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sexta-feira, 31 de agosto de 2012

Aprovada a Lei das Cotas, novos desafios são permanência e acesso à pesquisa


Para o presidente da Unegro, a consolidação da lei vai gerar novas reflexões e saberes, elevando a posição social dos menos favorecidos, sendo a maioria formada por pobres e negros

estudantes negros universidades
Negros representam mais de 70% da população pobre no Brasil, mas nas universidades eles são apenas 10%. Fonte: IBGE
Movimentos sociais comemoram a lei que institui o sistema de cotas raciais e sociais para universidades federais de todo o país,sancionada pela presidenta Dilma Rousseff na tarde de quarta-feira (29). Para a União Nacional dos Estudantes (UNE), agora, depois desse passo importante, os estudantes têm um novo desafio: construir as ações afirmativas para a permanência na universidade desse jovem de baixa renda, além de garantir o acesso à pesquisa.
A reserva de 50% das vagas para estudantes que tenham cursado todo o ensino médio em escolas da rede pública, com distribuição das vagas entre negros, pardos ou indígenas é uma das principais bandeiras de luta dos militantes dos movimentos estudantil, negro, moradia e de mulheres.
Atos públicos, protestos, campanhas nas redes e nas escolas têm mobilizado milhares de pessoas ao longo dos últimos meses com mais intensidade. Diversos estudos e levantamentos acadêmicos e governamentais demonstram que há sim uma desigualdade no acesso à universidade. A população que se declara negra, por exemplo, tem, em média, dois anos a menos de estudo, segundo dados do Ministério da Educação (MEC) coletados em instituições públicas federais.
Em 1997, cerca de 3% dos jovens brancos com mais de 16 anos frequentavam o ensino superior. Já entre os jovens negros, esse percentual estava em torno de 1%. Dez anos depois, o percentual era de 5,6% e 2,8%, respectivamente.
“É uma vitória imensurável. Há mais de 10 anos a UNE e outras entidades fazem esse debate, buscam vencer um preconceito e venceu. Lembrando que já havia uma vitória no STF [Supremo Tribunal Federal], quando derrotamos uma ação de inconstitucionalidade contra as cotas raciais. Em contrapartida essa vitória amplia a demanda pela assistência estudantil, com a ampliação de vagas, abertura de cursos noturnos, essa questão da permanência no Ensino Superior vai se tornar ainda mais dramática. É preciso políticas para combater a evasão”, declarou ao Vermelho Daniel Iliescu, presidente da UNE, enfatizando a importância da ampliação do orçamento do Plano Nacional de Assistência Estudantil (Pnaes).
Desde quando foi criado, em 2007, o orçamento do Pnaes tem sido aumentado em R$ 100 milhões, a cada ano. Atualmente, a verba anual é de R$ 500 milhões. No entanto, há um estudo realizado pelo Fórum Nacional de Pró-reitores de Assuntos Comunitários e Estudantis (Fonaprace) que propõe que o orçamento do Pnaes passe para R$ 1,5 bilhão em 2013 para atender as demandas das instituições federais.
“Agora, será preciso incluir essa nova demanda de estudantes nas federais. Essa era a nossa reivindicação durante a greve das federais e ainda é. No início, quando a verba passou de R$ 200 milhões para R$ 300 milhões, foi um aumento considerável. Mas, o que se viu nos anos seguintes é que esse percentual de reajuste foi caindo. Por isso, propomos que o orçamento vá para pelo menos R$ 750 milhões em 2013, no mínimo”, completou Iliescu.
Já Edson França, presidente da União de Negros e Negras pela Igualdade (Unegro), rechaçou a campanha negativa realizada pela grande imprensa.
“Estamos enfrentando poderosos interesses do setor e pensamentos retrógrados, inclusive muitas vezes expostos na grande mídia com editoriais e matérias tendenciosas condenando as cotas sociais. Trata-se de um salto de qualidade e não o contrário. Pesquisas comprovam que cotistas têm bons e ótimos desempenhos na universidade, além disso não existe uma rivalidade entre contistas e não cotistas, como pregam esses jornais. Considero uma grande vitória para o Brasil, não somente para o movimento negro, que tem pautado de maneira unificada as cotas sociais desde 2001”, enfatizou França.
Para ele, a consolidação da lei vai gerar novas reflexões e saberes, elevando a posição social dos menos favorecidos, sendo a maioria formada por pobres e negros. “Haverá uma mudança na produção acadêmica, no pensamento, tendo em vista que o lugar de onde eles partem não é o lugar da elite. Então teremos uma nova geração da classe dirigente brasileira. A universidade é o banco que forma a classe dirigente”, lembrou Edson França, que tem formação de historiador.
Aldenora Gonzalez, tesoureira da Confederação Nacional das Associações de Moradores (Conam), concorda com o dirigente da Unegro e acrescenta o ganho de perspectiva dos menos favorecidos.
“A gente enxerga um grande crescimento da população menos favorecida e, dessa forma, contribuir na formação e organização dos movimentos sociais. O fato de ter as cotas além de ser um estímulo para quem não tinha perspectiva de buscar melhores condições de vida, a partir do estudo, também contribuirá no fortalecimento e ampliação das mobilizações sociais”, destacou Aldenora Gonzalez.
Aldenora também fez questão de parabenizar a todos que sempre lutaram pelo direito das minorias, e uma menção especial ao movimento negro: “Tudo isso só está sendo possível porque, além da mobilização da sociedade organizada, lembrando dos esforços do movimento negro, também temos um governo sensível para essas questões.”

Gênero

A atual coordenadora-geral da União Brasileira de Mulheres, (UBM), Daniele Costa Silva, observou que atualmente as mulheres forma a maioria da população brasileira e, portanto, serão as mais beneficiadas com a nova lei de cotas sociais.
“Nós consideramos grande vitória dos movimentos sociais que sempre lutaram pela permanência dos menos favorecidos nas redes de educação. Para nós mulheres, é um salto a mais na busca pela igualdade de gênero”, disse Daniele Costa, que também lembra que a Lei de Cotas Sociais traz outras questões, algumas apontadas por Daniel Iliescu.
“Como se dará a permanência desse jovem na universidade? Ele precisa e merece uma visão mais crítica, mas para que tenha acesso tem que pensar em moradia estudantil, mobilidade, alimentação, enfim, contemplar a diversidade brasileira”, conclui a feminista, referindo-se ao Pnaes.
Deborah Moreira, Vermelho

A democracia relativa



Rodolpho Motta Lima

Países autointitulados democráticos estão mostrando a toda hora o relativismo desse conceito. Uma ação é tida como democrática quando consulta determinados interesses, mas uma outra atitude igual ou semelhante é tachada de antidemocrática se os contraria...
No reduto ocidental, que nos interessa diretamente,  Estados Unidos e Inglaterra – esse braço americano na Europa – tentam impor a concepção de que, em nome dos princípios democráticos,  é preciso haver uma “polícia mundial”, atuando, é claro, sob o comando deles,  que “coloque em ordem”  o planeta, segundo um conceito que quase  sempre esconde interesses discutíveis.
Em declaração recente, James Cameron , primeiro-ministro inglês, acusou a Argentina de colonialista em relação às ilhas Malvinas. Mas logo a Inglaterra é que vem falar disso, com sua vasta e não muito digna história nesse campo?  Logo a Inglaterra, que, há não muito tempo,  utilizando-se de uma falsa alegação de armas de destruição em massa e escondendo os verdadeiros objetivos petrolíferos da operação militar  , ajudou os americanos a invadir o Iraque?  Claro – dirão alguns -, o Iraque era uma ditadura.  Mas e as outras, da mesma região, aliadas do Ocidente, cujo petróleo já está “sob controle”?  É o tal princípio relativista de democracia , que se apregoa quando serve  e se esconde quando não interessa.
O caso  Assange, brilhante e exaustivamente tratado aqui no DR, caracteriza situação que envolve um atentado à  soberania nacional – insinuam-se ações contra a embaixada equatoriana - , e de profunda desfaçatez política – o estupro sueco como desculpa para a extradição do jornalista fundador do “Wikileaks”. Por que “desculpa”? Pela própria admissão da Suécia  de que poderá enviar Assange para os EUA se lá  não houver  risco de pena de morte (o estupro não seria então a razão e prisão perpétua pode...) . E qual é a postura dos órgãos midiáticos aqui do Brasil diante dessa perspectiva? Limitam-se a informar os fatos, sem qualquer análise , isso quando não deixam escapar simpatias pela extradição.
Em momentos como esse, percebe-se que, quando não interessa, não existe a tal visão crítica, ou, se existe, surge apoiada em pretensos “especialistas” colhidos a dedo.
Faço aqui uma comparação, só para provocar uma reflexão, com o  que vi na Globo a propósito  da declaração do candidato a prefeito do Rio de Janeiro, Freixo,  para quem, se eleito,  o município carioca só subvencionaria o Carnaval para as escolas de samba que, nos desfiles,  apresentassem bons projetos culturais, já que, na sua concepção,  o dinheiro público não pode servir, por exemplo, à promoção da revista “Caras” e coisas do gênero. Tanto bastou para que a turma global denunciasse um comportamento de censura (o que não é o caso, porque o que ele diz é que dinheiro público deve ser aplicado em interesse público). 
E é a mesma turma que se cala diante do caso-Assange que, com o Wikileaks, colocou a nu  ações governamentais  nem sempre dignas ou democráticas... São os mesmos, aliás, que não perdem uma oportunidade de defender o bloqueio a Cuba em função da ausência de liberdade na ilha cubana, mas calam-se quase totalmente quando se trata de referir-se à prisão de Guantânamo, essa excrescência  que mantém muitos seres humanos encarcerados sem acusação formal ou  julgamento, em uma das maiores manifestações de desapego aos direitos humanos nos dias que correm.
Mudo agora de exemplo, mas não de assunto. Ai do cidadão que não consegue ter discernimento (às vezes, recursos) para se informar corretamente através de fontes isentas  que lhe permitam distinguir o joio do trigo !  
Recentemente, a grande imprensa publicou resultado de um levantamento efetuado na América Latina a respeito dos índices de desigualdade social nos países que a compõem. Colocou-se em destaque negativo o Brasil , posicionado  em quarto lugar entre os  países  de maior desnível, só perdendo para Guatemala, Honduras e Colômbia. Também se informou, porque os estudos diziam isso, que essa posição revelava uma melhoria conquistada nos últimos anos, porque anteriormente o país liderava esse “ranking” perverso. É claro, porém, que a ênfase ficou para o negativo.
A linguagem da mídia usa frequentemente o recurso do “mas” para enfatizar o que pretende. Ensino aos meus alunos que o “mas” não é apenas uma partícula adversativa no discurso, mas (como estou fazendo agora) tenta construir a verdade que se pretende, desqualificando o anteriormente dito.  Se alguém diz que “ela não é rica, mas é inteligente”, está valorizando a inteligência, o que não fará com a mesma ênfase quem disser que “ela é inteligente, mas não é rica”, que soa como uma lamentação.   Preste atenção na linguagem da mídia “tucano-urubulina” quando se trata de informar virtudes do governo: há sempre um “mas”, geralmente acompanhado de “especialistas“, para desconstruir o impacto positivo da própria notícia...
Ainda nesse levantamento , a Venezuela aparece como o país de menor desigualdade social  e Cuba não foi relacionada (não deve fazer parte da América Latina...). Nenhum destaque para esse fato.  Aí, ficamos sem saber o que pensar, ou melhor, o que pensam esses “deformadores de opinião”: se o indicador de desigualdade é – como eu penso que seja -  um dado democrático importantíssimo , então a Venezuela está de parabéns (e ninguém ousou dizer isso nas reportagens). Mas se essa turma não acha isso relevante, porque destacar negativamente o Brasil ? Respondam os que, ingenuamente, não acreditam em manipulações e na necessidade de se regular essa liberdade de desinformar...       

quinta-feira, 30 de agosto de 2012

Em busca de soluções que produzam Cidades para pessoas


Ilustração de Juliana Russo

Num projeto jornalístico financiado por “crowdfunding”, Natália Garcia volta a viajar o mundo para encontrar caminhos que transformem a vida urbana

Por Gabriela Leite

Enquanto Brasília era inaugurada, nos anos 60, com suas enormes avenidas, superquadras e prédios monumentais, seguindo moldes do urbanismo e arquitetura modernistas, um primeiro passo era dado, na direção contrária, no Velho Continente. Em Copenhage, capital da Dinamarca, a prefeitura transformou, em 1962, uma grande rua comercial, chamada Strøget, em um calçadão apenas para pedestres. A reação inicial foi de grande crítica, mas com o tempo, comerciantes e habitantes passaram a perceber os benefícios obtidos. Esse foi apenas o começo de uma grande mudança que hoje exibe números impressionantes: 89% dos cidadãos se dizem satisfeitos com a cidade e 35% dos habitantes usa a bicicleta como meio de transporte em seu dia-a-dia.

quarta-feira, 29 de agosto de 2012

Tony Blair fica R$ 12 milhões mais rico graças a Geraldo Alckmin

Condenado pelos ingleses por seus negócios obscuros com ditadores, o ex-premiê inglês, que mantém consultoria no ponto mais caro de Londres, receberá R$ 12 milhões para elaborar um plano estratégico para São Paulo. Precisava disso, governador?

alckmin tony blair
Tony Blair e Geraldo Alckmin. Foto: Agência Brasil

O governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, anunciou ontem a contratação de um consultor de luxo: ninguém menos que Tony Blair, ex-primeiro-ministro da Inglaterra, que é condenado pelos próprios britânicos por seus deslizes dentro e fora do poder.
Na história do seu governo, Blair será carimbado para sempre como o primeiro-ministro que, ao lado de George W. Bush, apoiou a invasão do Iraque enquanto os ingleses marchavam em Londres com cartazes com a mensagem “no blood for oil” (nada de sangue por petróleo).
Fora do poder, se tornou dono de uma fortuna de mais de US$ 100 milhões, fazendo qualquer tipo de negócio – inclusive com ditadores, como Muammar Kadafi, dirigente líbio assassinado, e Paul Kagame, de Ruanda, acusado de violações aos direitos humanos.
Para formular um plano estratégico chamado “São Paulo 2030”, em parceria com o Movimento Brasil Competitivo, a Tony Blair Associates receberá R$ 12 milhões, por um ano de trabalho. É uma consultoria de luxo, paga a um personagem que entende pouco ou quase nada de Brasil, numa parceria que se torna ainda mais estranha num estado como São Paulo, que tem a melhor universidade da América Latina: a USP.
Alckmin tentou justificar o convênio. “Nós já temos um conjunto de estudos, projetos, e vários estudos de planejamento, mas estamos firmando uma parceria muito importante na SP2030, com estudos de planejamento para a eficiência”, afirmou. Blair, por sua vez, falou sobre o que fará com os seus R$ 12 milhões. “A proposta é ajudar a levantar os projetos que serão prioridade para São Paulo no futuro, e nossa equipe vai trabalhar de forma conjunta para ajudar a implementar esses programas”, disse.
Com sua consultoria na Grosvernor Square, um dos pontos mais nobres de Londres, Blair incomoda os britânicos por sua gula financeira. Nunca um político inglês se tornou tão rico quanto ele. 
Seus vôos só ocorrem em jatos particulares. 
E não há nada que ele possa ensinar que São Paulo não possa fazer sem sua ajuda (clique aqui e leia matéria do The Telegraph sobre a fortuna de Tony Blair).

Especialista fala da militarização nas subprefeituras de São Paulo

Guaracy Mingardi critica o atual modelo da capital paulista. Na foto de 2009, da esq. para a dir., o prefeito Gilberto Kassab, o governador José Serra e o coronel da PM Álvaro Camilo, que indicou 30 dos atuais 31 subprefeitos


José Francisco Neto
da Redação


Policiais militares estão cada vez mais infiltrados nos setores da administração pública no Estado e na capital paulista. Atualmente, 30 dos 31 subprefeitos de São Paulo são coronéis da reserva da PM. 
Em foto de 2009, o coronel da PM Álvaro Camilo ao lado de Serra e Kassab
Foto: André Vicente/Folhapress 15/04/2009
Todos foram indicados pelo ex-comandante da corporação Álvaro Camilo que se afastou do cargo para concorrer à uma vaga na Câmara Municipal, pelo Partido Social Democrata (PSD), de Gilberto Kassab.

Essa política de militarização das subprefeituras começou em 2008, com a indicação do coronel Rubens Casado para a subprefeitura da Mooca, na segunda gestão do prefeito Gilberto Kassab. De la pra cá, o número de policiais na máquina municipal multiplicou. 
Além das subprefeituras, eles se encontram em órgãos como a Secretaria de Segurança Pública, Secretaria de Transportes, Companhia de Engenharia de Tráfego (CET), serviço funerário, serviço ambulatorial e defesa civil.

Em entrevista ao Brasil de Fato, o analista criminal e especialista em segurança pública, Guaracy Mingardi, critica esse modelo de militarização da administração pública adotado pela prefeitura.

“O que o coronel tem que se habilitar é para gerir o batalhão e a área policial. É isso que ele tem que fazer. Isso que em princípio que eles deveriam ter aprendido.”
Mingardi, além de ser há 25 anos analista criminal, também é cientista político e membro da Comissão Nacional da Verdade.

Brasil de Fato - O que representa pro senhor essa militarização na máquina pública?

Guaracy Mingardi - É uma tentativa errada de fazer funcionar a máquina pública. Na verdade, o que acontece, é que partiram do princípio que o coronel sabe mandar, o que é uma bobagem. Mandar numa estrutura militar e numa estrutura civil são coisas diferentes. O que precisava nessas administrações regionais, por exemplo, era ter ou bons administradores ou sujeitos que possuam traquejo político, e os coronéis não tem nem uma nem outra coisa. Eles foram escolhidos, não porque eram bons, mas por serem coronéis. Esse é o erro. Foram escolhidos porque tinham determinado cargo. Jogaram muita coisa na mão deles e muitos não têm a capacidade administrativa na área civil, muito menos traquejo político.

Atualmente, os coronéis estão em 30 das 31 subprefeituras. Qual o risco, já que eles são praticamente síndico das cidades?
O risco maior de eles estarem nas subprefeituras é que as cidades ficam desassistidas por falta de capacidade da parte deles. E outra coisa é que você desestimula o servidor civil, dizendo que pra tudo os coronéis são melhores, e se dá um poder para a corporação da polícia militar que ela nunca teve. O que o coronel tem que se habilitar é pra gerir o batalhão e a área policial. É isso que eles têm que fazer. Isso que em princípio eles deveriam ter aprendido, mas muitos não têm nem a condição de fazer isso. Agora imagina se vão ter condições pra gerir outra coisa além daquilo que supostamente eles aprenderam. Gerir um comando de área de um batalhão é completamente diferente de gerir uma administração de uma área civil.

Qual o interesse do prefeito de São Paulo em nomear militares na administração das cidades?
Primeiro é aquela história boba: já que a prefeitura está fazendo a "operação delegada" ["bico oficial" em que policiais militares trabalham para a Prefeitura nas horas vagas] -, você precisa por coronel, porque aí eles têm poder de comando sobre os PM´s. Mas se eles não estão na ativa, não tem poder de comando nenhum. Mesmo que tivesse, você está pagando, você tem o direito de exigir, não interessa se é o administrador de uma área da cidade e ela está pagando para a PM fazer aquele serviço. Não interessa se é coronel. Portanto, é uma série de erros, um atrás do outro, que está deixando a cidade muito mal administrada.

O que poderia ser feito para mudar essa questão? Uma eleição, por exemplo?
Eleição eu acho complicado. No mínimo, você tem que nomear como administrador ou como subprefeito, por exemplo, pessoas que têm conhecimento na área, que tem algum tipo influência. Pessoas que dialoguem com a população, além da capacidade administrativa. Tem que ter o diálogo nas duas pontas: com a população - com as ONG´s, associações de bairro - e também com a Câmara Municipal. 

A insensibilidade frente a desgraça ...como comportam-se as elites



As elites costumam participar ou ser entretidas pelo show contra a miséria, anualmente.  Assim redimem-se de sua insensibilidade e contribuem com alguns trocados em prol dos desamparados.  Mas muitos sonegam bilhões em impostos, o que assola a vida daqueles que fingem ajudar...
O País traído

Em São Paulo, tempos ásperos. Leio: uma residência particular é assaltada a cada hora, o roubo de carros multiplica-se nos estacionamentos dos shopping centers. Entre parênteses, recantos deslumbrantes, alguns são os mais imponentes e ricos do mundo. Que se curva. Um jornalão, na prática samaritana do serviço aos leitores, fornece um receituário destinado a abrandar o risco. Reforce as fechaduras, instale um sistema de alarme etc. etc.
Em vão esperemos por algo mais, a reflexão séria de algum órgão midiático, ou de um solitário editorialista, colunista, articulista, a respeito das enésimas provas da inexorável progressão da criminalidade. Diga-se que uma análise honesta não exige esforço desumano, muito pelo contrário.

Enquanto as metrópoles nacionais figuram entre as mais violentas do mundo, acima de 50 mil brasileiros são assassinados anualmente, e um relatório divulgado esta semana pelas Nações Unidas coloca o Brasil em quarto lugar na classificação dos mais desiguais da América Latina, precedido por Guatemala, Honduras e Colômbia. O documento informa que 28% da população brasileira mora em favelas, sem contar quem vive nos inúmeros grotões do País.

Vale acrescentar que mais de 60% do nosso território não é alcançado pelo saneamento básico. Ou sublinhar a precariedade da saúde pública e do nosso ensino em geral. Dispomos de uma cornucópia maligna de dados terrificantes. Em contrapartida, capitais brasileiros refugiados em paraísos fiscais somam uma extravasante importância que coloca os graúdos nativos em quarto lugar entre os maiores evasores globais.

É do conhecimento até do mundo mineral que o desequilíbrio social é o maior problema do País. 
Dele decorrem os demais. Entrave fatal para o exercício de um capitalismo razoavelmente saudável. E evitemos tocar na tecla do desenvolvimento democrático. Mas quantos não se conformam? Não serão, decerto, os ricos em bilhões, e a turma dos aspirantes, cada vez mais ostensivos na exibição de seu poder de compra e de seu mau gosto. Não serão os profissionais da política, sempre que não soe a hora da retórica. Não será a mídia, concentrada no ataque a tudo que se faça em odor de PT, ou em nome da igualdade e da justiça.

Nada de espantos, o Brasil ainda vive a dicotomia casa-grande–senzala. CartaCapital e especificamente o acima assinado queixam-se com frequência do silêncio da mídia diante de situações escusas, de denúncias bem fundamentadas, de provas irrefutáveis de mazelas sem conta. Penso no assunto, para chegar à conclusão de que há algo pior. Bem pior. Trata-se da insensibilidade diante da desgraça, da miséria, do atraso. Da traição cometida contra o País que alguns canalhas chamam de pátria.

Exemplo recentíssimo. 
Há quem lamente os resultados relativamente medíocres dos atletas brasileiros nas Olimpíadas de Londres. Parece-me, porém, que ninguém se perguntou por que um povo tão miscigenado, a contar nas competições esportivas inclusive com a potência e a flexibilidade da fibra longa da raça negra, não consegue os mesmos resultados alcançados em primeiro lugar pelos Estados Unidos. Ou pela Jamaica. Responder a este por que é tão simples quanto a tudo o mais. O Brasil não é o que merece ser, e está muito longe de ser, por causa de tanto descaso, de tanto egoísmo, de tanta ferocidade. De tanta incompetência dos senhores da casa-grande. Carregamos a infelicidade da maioria como a bola de ferro atada aos pés do convicto.

Mesmo o remediado não se incomoda se um mercado persa se estabelece em cada esquina. Basta erguer os vidros do carro e travar as portas. Outros nem precisam disso, sua carruagem relampejante é blindada. Ou dispõem de helicóptero. Impávidos, levantam seus prédios como torres de castelos medievais e das alturas contemplam impassíveis os casebres dos servos da gleba espalhados abaixo. A dita classe média acostumou-se com os panoramas da miséria, com a inestimável contribuição da mídia e das suas invenções, omissões, mentiras. E silêncios.

Às vezes me ocorre a possibilidade, condescendente, de que a insensibilidade seja o fruto carnudo da burrice.

terça-feira, 28 de agosto de 2012

PSDB - Candidata a vereadora usa Facebook para fazer campanha de ódio e palavrões

O avatar de Daniela Schwery parece um monstro que, após várias camadas de inserções, ganhou vida própria na internet, como atestam seus quatro ­blogs. A candidata se especializou em disseminar ódio e preconceito

dani schwery psdb facebook
Dani Schwery usa as redes sociais para fazer uma campanha de palavrões e lugares-comuns.

Foi uma aula de política a distância. A dois meses das eleições, Dani Schwery, candidata a vereadora pelo PSDB de São Paulo, cristalizou em um só post no Facebook toda a ideologia conservadora escondida na polidez da direita brasileira. A “piadinha básica do dia” falava de um prédio de quatro andares incendiado. No primeiro viviam famílias de sem-teto, filhos de presidiários com auxílio do governo. Morreram todos.
No segundo, “retirantes” sustentados pelo Bolsa Família: pereceram. No terceiro havia famílias de ex-guerrilheiros, beneficiários de ações judiciais contra a ditadura, filiados “a um ParTido político influente”. Ninguém sobreviveu. Só no quarto, onde viviam engenheiros, advogados e outros “trabalhadores”, todos escaparam. A presidenta mandou instaurar um inquérito para saber por que morreram os “cumpanheiros” e só escaparam os moradores do quarto andar. A resposta: “Eles não estavam em casa. Estavam trabalhando”. No fim do post, Dani arremata: foi a melhor do ano.
Na manhã seguinte, ela respondeu às críticas sobre o suposto fascismo disfarçado de humor. Mas retratação não é um termo do seu vocabulário, tão ­pródigo em palavrões como econômico no uso de vírgulas e acentos. “Choveu denuncia por causa de uma piadinha!”, ironizou. “I AM BACK pior que antes. Mais anti vagabundo (sic) e oportunista que nunca!!!” Pelos excertos virtuais vê-se que Dani existe em carne e osso e, parece, é autoconsciente.

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Tem 32 anos e é ariana, “pois nasci sob o signo de Áries”. Formada em Direito, “mas não atua”, é “extrovertida, desbocada, mas que tem um lado extremamente altruísta”, descreve-se em terceira pessoa. “A Dani adora beber uma cervejinha com os amigos” e “tirar sarro de corintianos e petistas”, pois “tem um humor sarcástico, irônico e escrachado, ora dando a falsa impressão de ser preconceituosa, mas não o é”. Ela usa piadas “para fazer críticas sociais”, as pessoas é que são burras. “Isso mesmo, BURRAS! Eu, como candidata, não devia dizer isso? Lamento, não deem motivo então! Ou então digiram (sic) aí o significado da palavra BURRO com direito a relinchada, pode bater o pezinho também.”
A bacharel fez cursos na FGV, Fiesp e OAB. “Estudei um pouco em Londres, e mais um monte de outros cursos… mas e daí? Formação só tem valor se vem junto com caráter e ‘culhão’. Isso eu tenho de sobra.” Por que ela decidiu deixar o balcão de seu restaurante no Tatuapé, na zona leste de São Paulo, para se candidatar à Câmara? “Eu adooooro política, adoro um bate-boca, adoro um barraco.” Dani já sofreu “muito abuso” na vida. “O que é então aguentar uma cambada de caga decoreba que adora citar o livro ‘O Príncipe’”? Até porque “uma pessoa que quer ir para a política não pode ser normal. Sou sadomasoquista, só pode! Porque basta entrar nisso que já vem gente de tudo que é lado me linchar. E quer saber? Foda-se!”
Dani Schwery psdb vereadora facebook
Dani Schwery representa o futuro do partido de Alckmin? Ou o presente?

O avatar de Daniela parece um monstro que, após várias camadas de inserções, ganhou vida própria na internet, como atestam seus quatro ­blogs. No Diário de uma Louca, ela diz ter nascido “num contexto familiar bem podre”. “Meu pai é um escroto, valores deturpados, sem princípios, hipócrita, manipulativo, controlador, ardiloso, ditador, um podre enfim. Signo: ­escorpião. Por aí já façam uma ideia.” A mãe era abastada, mas caiu nas garras dele. “Eu apanhava por qualquer motivo.”
A culpa era da irmã, uma gorda invejosa. “Isso aí é meu DNA. Imaginem como meu psicológico não ficava arrebentado e imaginem as consequências disso tudo.” O resto é psicanálise. Verdade: a cada eleição, uma nova revoada de criaturas exóticas em busca de um lugar ao sol no horizonte da política se abate sobre o País. Para conquistar espaço, a regra é fazer barulho – e não se inventou lugar melhor que as redes sociais. ­Alimentando-se nas pastagens do Facebook e do Twitter, os neófitos do hábitat eleitoral ganham plumagem vistosa, assumem posição de liderança e compartilham o ranço trazido dos confins do universo pessoal. Mas poucos têm a audácia de dizer tanto e tão pouco.
Quando alguém disse que ela resumia o que Serra pensava, mas não tinha coragem de dizer, a resposta veio em 2002 palavras. “Humor/sátira também é ferramenta de crítica, cada um entendeu a piada como quis e nesse tocante não sou responsável pelo entendimento do outro (…) que quis por opção de ordem pessoal interpretar.” Show de retórica. “E convenhamos, temos direito ao preconceito.”
A análise então migra para um misto de sofística e história para embalar bovinos no sono do niilismo cibernético. Os petistas seriam como Stalin. “Você é um monstro assassino e sanguinário então, nós, do PSDB, somos fichinhas comparados a vocês neste caso.” No frêmito, ela beira a santidade. “Me sinto elogiada por você e a sua turminha quando chamada de fascista.” E arremata: “Vamos deixar claro que trata-se de uma ironia (…) visto que o sarcasmo é algo como enfiar uma jaca no meio do c… de vocês”.

dani schwey vereadora psdb facebook
A candidata publica piadas fascistas no Facebook, xinga gente no Twitter e faz vídeos nos quais “exorciza” esquerdistas. 

Em um vídeo do YouTube, a exterminadora de “petralhas” contracena com um rapaz de vermelho, que surge com um livro de Marx para ouvir dela: “Vai trabalhar”. Um padre aparece e os dois o exorcizam, até ele acordar de camiseta azul, crente que “o capitalismo é uma coisa boa”. Em outro, seu séquito surge disposto a resolver os problemas do País.
Após fazerem um chá de fita, decidem faltar ao trabalho e pedir uma bolsa ao governo. Para quem a acusa de vazio programático, ela rebate: seu foco é “fazer as pazes com a polícia” e melhorar o trânsito. “Já notaram que amarelinho ou policiais civis adoram tumultuar com São Paulo bem no horário de pico?”
Dani parece uma Michele Bachmann do Tatuapé.
Catapultada à candidatura à Presidência dos EUA por ecoar os ressentimentos e preconceitos da direita em disparates na mídia, Bachmann divertiu as primárias. Para um País que elegeu Tiririca, Dani parece ser a última fronteira.

William Vieira

Prefeitura de SP põe 94 famílias sem-teto na rua

Sem alojamento, os sem-teto da ocupação Ipiranga ficaram na calçada com suas roupas dentro de sacos de lixo nesta terça-feira (28); no imóvel, antes da ocupação, funcionava um hotel que estava abandonado há mais de sete anos


José Francisco Neto
de São Paulo

As 94 famílias sem-teto que ocupavam o prédio da avenida Ipiranga, 908, no centro de São Paulo, foram despejadas na manhã desta terça-feira (28). Com a presença de dezenas de policiais militares prontos para fazer a reintegração de posse, os moradores decidiram sair do prédio pacificamente para evitar confrontos.
Sem ter para onde ir - já que a prefeitura deixou claro aos moradores que não terá alojamento por falta de verba - as famílias, neste momento, estão na calçada com suas roupas em sacos de lixo. 
De acordo com o advogado e assessor jurídico do movimento das famílias sem-teto, Manoel Del Rio, havia uma decisão do tribunal de justiça que obrigava a prefeitura a atender as pessoas com pelo menos um alojamento provisório, mas que nada foi apresentado efetivamente. 
“Eles estão descumprindo a decisão do tribunal. Pode até cumprir a liminar da reintegração de posse, mas desde que atendam as famílias em alojamento”, ressalta.
O coordenador da Frente de Luta Por Moradia (FLM), Osmar Silva Borges, também afirma que as famílias deveriam ser alojadas até a decisão do tribunal. “Até agora não foi oferecido nenhum tipo de alojamento, o que existe é um arrolamento das famílias que foi feito ontem (27) até as dez da noite, mas não tem até agora nenhuma oferta de um local para as famílias ficarem alojadas”, aponta.
Porém, o major operador do 7º Batalhão da Polícia Militar, Edenilson Accarini, disse que o direito de moradia tinha que ser tratado num processo judicial, e que não era autoridade para decidir isso. Accarini ainda falou que no processo não está incluído o alojamento, por isso, considera o assunto “mais do que esgotado”. 
“O problema do alojamento não é da Polícia Militar e também não sei se seria da Prefeitura, porque se a Prefeitura não foi intimada a cumprir essa parte, ela não tem obrigação nenhuma”, salienta o major.
Neste imóvel em que as famílias moravam, antes, funcionava um hotel que estava abandonado há mais de sete anos. Quando ocuparam, no dia 6 de novembro de 2011, o prédio estava sujo, sem esgoto, sem água e sem luz, conforme afirmou a coordenadora da ocupação, Maria do Planalto. “Estamos há 10 meses neste prédio. Se hoje ele tem esgoto, água e luz é porque nós mesmos reformamos tudo”, conta.

Com lágrimas e sem rumo
Com lágrimas nos olhos, os moradores, após uma rápida assembleia, decidiram sair pacificamente do prédio. Coordenadores, advogados e a imprensa participaram também da reunião.
Silmara, ex-moradora do apartamento 132, disse ao Brasil de Fato que não tem para onde ir. Estudante de enfermagem da Uniesp, ela estava no prédio desde o início da ocupação, junto com seu cunhado e sua a mãe. “Muitos aqui fazem faculdade e a maioria trabalha. Agora, estamos sem rumo”, lamenta.
A reportagem do Brasil de Fato conversou com vários moradores, e todos afirmaram que não querem nada de graça. “Nós queremos pagar, nós só queremos ter o direito de moradia.”
Ivanildo Mendes, 40, que morava com a esposa e mais dois casais, disse também que irá ficar na rua. 
“Eu trabalho de jardineiro, não tenho condições de pagar um aluguel. Nós só queremos ter o direito de moradia”, disse em prantos.
Até o fechamento da matéria, as mais de 90 famílias, incluindo 78 crianças e diversos idosos, ainda estavam na calçada com suas roupas dentro de sacos de lixo. Ninguém da Prefeitura estava presente para comentar o caso.

Eliana Calmon recua e arquiva ação contra juízes do Pinheirinho; advogados, perplexos, vão recorrer

“A ministra Calmon, que é vista pela mídia tradicional como paladina da moralidade, deve uma explicação à sociedade.”


Em junho, Eliana Calmon recebeu moradores e advogados do Pinheirinho. 
Todos estão surpresos com a decisão de ela arquivar a ação, 
logo após ter cobrado explicações dos juízes. 
Foto: Arquivo pessoal
por Conceição Lemes
Seis dias após a Corregedoria Nacional de Justiça decidir cobrar explicações dos juízes envolvidos na violenta desocupação do Pinheirinho, em São José dos Campos, SP, a ministra Eliana Calmon mandou arquivar tudo nessa sexta-feira 24. A Corregedoria é um dos órgãos do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Calmon é a Corregedora Nacional de Justiça.
Em 16 de junho, advogados e representantes de entidades de defesa dos direitos humanos estiveram em Brasília com Eliana Calmon para entregar a reclamação disciplinar (é o nome técnico da representação), assinada por vários juristas, contra:
Ivan Sartoripresidente do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP)
Cândido Além, desembargador do TJ-SP
Rodrigo Capez, juiz da presidência TJ-SP
Marcia Faria Mathey Loureirojuíza da 6ª Vara Cível de SJC
Luiz Beethoven Giffoni Ferreira, juiz da 18ª Vara Cível do Fórum Central João Mendes
A representação visava à apuração das responsabilidades disciplinares deles na desocupação do Pinheirinho.
Em 16 de agosto, a Corregedoria Nacional de Justiça determinou a notificação dos cinco magistrados, paraprestar esclarecimentos sobre acusações que constam contra eles na representação. Deu prazo de 15 dias, para a decisão ser cumprida.
Porém, nessa sexta-feira 24, a Corregedora Nacional de Justiça, voltou atrás, mandando arquivar a ação. Na sua decisão, a ministra Eliana Calmon argumenta:

Observa-se que a competência fixada constitucionalmente para este Conselho Nacional de Justiça é restrita ao âmbito administrativo e financeiro do Poder Judiciário, não podendo ocorrer à intervenção em conteúdo de decisão judicial para corrigir eventual vício de ilegalidade ou nulidade.

Assim, quanto ao mérito dos atos realizados no curso do processo, a parte deve valer-se dos meios recursais próprios, ainda que caso-a-caso, não se cogitando da intervenção deste Conselho.

Com isso, nos termos em que posta à questão, o pedido realizado pelo reclamante não possui condições de prosperar, pois estão relacionados ao exame de matéria eminentemente jurisdicional.

“É incompreensível. Há seis dias saiu um despacho dando andamento à representação e mandando intimar os magistrados responsáveis”, observa, atônito, Marcio Sotelo Felippe, procurador do Estado de São Paulo. “O que houve nesse tempo?”
“Como é possível que a barbárie do Pinheirinho se resolva disciplinarmente com um despacho burocrático?”, ainda mais atônito, ele continua. “A ministra Calmon, que é vista pela mídia tradicional como paladina da moralidade, deve uma explicação à sociedade.”
Também muito surpresa está Camila Gomes de Lima, que integra um grupo de advogados amigos do Pinheirinho. Para ela, o despacho da ministra Calmon é muito genérico.
“Não analisou individualização das condutas de cada juiz nem os relatos sobre extrapolamento das competências. Até o nosso pedido, de cunho mais geral, para que o CNJ reflita e emita resolução sobre o tratamento judicial dos conflitos fundiários, ficou sem resposta”, atenta a advogada. “Simplesmente disse arquive-se! Agora, se todo requerimento administrativo tem de ser devidamente respondido, que dirá um requerimento para órgão de controle como o CNJ!”
“Nós sabemos que é um caso complexo, que tramitou por mais de oito anos e repercutiu na vida de mais de 6 mil pessoas”, argumenta Camila. “Mas vamos insistir, porque é um caso emblemático e sobre o qual o CNJ deve se debruçar, sim, para averiguar a fundo a lisura dos cinco magistrados envolvidos, se agiram em conformidade com os seus deveres funcionais, com o código de ética da magistratura. Isso é competência do CNJ.”
“Nós fomos à ministra Eliana Calmon, pois a Corregedoria Nacional de Justiça é responsável por receber esse tipo de denúncia”, ressalta Camila. “Agora, como a reclamação disciplinar não foi aceita, nós vamos, via recurso, para plenário do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), integrado por todos os conselheiros, inclusive a ministra Calmon. A Comunidade do Pinheirinho não é de desistir, vai insistir.”
Antonio Ferreira, um dos advogados dos moradores do Pinheirinho, também lamenta o despacho da corregedora: “Nós vamos recorrer, sim, ao plenário do CNJ. Os cinco juízes têm, de, no mínimo, explicar por que passaram por cima das leis, do estado de Direito. Não há toga acima da lei”.
Para Cezar Britto, ex-presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB Nacional) e advogado da Comunidade do Pinheirinho, a decisão pelo arquivamento reflete o ponto de vista de um dos julgadores do CNJ, não do órgão colegiado.
“Como são violações aos princípios de direitos humanos e aos deveres funcionais dos magistrados, insistiremos na reapreciação da matéria agora de forma mais coletivizada”,  fundamenta Cezar Britto. “A corregedora apenas afastou a apreciação sob o ângulo da ausência de competência do CNJ, não analisando seu mérito. É o mérito, porém, que comprova as denúncias apresentadas”.
Imagem emblemática da barbárie de 22 de janeiro de 2012. 
O massacre do Pinheirinho completou sete meses. 
Os mais de 6 mil moradores perderam tudo. Ninguém foi punido.

Memórias da Resistência, novo filme sobre a ditadura

No esforço para restaurar verdade sobre anos de chumbo, documentário aborda luta estudantil no Crusp e guerrilha efêmera em Riberirão Preto

Por JR Penteado

Em meio ao início dos trabalhos da Comissão da Verdade, a filmografia nacional sobre a ditadura militar está prestes a ganhar nova contribuição. Dirigido por Marco Escrivão, o documentário Memórias da Resistência vai trazer a história de ex-presos políticos que participaram da resistência ao regime ditatorial que vigorou no Brasil entre 1964 e 1985. A expectativa de lançamento é para o fim do ano.
“O objetivo principal desse trabalho é justamente manter bem viva a memória sobre esse momento histórico do país e evitar que ele se repita algum dia”, diz Escrivão.
Na origem do documentário, um fato bastante curioso. Em 2007, uma pilha de documentos antigos foi encontrada por trabalhadores rurais em uma casa abandonada no meio de um canavial no município de Jaborandi, interior de São Paulo. Um dos trabalhadores, que também era estudante de História, reconheceu de imediato a relevância histórica dos documentos. Tratava-se de material do DOPS (Delegacia de Ordem Política e Social), um dos principais organismos de repressão política da Ditadura.
“Posteriormente, o Cleiton, estudante de História, voltou à casa abandonada no canavial juntamente com um professor de sua faculdade e eles recolheram todos os documentos que estavam espalhados por lá. Tudo foi digitalizado e entregue ao Arquivo Público do estado”, relembra Escrivão. Descobriu-se depois que a casa era de Tacito Pinheiro Machado, um ex-delegado do DOPS.
Os documentos foram analisados por membros do Instituto Práxis de Educação e Cultura, baseado em Franca-SP. Entre eles, estava Tito Bellini, o professor de história que coletou os documentos em primeira mão, e que decidiu encabeçar o projeto para a realização de um documentário.
“O Tito inscreveu um projeto para um edital de Mídias Livres do Ministério da Cultura em 2010. Em 2011 o projeto foi aceito, e o Minc liberou 100 mil reais pra que fizéssemos, além do documentário, seis boletins informativos, um livro e o site.”
A pilha encontrada no canavial trazia fichas de presos políticos, envelopes de correspondências, relatórios, e até um “Manual de Subversão e Contra-subversão”. A maior parte das fichas dizia respeito a dois IPMs (Inquérito Policial Militar) em particular.
O primeiro é o IPM 114/69, que tratava da atuação das Forças Armadas da Libertação Nacional (FALN), guerrilha criada em meados de 1967 por dissidentes do PCB (Partido Comunista Brasileiro) e que teve uma breve atuação na região de Ribeirão Preto-SP, até ser desmantelada por agentes do regime.
O outro inquérito é o IPM-CRUSP, que tratava da resistência política na moradia estudantil dos alunos da USP (Universidade de São Paulo), outro grande pólo de militantes contrários à Ditadura.
São essas duas histórias que o documentário vai contar.
“Entrevistamos no total doze ex-presos políticos, ao longo de cinco meses. Eles contaram sobre a atuação na resistência, o idealismo que compartilhavam, as torturas que sofreram”, fala Escrivão.
Perguntado sobre como se sentiu diante das histórias contadas, sobretudo dos relatos de torturas, Escrivão respondeu confiante.
“De fato, a história mexeu um pouco comigo e até aconteceu de ter pesadelos em algumas noites. Mas tenho em mente que trabalhar nesse documentário, de certa forma, é continuar a luta que essas pessoas travaram no passado, cumprindo um outro papel, o de resgate histórico. E é esse sentimento, por exemplo, que me fez enfrentar 13 horas de ônibus só para participar da primeira audiência pública da Comissão da Verdade [ocorrida no dia 30 de agosto], onde pude divulgar o documentário”.
O site do projeto é www.memoriasdaresistencia.org.br. Lá também é possível ler os boletins informativos e ver um teaser do documentário.

O noticiário e a propaganda oficial


violencia en chihuahua
Por Luciano Martins Costa, em Observatório da Imprensa
A reportagem que faz a manchete da edição de segunda-feira (27/8) do jornal O Estado de S. Paulo oferece uma oportunidade interessante para a análise das escolhas da imprensa tradicional, que supostamente ainda concentra a agenda dos assuntos públicos.
“Homicídios caem em São Paulo, após 4 meses de alta”, diz o título, no alto da primeira página. Os números apresentados junto à manchete são impactantes: queda de 24,5% em julho, comparados os números aos do mês anterior.
Segundo o jornal, o relatório completo seria divulgado ao longo do dia pela Secretaria de Segurança, o que significa que a assessoria do governo tomou a iniciativa de antecipar alguns dados para um dos dois grandes diários da capital.
Agora, vejamos como foi composta essa “reportagem” que, na verdade, é a transcrição direta de material fornecido pela assessoria de imprensa oficial.
Todo jornalista mais ou menos experiente sabe que não tem grande importância comparar dados de fatos sociais mês a mês quando algumas circunstâncias sazonais afetam as ocorrências. Portanto, comparar julho a junho tem apenas efeito publicitário e pouca relevância jornalística, pois o mais correto seria comparar o mesmo mês a cada ano, ou períodos equivalentes, como os trimestres.
Perguntem às vítimas
Na primeira página do Estadão, a redução do número de homicídios em São Paulo teria sido de quase 25%, o que efetivamente gera um noticiário positivo para o governo paulista e para a prefeitura da capital. Mas, segundo a reportagem interna, na comparação com o mesmo mês do ano anterior, a queda foi de 13%.
Outra questão: observando-se o gráfico publicado nas páginas internas, percebe-se que os números da violência não caíram. Ao contrário: comparando-se mês a mês, o ano de 2012 teve mais assassinatos nos primeiros sete meses em relação ao mesmo período de 2011, tanto na capital quanto no estado de São Paulo.
O interessante é que o jornalão compra pelo valor de face a avaliação das autoridades de que a queda em julho passado, em comparação com o mês anterior, representa uma mudança importante na tendência. Qualquer acontecimento fortuito – como, por exemplo, a interrupção de jogos do campeonato brasileiro de futebol durante as Olimpíadas – pode ter interferido nesses números.
A tese do governo paulista, aparentemente aceita pela imprensa, é de que o estouro da criminalidade nos últimos meses havia sido “apenas uma bolha”.
Ora, essa linguagem estatística aplicada a um problema social tão grave chega a ser um desrespeito com as famílias das centenas de paulistanos – principalmente jovens do sexo masculino – que são assassinados em São Paulo todos os meses. Vá alguém dizer à mãe de uma dessas linhas estatísticas que seu filho foi vítima de “uma bolha de violência”.
Lá em cá
Toda tentativa de análise fria de eventos sociais implica grande risco para o jornalismo, por causa da complexidade inerente aos fatos. Isso era lição básica de jornalismo. Outra preocupação básica do jornalismo de qualidade seria o cuidado de submeter a intensa crítica tudo que vem de fontes oficiais. As duas lições foram esquecidas pelo Estadão na edição de segunda-feira (27).
Observe-se que, em outra seção do mesmo jornal, na área do noticiário internacional, há uma reportagem de página inteira dedicada ao mesmo tema, porém os números se referem à fronteira do México com os Estados Unidos. Ali, mais precisamente na localidade mexicana de Ciudad Juárez, as autoridades comemoram a redução dos assassinatos relacionados à guerra dos cartéis de drogas.
Uma ação integrada das forças armadas do México, que contou com financiamento dos Estados Unidos e ajuda de autoridades colombianas, foi a principal causa da redução brusca da violência, mas o jornal cita também que o fato de um dos cartéis ter dominado a região, eliminando os concorrentes, pode ter influenciado nas estatísticas.
De qualquer maneira, há claras distinções entre os dois fenômenos, mas alguns números são curiosos: no auge da guerra do narcotráfico, quando o estado de Chihuahua, onde fica Ciudad Juárez, se transformou numa região sem lei, as estatísticas chegavam a passar de 300 mortos por mês.
No estado de São Paulo, a média mensal é superior a 350 mortes e supostamente estamos vivendo em paz.
No texto da primeira página, o Estadão faz uma pequena concessão à verdade dos fatos, observando que houve um aumento no total de homicídios em todo o estado, de 2.390 no primeiro semestre de 2011 para 2.530, no mesmo período deste ano.
“A taxa de homicídios, de 10,3 casos por 100 mil habitantes, ainda indica uma epidemia de violência”, conclui a chamada de manchete.
Esse é o fato. O resto é propaganda oficial, que o jornalão engole sem discutir.

segunda-feira, 27 de agosto de 2012

Gritos dos/as Excluídos: Os gritos que a gente não vê na 5ª maior economia do mundo



Adital
"Vi na TV que em Florianópolois, em Santa Catarina, estão contratando pedreiros de "luxo”. Salário de R$5.000,00, mais casa, alimentação e lazer. É por isso que estou indo. Não pensei duas vezes. Pobre não tem escolha”. A frase é de Sérgio, 25 anos, 1º grau de escolaridade incompleto, com quem viajei num ônibus, do Vale do Jequitinhonha (Minas Gerais) até São Paulo com destino final, Florianópolis. A ação de Sérgio é como um Grito de milhares de trabalhadores sub-empregados ou desempregados sujeitos a trabalhos de qualquer espécie para sobreviver em um Brasil que acaba de se tornar a "5ª maior economia do mundo”.
Deslocamentos de trabalhadores ocorrem e são impulsionados no bojo da mundialização do capital, da transnacionalização de empresas, da financeirização, autonomização da produção, cujo caráter principal é a desregulamentação da política, da economia, a informalidade do trabalho, e, o esgarçamento da cidadania e da democracia. Veja-se o tratamento policial sobre as greves de trabalhadores nos canteiros de obras da Copa 2014 e do Rio Madeira para a construção de barragens. Quantos milhares de Sérgios não têm acesso à trabalho decente e à saúde na 5ª maior economia do mundo?
Dias depois, conheci dona Eloisa, 51 anos, cearense do Crato, em São Paulo. Ela tinha rosto sofrido, mas brilho, alívio e sorriso no olhar. Durante 20 anos dormira sob papelão em um barraco às margens do Tamanduateí. Mas, há cinco anos, foi à luta com o movimento dos sem-teto. Enfrentou a violência do Estado policial e o preconceito. Há dois dias, ela conseguiu uma casa popular. Muito contente, disse-me que voltava do centro da cidade, onde fora comprar um colchãozinho inflável. Depois de 25 anos ia poder voltar a dormir em um colchão. Mais um Grito por moradia abafado. Quantos milhares de famílias dormem em barracos de madeiras às margens de esgotos e lixões na 5ª maior economia do mundo?
Outro Grito veio de um imigrante boliviano, José Jamil, que trabalhou como escravo em oficinas de costura, em São Paulo-SP. Resgatado, Jamil disse não "ter para onde ir”. Não havia outra alternativa senão permanecer alvo das empresas transnacionais e suas fornecedoras que lhes supre de mercadorias baratas às custas do trabalho mal pago ou escravo de muitos imigrantes. Quantos imigrantes trabalham como escravos, sem moradia, sem escola, sem acesso à cidadania na 5ª maior economia do mundo?
Em um dos bancos do terminal urbano Ana Rosa conheci o Marcelo, 25 anos. Ele dizia que já fora pessoa trabalhadora com seu pai e sua mãe em um sítio em Nova Venécia-ES. Mas, um fazendeiro tomou-lhes a terra e plantou eucalipto em tudo. O pai falecera dias depois. A mãe fora para um asilo. A ele, restou "sair de mund’afora”. Perguntei-lhe sobre o fato do prefeito Gilberto Kassab colocar a guarda civil metropolitana no encalço dos moradores de rua e proíbir a distribuição da sopa a eles pelas organizações de solidariedade. Marcelo tomou uma cachaça e disse-me: "já fui escorraçado e apanhei várias vezes desses guardas.” quantos milhares de camponeses são expulsos do campo o eito dos canaviais, nos canteiros das grandes obras, ou, para morar nas ruas da 5ª maior economia do mundo?
Outro dia, encontrei Dona Eva pelas estradas empoeiradas do Vale do Jequitinhonha-MG. Ela mora em uma comunidade quilombola sem acesso a água potável. Tem três filhos, um deles trabalhador migrante cortador de cana. Todos os dias, de manhã e à tarde, dona Eva precisa caminhar seis quilômetros caatinga adentro para ir buscar água em uma represa que a Ruralminas fez para irrigar monocultivos de banana. Quantos milhares de famílias não tem acesso à água potável na 5ª maior enconomia do mundo?
Semana passada, encontrei-me com Dona Francisca e o Mestre Magrão. Ela falou-me sobre um grupo de mulheres que luta bravamente para sobreviver no Jardir Rincão, periferia de São Paulo. Ali, além das tarefas domésticas, elas elaboram costuras e artesanatos para tentar complementar a parca renda familiar. Como diria Sidnei Silva, "costuram sonhos” de viver com dignidade humana em suas famílias, em suas comunidades. Já o Mestre Magrão falou-me do trabalho de capoeira e de formação que ele faz com crianças, adolescentes e jovens na mesma periferia do Jardim Rincão. Com sua arte, procura colaborar para que meninos e meninas não encontrem na violência, nas drogas e prostituição, sua única alternativa de vida. Contudo, quantas Donas Franciscas e Mestres Magrões lutam sem o reconhecimento e apoio do poder público na 5ª maior economia do mundo?
Na 5ª maior enconomia do mundo, o Estado e os governos locais ignoram, de propósito, Sérgios, Eloisas, Josés, Marcelos, Evas, Franciscas, Magrões. Não ouve seus gritos por direitos básicos de cidadania. Ao contrário, os reprime com a violência organizada, institucionalizada. A quem e como serve o Estado na 5ª maior economia do mundo?
O 18º Grito dos Excluídos questiona esse sistema, por um lado, e, por outro, busca potencializar os Gritos da gente que a gente não vê, não ouve, não reconhece. Procura, através das lutas, sonhos, esperanças mostrar que há possibilidades e alternativas populares de se construir um país melhor, no qual o Estado garanta direitos a toda população, onde o ‘luxo’ não seja exceção ilusionista de tv, e, nem favor de empresas e governos.
Assim, o 7 de Setembro é mais que um dia da Pátria. Mais que um momento, que um evento. Faz parte de um processo de lutas por dignidade, cidadania e soberania popular. Se os direitos de cidadania e os valores democráticos forem garantidos aos trabalhadores, esta já é a essência do gozo – e não luxo – da nossa condição humana e do convívio em uma sociedade, onde o Estado esteja a serviço da nação e garanta direitos à toda população!
Por José Carlos Alves Pereira | Grito dos/as Excluídos/as

TRT-SP: “20 anos de absoluta impunidade”


Janice Ascari: acordo com AGU é reconhecimento público de crimes sempre negados



No comentário a seguir, a Procuradora Regional da República Janice Ascari avalia o acordo firmado pela Advocacia-Geral da União com o ex-senador Luiz Estevão para a devolução ao erário de R$ 468 milhões pelo Grupo OK. Junto com as Procuradoras Regionais da República Maria Luísa de Lima Carvalho e Isabel Cristina Groba Vieira, Janice participou das investigações do MPF sobre os desvios de recursos da construção do Fórum Trabalhista de São Paulo, em 1992.

Pelo que foi noticiado, a AGU (Advocacia Geral da União) celebrou acordo com Luiz Estevão em duas ações que executavam as decisões do TCU (Tribunal de Contas da União) sobre os desvios de verba federal na construção do Forum Trabalhista de São Paulo.
O Ministério Público Federal não foi comunicado nem chamado a participar, até onde sei. As ações civis públicas do MPF só foram julgadas em primeira instância em 2011, 13 anos após o ajuizamento. Estão, agora, iniciando a infindável fase recursal.
Mais de vinte anos se passaram desde o cometimento dos crimes (início de 1992). Mais de doze anos desde o oferecimento da denúncia criminal contra Luiz Estevão, Juiz Nicolau e os empresários construtores (abril e julho de 2000).
Absolvidos em primeira instância porque o juiz disse não haver prova alguma do desvio nem dos fatos criminosos, foram eles condenados a penas que variam de 26 a 31 anos de prisão, quando o TRF da 3ª Região deu provimento ao recurso do MPF, em 2005.
Obedecendo ao elástico comando do Supremo Tribunal Federal no sentido de que um condenado só começa a cumprir pena depois do trânsito em julgado do último recurso possível e imaginável, os recursos criminais ainda estão em andamento e os réus, em liberdade.
Vinte anos depois, qual o sentimento da sociedade em relação ao caso, senão o de absoluta impunidade?
A aceitação do acordo e o desembolso de tão elevada quantia levam-nos a algumas reflexões.
A primeira é o reconhecimento público e inarredável, por Luiz Estevão, de sua efetiva participação nos fatos criminosos, que sempre foi negada.
A segunda é a certeza e a confirmação de seu protagonismo e liderança na senda criminosa, pois o acordo, aparentemente, ‘quita’ também o que seria devido pelos outros parceiros de crime.
A terceira é de ordem prática: se todos os bens pessoais de Luiz Estevão, os do Grupo OK e das demais empresas do grupo encontram-se bloqueados há mais de uma década, a acumulação de riquezas necessária para a aceitação do acordo demonstra que o país comprovadamente propicia aos empresários plenas condições de sair do fundo do poço e se reerguer, qual Fênix.
Por fim, a assinatura do significativo acordo, de altos valores pecuniários, traz uma leve sensação de que, ao menos, alguma punição pode, afinal, se concretizar. Resta torcer para que o acordo seja cumprido.

Privatização e concessão: sutilezas de uma falsa polêmica


Agora, a bola da vez são as rodovias e as ferrovias. Em seguida virão portos, hidrovias e os aeroportos. Parece evidente que conceder a exploração de um aeroporto ao capital privado por 25 anos é uma forma de privatização

Por Paulo Kliass, da Agência Carta Maior

Parece que tudo começou com a postura defensiva adotada pela Presidenta Dilma, quando da apresentação de seu novo pacote de benesses ao capital privado – o Plano Nacional de Logística (PNL). No dia 15 de agosto, durante a cerimônia no Palácio do Planalto, o discurso já iniciava com o rebatimento antecipado das críticas que eram esperadas. De acordo com seu entendimento, não se tratava ali de privatização alguma, mas tão somente de concessão. Mas, afinal, qual a diferença entre esses dois processos? Tentemos, pois, entender um pouco melhor esse “imbroglio”.

domingo, 26 de agosto de 2012

Por uma sinalização que não enxergue apenas carros


Em diversas partes do mundo, comunicação visual urbana já oferece informações e apoio para pedestres e ciclistas

Por Natália Garcia

Imagine que você está em São Paulo, na avenida Paulista (veja no mapa abaixo) sentido Consolação, e quer ir para a avenida Brasil. Uma placa te diria para virar à direita, mesmo que a avenida Brasil fique na direção da esquerda. É que se você estiver de carro, precisa virar à direita para, então, fazer o retorno.
Agora repare como nas cidades brasileiras a sinalização serve priotitariamente (e, muitas vezes, exclusivamente) os carros. Isso significa que as placas estão a serviço da minoria das pessoas. Em São Paulo, apenas 28% da população se locomove de carro. Temos a impressão de que a maioria das pessoas está nos automóveis porque ele ocupa mais espaço: 78% das vias. São 3,8 milhões de carros circulando todos os dias.
É claro que foi o modelo de urbanização de São Paulo (e de outras cidades brasileiras) que priorizou o carro. Mas uma sinalização que contemplasse outros modais (quem está à pé, de bicicleta e de transporte público) poderia ensinar mais gente a percorrer a cidade de outras formas. Pela Europa, conheci uma porção de exemplos interessantes.
Em Londres, a cada esquina há um mapa como esse, que mostra tudo o que pode ser percorrido à pé em um raio de 5 quilômetros, indica para onde está o norte e a direção dos principais bairros da cidade.
Nos pontos de ônibus de Copenhague há um mapa da cidade que indica o itinerário dos ônibus de cada uma das linhas que passam por lá. Aliás, os pontos também são equipados com cabines para que os usuários de transporte públicos fiquem confortáveis e protegidos do frio e da chuva.
Em Copenhague há semáforos exclusivos para as bicicletas. O sistema de semáforos da cidade prioriza, em primeiro lugar, a fluidez dos pedestres, depois dos ciclistas e, por último, dos carros. Se um ciclista pedalar a 20 km/h vai pegar todos abertos: é a chamada “onda verde”, para garantir que esse seja o meio de transporte mais eficaz da capital dinamarquesa.
Essa placa faz parte de uma campanha da prefeitura de Londres que diz “mate a sua velocidade, não uma criança”. O objetivo é conscientizar os motoristas sobre a necessidade de manter uma velocidade compatível com a vida humana.
Na França, é muito comum as bicicletas poderem circular na contramão dos carros, como mostra essa placa no centro de Paris, que indica “sentido proibido, exceto para bicicletas”.
Essa placa mostra as prioridades de uma rua no centro de Paris. Primeiro vem o pedestre, depois o ciclista e, por último, o carro. A velocidade máxima permitida é de 20 km/h.
A sinalização também pode ser artística. Nesse banco à beira do rio Tâmisa, em Londres, a placa diz “todo mundo precisa de um espaço público para pensar”.
(Post publicado originalmente em Cidades Para Pessoas)

“Repensar” a educação ou transformá-la?



Como são aborrecidos os estudos que falam eternamente em “reformas” e “desempenho” — mas não se dão conta de que o modelo iluminista está superado, e já há formas reais de ultrapassá-lo...


Por Alexandre Sayad


“Ser” é melhor que “pensar”
Assim como “fazer” vale mais que “pensar”.  Sinto um misto de preguiça e frustração quando leio artigos sobre educação clamando para que a velha escola seja repensada – excitados pelas avaliações frustrantes do Ideb . Um exercício meramente ególatra.
A escola é repensada continuamente desde que o modelo iluminista, e posteriormente fordista e politécnico, de ensino e currículo se fizeram presente.  São toneladas de pesquisas e teorias forjadas na solidão das salas de universidades. O universo da educação formal, e das faculdades de pedagogia, é majoritariamente composto por pensadores e pesquisadores. Pensar e repensar são suas especialidades.  Transformar, não. Eis a questão.
Por exemplo, o MEC propôs semana passada para o Ensino Médio algo prosaico em termos de pensamento, mas inovador na prática: um modelo matricial, e não curricular de ensino. Isso significa que as disciplinas se mesclariam estimulando a elaboração de projetos interdisciplinares pelos alunos. Ora, a chamada “pedagogia de projetos” é algo criado por John Dewey no começo do século passado!  Colocá-la em prática é a grande novidade – pensá-la, não.
Schumacher College, em Londres, e a Oregon Episcopal School, nos arredores de Portland (EUA) não têm currículo há muito tempo. Trabalham por projetos e estão entre as instituições mais renomadas e respeitadas do mundo. No Brasil, ignorado pela grande mídia, o tal Ensino Médio Inovador já está presente desde 2009 em mil escolas com Ideb abaixo da média.
Fico menos animado ainda quando percebo que o PNE (Plano Nacional De Educação), algo elementar para a melhora do ensino, está com votação truncada na Câmara e que os sindicatos já chiaram quando souberam da proposta do MEC. Começa a ir por água abaixo uma implementação que poderia, juntamente com outros ajustes, dar uma guinada no Ensino Médio a favor dos que têm mais interesse nele: o estudantes.
Por trilhas alternativas, projetos bem implementados de produção de comunicação por alunos em escolas têm o poder de transformá-las. Esses são realidade em mais de três mil escolas públicas do Brasil – não vi até agora um aferimento de qualidade por parte do MEC ou institutos ou uma reportagem na grande mídia sobre eles.
A última pesquisa que tive notícia, o Aprova Brasil, do Unicef, mostrou que escolas que se aproveitavam do fazer comunicativo obtinham Ideb acima da média porque estimulavam a participação da comunidade nas decisões escolares.
Nesses casos, não se trata de fórmula mágica ou grandes exercícios mentais.  Trata-se de aproveitar o que de melhor o estudante faz fora da sala de aula, vídeos e textos com celulares e redes sociais, e colocá-los a favor da aprendizagem.  Nesse sentido, uma recente pesquisa nos Estados Unidos surpreendeu: segundo a Child’s Mercy, 83% dos pais entrevistados, apesar dos receios recorrentes das redes sociais, aprovavam seu uso como importante na educação dos filhos.
Repensar a escola não causa impacto algum à educação. 
Refazê-la, sim; e isso implica em experimentar. 
Para medir os resultados são necessários anos, talvez gerações, afinal impacto educacional não se mede da noite para o dia.  E uma escola experimental pode facilmente ser refutada pelo seu público, em geral conservador e avesso a experimentalismos –  mas que adora “repensar”  a educação de seus filhos.
A pergunta que fica é: estamos realmente prontos para uma nova escola, na prática?
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