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quarta-feira, 13 de fevereiro de 2013

Futebol , carnaval e identidade nacional: que país é este?





Evaldo Cabral de Melo, historiador

São retratos parciais do brasileiro do século vinte. A popularidade do futebol e do carnaval, no Brasil são fenômenos bastante recentes. O carnaval que se conhecia no Brasil no período colonial e ao longo do século dezenove era o chamado entrudo português - que não tinha nada a ver com o carnaval que se faz atualmente no Brasil. Já o futebol foi um jogo transplantado para Brasil por funcionários ingleses de companhias de eletricidade e outras que operavam aqui, no fim do século passado. Para o século vinte, compreender o Brasil sem o futebol e sem o carnaval é impossível. Mas é preciso ter presente que todas essas idéias de identidade nacional, tanto no Brasil como fora, têm muito de uma construção ideológica. Nenhum país tem identidade. Uma identidade é inventada para um país. O futebol e o carnaval, então, são dois elementos fundamentais através dos quais a cultura brasileira do século dezenove inventou uma identidade para o Brasil. A preocupação com a identidade nacional que sempre houve, desde o período colonial, só se tornou absorvente e monopolizou as preocupações do Brasil do Modernismo para cá, ao longo dos últimos oitenta anos.

Nos anos de 1920, o Brasil vivia a crise da política do “café-com-leite” e os pressupostos de modernização e urbanização faziam-se necessários principalmente nos grandes centros urbanos, como São Paulo e Rio de Janeiro. Nessa perspectiva, ressalta-se que o advento das duas Grandes Guerras (1914 até 1945) fez com que o número de indústrias no Brasil se multiplicasse, fato decorrente do segundo surto industrial (1914-1918) e dos primeiros 15 anos de Era Vargas (1930-1945). Em meio ao “clima” de urbanização, crise política, tentativas de fortalecimento de governos, imigração européia e cotidiano das empresas que surgiam em meio ao avanço dos movimentos trabalhistas é que se fez necessário “inventar” o futebol e o carnaval como símbolos nacionais.

É fato corrente na historiografia que a emancipação política brasileira em 1822 se deu sob a égide do privilégio das elites e da desigualdade, sobretudo materializada com a legalidade e o continuísmo da escravidão. Outro ponto interessante é a lembrança de que “o Estado sem nação brasileiro”, dependente do capitalismo estrangeiro, constantemente teve a pretensão de criar símbolos, heróis e datas que legitimassem o Brasil construído pela elite. 

Apesar das novas temporalidades futuras, a perspectiva de criação de heróis e símbolos nacionais como um meio de solidificar os interesses das classes privilegiadas tornou-se a tônica da política brasileira. Fundamentados nesta pressuposição, os imigrantes ingleses que vieram para o Brasil, no século XX, “trouxeram” o futebol que era utilizado por grupos burgueses/industriais para garantir a “diversão” dos trabalhadores, cuja jornada e condições de trabalho eram péssimas na Inglaterra e também no Brasil do século XX. Com este viés, o futebol foi muitas vezes financiado pelos industriais que “alimentavam o sonho dos trabalhadores” de serem considerados importantes por suas habilidades, fato que muitas vezes não acontecia nas fábricas. É lugar comum que a proliferação de times com nomenclaturas vinculadas à emigração, as fábricas ou a grupos inferiorizados socialmente tornou-se o marco de nossa argumentação. Assim, times como Palestra Itália, Operário, Portuguesa e outros tiveram seus nomes provenientes de tal realidade.

Em um contexto mais recente, principalmente a partir da Copa de 1958, no governo de JK (1956-61), a vitória da seleção brasileira, vinculou definitivamente o futebol à construção de uma identidade nacional. Visto que Juscelino, com seu plano de metas “50 anos em 5”, encontrou, na segunda metade de seu mandato, problemas com o FMI, inflação e denúncias de corrupção que poderiam “desmitificar” sua política de modernização e sucesso. Assim, como o futebol é originário da Inglaterra, iniciou-se a criação do “futebol arte brasileiro”, fundamentado principalmente na figura de um jovem negro, denominado “Pelé”. A ditadura militar (1964-85) também se utilizou da imagem do “futebol arte brasileiro” e da figura de “Pelé – o rei do futebol” para tirar o foco, das torturas e reações populares que, principalmente no governo Médici (1969-74) eram marcantes. Outra questão, peculiar é que “o rei Péle” também se beneficia(ou) da construção de sua imagem, pois foi contratado no fim de sua carreira por um time americano “O Cosmos” em um jogo amistoso contra “o Santos” , ocasião em que ele disse: “Love, love, love”. A emoção de Péle, projetada pelos meios de comunicação, no mínimo, disfarçaram os problemas da ditadura militar que, como é sabido, foi financiada pelos Estados Unidos. País este que homenageou “Pelé”em um jogo de despedida, em que o “Cosmos” (time americano) venceu o Santos por 2 x 1. Penso que este placar pode representar bem o Brasil no exterior sob o signo da dependência, ou seria melhor, sob a imagem de um brasileiro “ilustre” Pelé.

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