Salário
e extras foram pagos em novembro de 2008; ele alegou 'necessidades
financeiras'
Fausto
Macedo, de O Estado de S. Paulo
SÃO
PAULO - Em um único mês, novembro de 2008, o desembargador Roberto
Antonio Vallim Bellocchi, na época presidente do Tribunal de Justiça
de São Paulo, recebeu R$ 723.474,93 entre salário e desembolsos
extraordinários relativos a férias e licenças-prêmio. O salário
foi de R$ 373.598.17. Por atrasados, ele recebeu R$ 349.876,74
acrescidos do Fator de Atualização Monetária (FAM), plus que
incide sobre vantagens concedidas à toga.
Os
dados constam de planilha confidencial expedida pela Diretoria da
Folha de Pagamento da Magistratura (DFM). O documento aponta
“pagamentos excepcionais” a Bellocchi, que presidiu a maior corte
do País entre 2008 e 2009.
Bellocchi
ocupa o primeiro lugar isolado na lista dos contracheques
milionários, escândalo que abala o grande tribunal. Entre 2007 e
2010 ele foi contemplado com a bagatela de R$ 1,44 milhão,
construídos com base na rubrica “excepcionais”. Não há notícia
de que outro magistrado tenha recebido tanto.
Em
2008, o então presidente do TJ ganhou R$ 585.446,16 - afora
vencimentos que alcançaram R$ 803.300,56. As duas fontes de receita,
que garantiram R$ 1.388.746,72 ao desembargador, tiveram amparo em
“várias ordens”, segundo o histórico de seus pagamentos - mas
os assentamentos não apontam nomes de quem autorizou os depósitos
em favor de Bellocchi. Naquele ano de 2008, o próprio já dirigia o
TJ paulista.
Em
2009 ele se superou e bateu recorde ao ganhar R$ 1,63 milhão,
incluindo vencimentos (R$ 896,8 mil) e extras (R$ 738,4 mil). A maior
parte da bolada naquele ano foi paga por “ordem do presidente”. O
presidente da corte era Bellocchi. Em 2010, já aposentado, ele
recebeu mais R$ 26.129,18 de extras.
Os
pagamentos incomuns a Bellocchi e a outros desembargadores estão sob
suspeita do Órgão Especial do TJ. A investigação joga luz sobre
face oculta da toga, porque protegida por rigoroso sigilo
corporativo: os supervencimentos, que estouram o teto constitucional
de R$ 26,7 mil.
Bellocchi
foi contemplado em fevereiro de 2009 com holerite de R$ 136.476,35,
ou cinco vezes mais que o limite imposto pela Constituição. De
quebra, no mesmo mês, ele recebeu R$ 120 mil de “pagamento
excepcional”.
Em
março daquele ano, o magistrado repetiu o feito - contracheque de R$
136.476,35 e extra de R$ 120 mil. Em abril, o salário do
desembargador foi a R$ 126.476,35 e o extra ficou em R$ 110 mil.
Naquele período de apenas três meses a conta de Bellocchi captou R$
749.429,05.
“Todas
essas antecipações nunca foram submetidas à apreciação do
Conselho Superior da Magistratura e as de extremo vulto se deram
exatamente na sua (de Bellocchi) gestão como presidente do
tribunal”, adverte o desembargador Ivan Sartori, atual mandatário
máximo do TJ.
Violações.
Sartori anota que os pagamentos, em tese, “constituíram graves
violações aos princípios constitucionais da isonomia, da
impessoalidade e da moralidade administrativa”.
SÃO
PAULO - O presidente do TJ pede processo disciplinar que pode levar à
cassação da aposentadoria de Bellocchi. “Há veementes indícios
de que não havia mesmo critério nenhum para as antecipações de
créditos a magistrados.”
Também
estão sob inspeção pagamentos a outro desembargador, Vianna
Santos, que presidiu o TJ em 2010. Ele recebeu R$ 1,26 milhão -
morreu em 2011 -, a maior parte em seu governo.
Para
Sartori, os dados indicam “em tese, abuso de poder na gestão das
verbas do TJ por seus ordenadores de despesa”. Ele denuncia
existência de “administração paralela” na corte.
Em
defesa preliminar, Bellocchi afirmou que “é pessoa conhecida pelos
45 anos de dedicação à magistratura, carreira percorrida em todos
os estágios, até se tornar, nos anos de 2008 e 2009, presidente do
tribunal”.
Retidão.
Ele sustenta que “sempre demonstrou, além do domínio da melhor
técnica jurídica, transparência, lisura e retidão de caráter”.
Bellocchi diz que “se tornou titular de uma série de créditos a
serem pagos a título de indenização”. “No entanto, diversos
acontecimentos fizeram surgir, na vida do peticionário, necessidades
financeiras prementes, as quais levaram à antecipação de parte dos
referidos créditos em atraso.” Relata que, ao fim de 2006,
acumulava R$ 822.436,72 em dívidas e empréstimos bancários.
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