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sexta-feira, 9 de agosto de 2013

16 anos sem HERBERT DE SOUZA



Hoje, dia 9 de agosto, faz 16 anos que estamos sem Herbert de Souza, o Betinho, um dos fundadores do Ibase. Neste mês, amigos contam histórias sobre ele em crônicas. A primeira é de Francisco (Chico) Menezes, ex-diretor do Ibase e consultor para o tema de segurança alimentar e combate à pobreza.


Chico Menezes

Não me lembro mais em que ano foi. Provavelmente estávamos no auge da Campanha contra a Fome. Betinho chamou uma reunião com o Jurandir Freire, psicanalista de extrema sensibilidade social. Eram daquelas em que todos se sentavam em volta de uma mesa, Betinho abria a reunião dizendo porque a tinha convocado, o convidado falava e depois todos discutiam. Reunião da marca Ibase.

Dias antes eu fui de Metrô, com Betinho, de Botafogo para o Centro. O que vi dentro do carro do Metrô me espantou. Quando Betinho entrou, as pessoas foram tomadas por um enlevo indescritível. Muitos queriam se aproximar e pegar. Não era só assedio, era um clima de forte emoção. No final, quando descemos, uma salva de palmas, para aquele homem que aparecia na televisão falando do beija-flor.

Mas voltando à reunião com o Jurandir. Acho que estimulado pelo psicanalista e sua capacidade de ver as coisas pelo ângulo da subjetividade, me recordei do episódio do Metrô e fiquei pensando como se explicava aquilo e tudo que vinha ocorrendo naqueles tempos. Uma figura já tão frágil fisicamente e com aquela capacidade de mobilizar tanta gente, como se dava com o movimento da Ação da Cidadania. Com uma voz rouca e comedida, mas que se fazia escutar com suas analogias, às vezes com suas ironias, com a fala que vinha do coração. Não restam dúvidas sobre sua sabedoria política incomum, com a capacidade que tinha de ver além do que é imediatamente visível na política. Mas certamente havia mais coisa para explicar a enorme empatia que transmitia.

Fiquei pensando no quanto havia de identificação do povo brasileiro com Betinho. Era essa sensação misturada de fragilidade e força, o que possivelmente estabelecia o laço mais forte entre a pessoa mais simples e Betinho, entre o jovem mais aguerrido e Betinho, entre a velhinha mais cansada e Betinho. Vivíamos os tempos do início da farra neoliberal. O povo brasileiro sofria, no dia a dia, a demonstração de sua fragilidade. Conquistamos as eleições diretas e o Collor foi eleito. As empresas estatais deviam ser privatizadas. Se alguém estava desempregado, a culpa era individual. Mas ao mesmo tempo, Collor entrou e foi mandado embora. Os trabalhadores resistiam à venda do patrimônio público. Não se aceitava a fome como uma fatalidade e lutava-se contra ela. Éramos frágeis, mas tínhamos força, parecidos com Betinho. Ele era o que poderíamos ser.

Oscar Cabral/Abril Imagens

São poucas as figuras que reproduzem essa identificação, como a que Betinho construiu. Mas quando ela ocorre, as bases ficam muito sólidas. É a identificação do líder como pessoa. Que erra, sofre, fica doente, mas acerta, festeja e se ergue. É a história do bêbado e do equilibrista, a do Betinho, mas também a nossa história.

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