Sem reverter políticas que submetem sociedade às
finanças, Brasil permanecerá paralisado. Mas tema não entra em debate,
por estranhas razões
Por Guilherme Boulos | Imagem: Rubem Grillo, Gula (1981)
Quem diria! Mal se passaram seis anos da crise em que as
políticas neoliberais afundaram o mundo e eles já estão aí com todo o
vigor. A aposta na mão invisível do mercado e na desregulamentação das
finanças quase levou a maior economia do mundo ao colapso em 2008. Os
Estados Unidos, a Europa e a economia mundial pagam o preço até hoje.
Não demorou, porém, para que os intelectuais da banca
superassem a vergonha e o descrédito, saíssem do armário e recuperassem a
autoconfiança para defender a mesma rota do fracasso. Abstraíram 2008 e
reaparecem de cara lavada para apresentar as mudanças necessárias na
economia brasileira.
Já foi dito que a história se repete, primeiro como
tragédia e depois como farsa. Neste caso até os personagens são os
mesmos. Vejam vocês, Armínio Fraga! As últimas três campanhas
presidenciais do PSDB o esconderam a sete chaves, assim como a FHC.
Dizem que há lugares do país que quando seu nome é citado as pessoas
correm para bater três vezes na madeira. Dá azar. Incrível, mas Aécio
Neves teve a coragem de reabilitá-lo.
Aquele que quando foi presidente do Banco Central elevou
a taxa de juros de 25% para 45%! O homem do arrocho e dos banqueiros.
Que foi diretor do fundo de investimento de George Soros, símbolo da
especulação financeira mundial.
E é o mesmo velho Armínio. Diz agora que os salários
subiram muito ultimamente e que a redução de juros nos anos anteriores
foi “preocupante”. Em entrevista à Folha de S.Paulo, esta
semana, deixou claro que gostaria de rever as regras do
seguro-desemprego, aumentar a idade mínima para aposentadoria e
dificultar a concessão de pensões.
Tudo em nome do combate à inflação. Só deixa de dizer
que ao fim de sua gestão no Banco Central, no governo FHC, a inflação
era de 12,5% ao ano, quase o dobro da atual, que ele julga fora de
controle. E isso com juros estrondosos.
Sorte tem o país que o candidato que o anunciou como futuro ministro da Fazenda está praticamente fora do páreo eleitoral.
Mas, como diz o povo mais acostumado a sofrer, desgraça
pouca é bobagem. A queda de Aécio foi acompanhada da subida meteórica de
Marina Silva. E Marina, talvez no afã de atrair o mercado para seu
projeto, tinha já erigido como conselheiro econômico ninguém menos que
Eduardo Giannetti da Fonseca. Economista da nata do neoliberalismo
brasileiro.
Giannetti tem distribuído por aí a mesma cantilena que
arruinou os trabalhadores no Brasil, produzindo desemprego, arrocho
salarial e recessão econômica na década de 90. O discurso de Marina é da
nova política, mas começa mal ao recorrer à velha economia.
Também em entrevista à Folha, no ano passado,
Gianetti sistematizou sua listinha de desejos: autonomia do Banco
Central, readequar a Petrobrás e os bancos públicos nos “critérios de
mercado”, desatrelar o reajuste das aposentarias ao salário mínimo e por
aí vai. O modelo de seus sonhos, disse ele, é o segundo mandato de FHC e
o primeiro de Lula (o mandato mais conservador dos governos petistas).
Cita como referência as “heroicas” privatizações e a desregulamentação
de capitais por FHC.
Sua obsessão – agora repetida por Marina – é fortalecer o
dito tripé macroeconômico. Austeridade fiscal, aumento do superávit
primário e livre câmbio. Não é preciso ser economista nem ter sobrenome
europeu para saber que isso implica cortes de investimentos e de gastos
sociais do Estado. Austeridade fiscal é um nome elegante para dizer
corte no orçamento público. Superávit primário é um termo técnico para
se referir à reserva de recursos para pagar juros da dívida aos
banqueiros – o que, por sua vez, implica cortes orçamentários.
Marina terá que se decidir. Ou quer manter e ampliar
políticas sociais e investimentos públicos, ou quer fazer cortes. Do
ponto de vista lógico, tentar conciliar os dois é tão impossível quanto
empenhar-se em desenhar um círculo quadrado. Simplesmente não dá. Marina
deve a todos esta resposta. Ou está com Giannetti ou está com Chico
Mendes.
A reabilitação dos neoliberais, ao que parece, não foi
apenas um apelo desesperado do PSDB, mas uma tendência do debate
econômico nestas eleições. Não deixa de ser, de algum modo, a volta dos
que não foram. Já que os governos petistas – Dilma inclusive –
conservaram importantes aspectos neoliberais em sua política econômica.
Não por acaso os lucros bancários foram recordes. O pré-sal foi
concedido à exploração privada, assim como aeroportos e rodovias.
Mas tragicamente o discurso da mudança entre os
principais candidatos não critica esse conservadorismo. Ao contrário,
diz que ele foi insuficiente e volta-se contra as limitadas iniciativas
de enfrentá-lo. A titubeante redução dos juros básicos, o uso de bancos
públicos para baratear o crédito, a atuação das estatais na indução de
investimentos e os gastos com assistência social, que não chegam a 4% do
orçamento Federal.
A crítica é feita pelo viés conservador. E deixa claro
que o debate econômico no Brasil ainda é pautado pelo interesse do
mercado financeiro. Enquanto for assim teremos de conviver com o eterno
retorno dos neoliberais.
Nenhum comentário:
Postar um comentário