Para especialistas, imprensa tradicional quer impor política econômica que foi derrotada nas urnas...
Por Redação Revista Fórum
Um manifesto capitaneado por Maria Conceição Tavares, Luiz Gonzaga
Belluzzo, Marcio Pochmann e outros pensadores da economia brasileira faz
um contraponto ao que tem sido apregoado pelos meios de comunicação
tradicionais no que diz respeito às políticas econômicas que o segundo
mandato de Dilma Rousseff deve seguir.
Para eles, o resultado do processo eleitoral deixou claro que a
maioria da população brasileira “rejeitou o retrocesso às políticas que
afetam negativamente a vida dos trabalhadores e seus direitos sociais”.
Criticam também aquilo que chamam de opinião única a respeito do rumo
certo à economia brasileira divulgada por jornais e revistas.
“(…) os meios de comunicação propagaram quase exclusivamente a
opinião que a austeridade fiscal e monetária é a única via para resolver
nossos problemas. Isto vai na contramão da opinião de economistas de
diferentes matizes no Brasil, mas reverbera o jogral dos porta-vozes do
mercado financeiro. Estes defendem solucionar a desaceleração com a
“credibilidade” da adesão do governo à austeridade fiscal e monetária,
exigindo juros mais altos e maior destinação de impostos para o
pagamento da dívida pública, ao invés de devolvê-los na forma de
transferências sociais, serviços e investimentos públicos”, diz o
manifesto.
Em outro momento, o manifesto também rejeita o argumento que
relaciona gasto público e inflação. “Tampouco compreendemos o argumento
que associa a inflação ao gasto público representado por desonerações
que reduzem custos tributários e subsídios creditícios que reduzem
custos financeiros. A inflação, aliás, manteve-se dentro da meta no
governo Dilma Rousseff a despeito de notáveis choques de custos como a
correção cambial, o encarecimento da energia elétrica e a inflação de
commodities no mercado internacional”, criticam os economistas.
Os economistas se revelam preocupados com a “carência de bens
públicos”. “O que nos preocupa é a possibilidade de recessão e a
carência de bens públicos e infraestrutura social reclamada pela
população brasileira. Atendê-la não é apenas um compromisso político em
nome da inclusão social, é também uma fronteira de desenvolvimento,
estímulo ao crescimento da economia e em seguida da própria arrecadação
tributária”, analisam.
A seguir, confira o manifesto na íntegra:
“Economistas pelo desenvolvimento e pela inclusão social
A campanha eleitoral robusteceu a democracia brasileira através
do debate franco sobre os rumos da Nação. Dois projetos disputaram o
segundo turno da eleição presidencial. Venceu a proposta que uniu
partidos e movimentos sociais favoráveis ao desenvolvimento econômico
com redistribuição de renda e inclusão social. A maioria da população
brasileira rejeitou o retrocesso às políticas que afetam negativamente a
vida dos trabalhadores e seus direitos sociais.
É de se esperar que o pluralismo de opiniões fortaleça nossa
democracia depois da pugna eleitoral. Desde 26 de outubro, contudo, a
difusão de ideias deu a impressão de que existe um pensamento único no
diagnóstico e nas propostas para os graves problemas da sociedade e da
economia brasileira.
Sem o contraponto propiciado pela campanha e pelo horário
eleitoral gratuito, os meios de comunicação propagaram quase
exclusivamente a opinião que a austeridade fiscal e monetária é a única
via para resolver nossos problemas. Isto vai na contramão da opinião de
economistas de diferentes matizes no Brasil, mas reverbera o jogral dos
porta-vozes do mercado financeiro. Estes defendem solucionar a
desaceleração com a “credibilidade” da adesão do governo à austeridade
fiscal e monetária, exigindo juros mais altos e maior destinação de
impostos para o pagamento da dívida pública, ao invés de devolvê-los na
forma de transferências sociais, serviços e investimentos públicos.
Subscrevemos que este tipo de austeridade é inócuo para retomar o
crescimento e para combater a inflação em uma economia que sofre a
ameaça de recessão prolongada e não a expectativa de sobreaquecimento.
O reforço da austeridade fiscal e monetária deprimiria o consumo
das famílias e os investimentos privados, levando a um círculo vicioso
de desaceleração ou mesmo queda na arrecadação tributária, menor
crescimento econômico e maior carga da dívida pública líquida na renda
nacional.
Entendemos que é fundamental preservar a estabilidade da moeda.
Também somos favoráveis à máxima eficiência e ao mínimo desperdício no
trato de recursos tributários: este tipo de austeridade, sim, denota
espírito público e será sempre desejável. Rejeitamos, porém, o discurso
dos porta-vozes do mercado financeiro que chama de “inflacionário” o
gasto social e o investimento público em qualquer fase do ciclo
econômico.
Tampouco compreendemos o argumento que associa a inflação ao
gasto público representado por desonerações que reduzem custos
tributários e subsídios creditícios que reduzem custos financeiros. A
inflação, aliás, manteve-se dentro da meta no governo Dilma Rousseff a
despeito de notáveis choques de custos como a correção cambial, o
encarecimento da energia elétrica e a inflação de commoditiesno mercado
internacional.
A austeridade agravou a recessão, o desemprego, a desigualdade e o
problema fiscal nos países desenvolvidos mesmo tendo sido acompanhada
por juros reais baixíssimos e desvalorização cambial. No Brasil, a
apreciação cambial estimulada por juros reais altos aumenta o risco de
recessão, ao acentuar a avalanche de importações que contribui para
nosso baixo crescimento.
É essencial manter taxas de juros reais em níveis baixos e
anunciar publicamente um regime fiscal comprometido com a retomada do
crescimento, adiando iniciativas contracionistas, se necessárias, para
quando a economia voltar a crescer. A atual proporção da dívida pública
líquida na renda nacional não é preocupante em qualquer comparação
internacional.
O que nos preocupa é a possibilidade de recessão e a carência de
bens públicos e infraestrutura social reclamada pela população
brasileira. Atendê-la não é apenas um compromisso político em nome da
inclusão social, é também uma fronteira de desenvolvimento, estímulo ao
crescimento da economia e em seguida da própria arrecadação tributária.
Esta opinião divergente expressa por parte importante dos
economistas brasileiros não pode ser silenciada pela defesa acrítica da
austeridade, como se o mantra que a louva representasse um pensamento
único, técnico, neutro e competente.
Um dos vocalizadores desse mantra chegou a afirmar que um segundo
governo Dilma Rousseff só seria levado a caminhar em direção à
austeridade sob pressão substancial do mercado, o que chamou de
“pragmatismo sob coação”.
Esperamos contribuir para que os meios de comunicação não sejam o
veículo da campanha pela austeridade sob coação e estejam, ao contrário,
abertos para o pluralismo do debate econômico em nossa democracia.
Luiz Gonzaga Belluzzo (UNICAMP e FACAMP)
Ricardo Bielschowsky (UFRJ)
Marcio Pochmann (UNICAMP)
Pedro Paulo Zahluth Bastos (UNICAMP)
Rosa Maria Marques (PUC-SP)
Alfredo Saad-Filho (SOAS – Universidade de Londres)
João Sicsú (UFRJ)Maria de Lourdes Mollo (UNB)
Vanessa Petrelli Corrêa (UFU)
Carlos Pinkusfeld Bastos (UFRJ)
Alexandre de Freitas Barbosa (USP)
Lena Lavinas (UFRJ)
Luiz Fernando de Paula (UERJ)
Hildete Pereira Melo (UFF)
Niemeyer Almeida Filho (UFU)
Frederico Gonzaga Jayme Jr. (UFMG)
Jorge Mattoso (UNICAMP)
Carlos Frederico Leão Rocha (UFRJ)
Rubens Sawaya (PUC-SP)
Fernando Mattos (UFF)
Pedro Rossi (UNICAMP)
Jennifer Hermann (UFRJ)
André Biancarelli (UNICAMP)
Bruno De Conti (UNICAMP)
Julia Braga (UFF)
Ricardo Summa (UFRJ)
William Nozaki (FESP)”
Foto: Commons
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