçar o movimento popular que luta para a implantação de uma política
de investimentos públicos em áreas vitais para o povo. A saúde em
primeiríssimo lugar.
Quanto às promessas do governador, que as vem repetindo há anos, dá
pra acreditar? Alguns exemplos para elucidar o assunto: durante a
campanha eleitoral de 2010, prometeu publicamente que iria decretar a
redução nos pedágios nas estradas de rodagem do estado. Porém, autorizou
novos aumentos já no ano de 2011. Na área da saúde, vem afirmando com
freqüência que o convênio com as OSs melhorou o atendimento. Entretanto,
impera o descaso total, sobretudo na periferia.
Não é o nariz do
Pinóquio que está crescendo, é o do tucanato.
Waldemar Rossi é metalúrgico aposentado e coordenador da Pastoral Operária da Arquidiocese de São Paulo. |
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