GENEBRA (AFP) – “A tortura foi uma política de Estado durante a
ditadura militar no Brasil”, afirmou nesta segunda-feira 17, em Genebra,
Paulo Sergio Pinheiro, um dos sete membros da Comissão Nacional da
Verdade que deve investigar os crimes cometidos pelo regime militar no
período 1964-1985.
“O que queremos provar é que as torturas, os desaparecimentos e os
assassinatos não foram um excesso por parte de alguns grupos do Estado:
foi uma política de Estado; a tortura foi uma política do Estado
brasileiro durante a ditadura militar”, enfatizou Pinheiro, que, além de
renomado sociólogo, especialista da ONU em violência contra criança,
também é atual presidente da Comissão Investigadora para a Síria do
Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas. ”Não há a menor dúvida”,
respondeu Pinheiro ao ser indagado pela AFP se a ditadura representou
um ataque em massa e sistemático contra a população civil no Brasil, que
caracteriza os chamados “crimes de lesa humanidade”, imprescritíveis
segundo os princípios internacionais de direitos humanos.
“Houve um extermínio de jovens que haviam participado de uma
guerrilha na região do Araguaia, onde também houve uma ordem de matar
todos os sobreviventes, que foram 40 e que não estavam mais combatendo,
estavam simplesmente na floresta”, exemplificou Pinheiro, que já foi
Relator Especial do Conselho de Direitos Humanos da ONU ante a ditadura
em Mianmar.
Sobre os supostos crimes da guerrilha no Brasil, Pinheiro disse que,
neste caso, “não há dois lados”. “Para a lei, nosso mandato é para
investigar os crimes praticados pelos agentes do Estado. Aqueles que
participaram da guerrilha urbana, da dissidência armada, foram
investigados, processados e condenados”. “Quando a lei de anistia no
Brasil foi aprovada em 1979, havia pessoas cumprindo sentença há dez
anos. Então, esse alegado, ‘o outro lado’, já foi bastante investigado. O
que nunca foi investigado foi a responsabilidade dos agentes do Estado
nesses crimes políticos”, enfatizou Pinheiro.
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Em meados de maio passado, a presidenta Dilma Rousseff, uma
ex-guerrilheira que foi torturada e presa pelos militares, instaurou a
Comissão da Verdade para investigar as denúncias de violações dos
direitos humanos durante a ditadura, mas sem retirar a anistia aos
repressores vigente desde 1979. ”A interpretação da Lei de Anistia feita
pelo Supremo Tribunal Federal não é um obstáculo nem facilita nossos
trabalhos, justamente porque, ao contrário do sistema judiciário
brasileiro, nós podemos identificar autores, descrever as circunstâncias
dos crimes de morte, de detenção arbitrária, de desaparecimento forçado
e de tortura”, concluiu Pinheiro.
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