A pluralidade informativa de um lugar está diretamente conectada à sua qualidade democrática. E hoje o Brasil tem aberto mão de melhorar sua democracia em nome de um mercadismo pouco eficaz e , além de tudo , injusto.
Há um debate em curso acerca dos critérios adotados pela
Secom da presidência da República em relação à compra de publicidade que
parecem ser técnicos, mas que na realidade têm alto conteúdo político.
Sem ser exatamente político.
No final de 2009, mais precisamente no dia 16 de dezembro, a Secom-
PR publicou uma instrução normativa de nº 2 e a partir daquele momento o
governo federal e seus órgãos passaram a ser regidos por essa norma em
conjunto com o que prevê o decreto 6555/2008.
Essa legislação é baseada num conjunto de critérios que, na opinião
da diretoria da Altercom, estão sendo interpretados a partir de uma
lógica mercadista que não atende ao espírito público no que diz respeito
ao comprometimento com a multiplicidade informativa necessária para o
fortalecimento da democracia.
Um dos pontos que tem prejudicado sobremaneira as pequenas empresas
de comunicação é a redação e a interpretação do artigo 6o, inciso III,
alinea c, da norma que dispõe sobre a “tática de mídia”. Ele diz que:“a
apresentação de critérios de distribuição dos investimentos por meio,
considerados os objetivos da ação; indicação dos períodos de veiculação;
defesa da programação de veículos e respectiva distribuição de peças,
de acordo com os objetivos de alcance e audiência”.
Atualmente a Secom-PR tem se pautado demasiadamente sua ação pelos
“objetivos de alcance e audiência”, o que favorece os grandes veículos
em todos os segmentos, incluindo aí a internet, onde se poderia fazer
uma ação muito mais forte de valorização dos pequenos empreendimentos de
comunicação.
Mas não é só isso. A Secom também passou a interpretar a partir desse
artigo que a compra de espaço publicitários deve comparar como iguais
os desiguais. Ou seja, que o valor relativo da publicidade nos pequenos
veículos tem que ser semelhante ao dos grandes. Trocado em miúdos, que
mil page views num grande portal tem de ter o mesmo valor ou preço semelhante a mil page views num blogue. Ou que o custo relativo da página de uma revista segmentada deve ser semelhante para 1 mil exemplares ao que Veja oferece ao governo.
Nem tecnicamente isso se justifica, porque sabemos que na grande
audiência a dispersão é muito maior. Além do que, se esse critério vier a
ser o principal, sempre os grandes serão favorecidos porque terão mais
condições de barganha.
É a mesma lógica da concorrência entre o grande hipermercado e a pequena quitanda. Quem tem escala sempre tem vantagem.
Para que isso não amplie ainda mais a concentração no setor, a
Altercom defende que se estabeleça uma nova regra para compra de
publicidade governamental. A de que 30% de todos os recursos
publicitários governamentais sejam destinados às pequenas empresas de
comunicação. E que esse novo regramento conviva com a norma de 2009 com
algumas adequações.
Isso precisa ser considerado até porque os grandes grupos recebem
muito mais recursos do que sua força ponderada nos hábitos de
comunicação do brasileiro. Há muita gente se informando pela longa cauda
do processo informativo. E isso tem sido desprezado em nome das
facilidades de operação com os chamados players do mercado.
Hoje, aliás, são as pequenas empresas que asseguram boa parte do
contraponto informativo no país. Sem elas, teríamos um processo de uma
só voz em favor de interesses muito mais privados do que públicos. Não é
novidade dizer que os grandes grupos informativos brasileiros
representam os grandes grupos econômicos.
No Brasil, já há legislações em alguns setores que utilizam critérios
próximos aos que a Altercom defende. Como na compra de alimentos para a
merenda escolar, onde se estabeleceu um percentual para a agricultura
familiar. Ou como na lei do audiovisual, onde há também critérios
regionais para distribuição dos recursos.
Mas não fosse só essa distorção que vem prevalecendo a partir da
interpretação da norma publicada no final de 2009, nos últimos tempos um
outro componente passou a fazer parte do rol de critérios para o que se
convencionou chamar de mídia técnica.
A nova gestão da Secom estabeleceu uma regra de categorização dos
veículos. Regra que não é clara e que nem foi publicizada, mas que,
segundo alguns agentes da publicidade nos ministérios e empresas
públicas, tem levado a Secom-PR a rejeitar várias sugestões de
programação em veículos. O argumento seria o de que se o órgão vier a
fazer publicidade num veículo teria de fazer nos outros da categoria a
que ele pertence. Quem está pagando o preço dessa categorização
novamente têm sido as pequenas empresas.
Do ponto de vista prático, a partir do momento em que esse critério
de categorização passou a ser usado, quase todas as pequenas empresas
representadas pela Altercom tiveram sua receita de publicidade via Secom
reduzida. Em alguns casos, houve uma diminuição de quase 50% de 2011
para 2012 e sem que o veículo tivesse diminuído seu alcance.
É disso que se trata quando se fala que houve mudança de rota nos
investimentos de publicidade governamental. É disso que reclamam
diretores de muitos produtos de comunicação.
Enfim, parece um debate técnico. Mas não é somente técnico. Parece um
debate político. Mas também não é somente político. É também um debate
sobre o país que desejamos construir. A pluralidade informativa de um
lugar está diretamente conectada à sua qualidade democrática. E hoje o
Brasil tem aberto mão de melhorar sua democracia em nome de um
mercadismo pouco eficaz e, além de tudo, injusto.
A Folha de S. Paulo (vejam bem, a Folha) registrou em
recente matéria que 70% das verbas da Secom no período do governo Dilma
foram destinadas a apenas 10 veículos. Os outros milhares de veículos
ficaram com apenas 30%. Certamente desses, muitos ainda eram grandes
empresas. Se a concentração em outros setores no Brasil é absurda, na
comunicação ela é indecente. E isso também guarda relação com a
distribuição das verbas públicas de publicidade.
PS: Este texto segue assinado porque não representa só a opinião do blogueiro, mas do representante da entidade. E foi produzido a partir da demanda de alguns filiados na Altercom.
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