Janice Ascari: acordo com AGU é reconhecimento público de crimes sempre negados
No comentário a seguir, a Procuradora Regional da República Janice
Ascari avalia o acordo firmado pela Advocacia-Geral da União com o
ex-senador Luiz Estevão para a devolução ao erário de R$ 468 milhões
pelo Grupo OK. Junto com as Procuradoras Regionais da República Maria
Luísa de Lima Carvalho e Isabel Cristina Groba Vieira, Janice participou
das investigações do MPF sobre os desvios de recursos da construção do
Fórum Trabalhista de São Paulo, em 1992.
Pelo que foi noticiado, a AGU (Advocacia Geral da União) celebrou
acordo com Luiz Estevão em duas ações que executavam as decisões do TCU
(Tribunal de Contas da União) sobre os desvios de verba federal na
construção do Forum Trabalhista de São Paulo.
O Ministério Público Federal não foi comunicado nem chamado a
participar, até onde sei. As ações civis públicas do MPF só foram
julgadas em primeira instância em 2011, 13 anos após o ajuizamento.
Estão, agora, iniciando a infindável fase recursal.
Mais de vinte anos se passaram desde o cometimento dos crimes
(início de 1992). Mais de doze anos desde o oferecimento da denúncia
criminal contra Luiz Estevão, Juiz Nicolau e os empresários construtores
(abril e julho de 2000).
Absolvidos em primeira instância porque o juiz disse não haver
prova alguma do desvio nem dos fatos criminosos, foram eles condenados a
penas que variam de 26 a 31 anos de prisão, quando o TRF da 3ª Região
deu provimento ao recurso do MPF, em 2005.
Obedecendo ao elástico comando do Supremo Tribunal Federal no
sentido de que um condenado só começa a cumprir pena depois do trânsito
em julgado do último recurso possível e imaginável, os recursos
criminais ainda estão em andamento e os réus, em liberdade.
Vinte anos depois, qual o sentimento da sociedade em relação ao caso, senão o de absoluta impunidade?
A aceitação do acordo e o desembolso de tão elevada quantia levam-nos a algumas reflexões.
A primeira é o reconhecimento público e inarredável, por Luiz
Estevão, de sua efetiva participação nos fatos criminosos, que sempre
foi negada.
A segunda é a certeza e a confirmação de seu protagonismo e
liderança na senda criminosa, pois o acordo, aparentemente, ‘quita’
também o que seria devido pelos outros parceiros de crime.
A terceira é de ordem prática: se todos os bens pessoais de Luiz
Estevão, os do Grupo OK e das demais empresas do grupo encontram-se
bloqueados há mais de uma década, a acumulação de riquezas necessária
para a aceitação do acordo demonstra que o país comprovadamente propicia
aos empresários plenas condições de sair do fundo do poço e se
reerguer, qual Fênix.
Por fim, a assinatura do significativo acordo, de altos valores
pecuniários, traz uma leve sensação de que, ao menos, alguma punição
pode, afinal, se concretizar. Resta torcer para que o acordo seja
cumprido.
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