Grande parte da economia brasileira funciona na contramão daquilo
que o ministro Mantega, o governo Dilma e o povo brasileiro desejam.
Sua estrutura foi montada para atender às grandes corporações
financeiras
Wladimir Pomar
Em
entrevista à imprensa, o ministro Guido Mantega demonstrou estar a par
de várias das realidades econômicas com as quais o povo brasileiro se
confronta. Acusou os bancos de cobrarem taxas "escorchantes" e
injustificáveis nos cartões de crédito.
Poderia ter acrescentado
que, apesar das medidas de rebaixamento dos juros pelo Banco do Brasil e
pela CEF, os bancos privados continuam cobrando taxas superiores a 10%
ao mês nos empréstimos que efetuam, seja se forma aberta, seja através
de artifícios diversos.
O ministro também atacou a injeção de
liquidez, ou a emissão de dólares, realizada pelo Federal Reserve, o
banco central americano, que ameaça impactar o câmbio da moeda
brasileira. E reagiu, segundo as notícias, às acusações dos Estados
Unidos de que o Brasil tomou medida protecionista ao elevar os impostos
de importação para 100 produtos. De quebra, chamou a atenção das
siderúrgicas brasileiras para não aproveitarem essa elevação dos
impostos de importação para reajustarem seus preços.
Mantega
reafirmou sua disposição de combater os "disparates” dos cartões de
crédito, dos spreads bancários e dos altos de juros. Mostrou-se
confiante de que os preços se mantenham sob controle, ao contrário do
que projetam “consultorias renomadas”, preocupadas com a recuperação da
economia e com os efeitos da crise global. Acredita que a própria crise e
as medidas adotadas pelo governo, como a desoneração da folha de
pagamentos, a redução do custo da energia e o corte de IPI para carros,
farão com que aumente a oferta de produtos internamente a preços baixos,
mesmo que a quebra da safra americana eleve os preços dos grãos no
mercado internacional.
Adicionalmente, prometeu não deixar o real
se valorizar, reafirmando sua crença de que o câmbio deverá continuar
flutuante, mas no sentido de desvalorização do real e do aumento do
poder competitivo das mercadorias brasileiras.
Em termos gerais, o
ministro se mostrou combativo no sentido de evitar a elevação dos
preços, mesmo que para isso tenha que voltar atrás em algumas das
medidas adotadas pelo governo. Por outro lado, nada falou sobre a
perspectiva de um programa mais claro de aumento da concorrência, ou
competição, no setor bancário e em outras áreas dominadas pelo sistema
de monopólio, a única forma estrutural que pode garantir que realmente
os preços não sejam elevados. Além disso, o problema atual do Brasil não
reside apenas em evitar a subida dos preços, mas também em rebaixar os
preços já praticados, muito acima do aceitável para ampliar o consumo do
mercado interno e a oferta ao mercado internacional, a preços
competitivos.
Para ser franco, as corporações multinacionais e
nacionais que dominam os vários mercados em que vigora o sistema de
monopólio, como o bancário, químico, automobilístico, farmacêutico,
siderúrgico, cimenteiro etc, só se dispõem a rebaixar preços nos limites
estreitos da desoneração promovida pelo governo. Na ausência de
mercados concorrenciais, continuam praticando preços administrados que
garantam lucros máximos, aproveitando-se ainda das vantagens fiscais de
poderem importar inúmeros componentes de unidades localizadas em outros
países.
Infelizmente, ainda na mesma linha de preocupação com os
preços, o ministro nada falou sobre medidas efetivas para elevar a
produção de alimentos e garantir preços baixos e seguridade alimentar
para o país. A quebra da safra americana vai estimular o agronegócio a
ampliar suas áreas de plantio de commodities, à custa das áreas
de plantio de alimentos da agricultura familiar, representando um sério
risco à política de controle inflacionário.
Aliás, com a elevação
do poder de compra de parcelas das populações brasileiras mais pobres,
os preços de alimentos têm sido um fator constante de pressão sobre a
inflação e já era tempo de encarar esse assunto como questão estratégica
e não como sazonal.
Na verdade, grande parte da economia
brasileira funciona na contramão daquilo que o ministro Mantega, o
governo Dilma e o povo brasileiro desejam. Sua estrutura foi montada
para atender às grandes corporações financeiras, industriais, agrícolas,
comerciais e de serviços. Em tais condições, embora a vontade de
retificar desvios conjunturais seja louvável e estimulante, ela talvez
não baste para solucionar, de acordo com os interesses do país, os
problemas estruturais que as promovem.
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