Palanque dado a Ustra na mídia reafirma comportamento da imprensa da época da ditadura – quando apoiou o regime militar; manchete do Estadão opta por destacar os ataques do torturador em detrimento da presidente Dilma; revista Veja adota retórica da Guerra Fria ao condenar a vinda de médicos cubanos ao País; jornalista Eduardo Guimarães, do Blog da Cidadania, relembra a declaração do ministro Marco Aurélio Mello, do STF, de que a ditadura foi um "mal necessário" e ressalta: "Os que apoiaram e apoiam o que se fez neste país naquele período, mesmo sem participar diretamente dos crimes, também são criminosos"
247 - O
depoimento do coronel reformado Carlos Alberto Brilhante Ustra à
Comissão Nacional da Verdade na sexta-feira 10 tirou a direita
radical brasileira do armário. Em post publicado neste domingo, o
jornalista Eduardo Guimarães, do Blog da Cidadania, relembrou a
opinião do ministro Marco Aurélio Mello, do Supremo Tribunal
Federal, de que a ditadura militar foi um "mal necessário"
e que seria melhor não esperar o risco de uma ditadura comunista no
País. "Teríamos que esperar para ver, e foi melhor não
esperar", disse Mello ao jornalista Kennedy Alencar (relembre
abaixo).
O
palanque dado a Ustra pela mídia reafirmou um comportamento da
imprensa já revelado no próprio período da ditadura – quando
apoiou o regime militar. Na manchete do Estadão deste sábado, por
exemplo, o jornal opta pela defesa de Ustra e sua acusação de que
Dilma Rousseff integrou "grupos terroristas" em detrimento
da presidente da República, perseguida e torturada neste período. A
revista Veja, ainda, adotou uma retórica Guerra Fria para condenar a
vinda de médicos cubanos ao Brasil, sob o argumento de que a
importação dos profissionais inundaria o Brasil "com espiões
comunistas" (leia
mais aqui).
Há
que envergonhar defensores e agentes da ditadura militar
Em mais dois anos,
completar-se-ão trinta anos desde o fim formal da ditadura militar
(1964-1985). Já são quase três décadas de impunidade e até de
deboche dessas pessoas que cometeram os mais hediondos crimes de
lesa-humanidade.
Todavia, os que praticaram
atos desumanos contra pessoas que apenas defendiam o país de um
golpe ilegal e imoral contra a democracia não são os únicos
responsáveis por aquele período trágico de nossa história.
Os que apoiaram e apoiam o
que se fez neste país naquele período, mesmo sem participar
diretamente dos crimes, também são criminosos.
Muitos se perguntam por que
fazer uma Comissão da Verdade sobre o que de fato se passou naquele
período se uma lei maldita, imoral e cínica como a Lei da Anistia
impede que os psicopatas que torturaram, estupraram e assassinaram
sejam presos.
A razão é muito simples: o
espírito que rege a Comissão da Verdade pretende educar a sociedade
para que não seja enganada sobre aquele momento vergonhoso da
história deste país.
Afinal, há uma horda de
degenerados – alguns travestidos de pessoas respeitáveis, pais de
família, avós etc. – que, sob um discurso nojento e mentiroso,
tenta vender às novas gerações que teria havido algum ideal nobre
na "revolução de 64".
A mentira sobre a ditadura é
tão descarada e tão aceita em certos meios sociais que até um
ministro do Supremo Tribunal Federal deu uma declaração
estarrecedora.
Segundo esse ministro, "Foi
melhor não esperar" que eclodisse um regime comunista no Brasil
e dar logo aquele golpe "preventivo". Assim, para esse
indivíduo a ditadura teria sido "Um mal necessário".
Veja, abaixo, a declaração
que o ministro do STF Marco Aurélio Mello deu ao jornalista Kennedy
Alencar.
Essa é a versão que
encanta alguns setores da sociedade e que pretende justificar que um
governo legitimamente eleito fosse deposto – jogando fora, assim, a
vontade da maioria dos brasileiros – e que fossem praticados os
horrores que logo virão à tona através da Comissão da Verdade.
É muito grave que um membro
da cúpula do Poder Judiciário dê uma declaração a favor da
ruptura da lei como foi o golpe de 1964, que, como todo golpe, foi
dado por quem não tinha voto para vencer a eleição seguinte e,
assim, optou por tomar o poder à força.
Mello entoa o mesmíssimo
discurso do coronel reformado Carlos Alberto Brilhante Ustra, quem,
na última sexta-feira (10 de abril de 2013), esbofeteou a Comissão
Nacional da Verdade com seu cinismo, com suas mentiras e com sua
arrogância.
Todos conhecemos alguém que
diz as mesmas coisas. Aqui mesmo, neste blog, nos comentários de
leitores colocados em posts que tratam da ditadura, vemos essa farsa
sendo repetida.
Além da farsa sobre as
"razões" dos golpistas de 1964, há outra imensa farsa que
precisa ser desmascarada, a de que haveria um número equivalente ao
de vítimas do regime militar, as supostas vítimas de "terroristas".
Os que apoiaram e apoiam o
estupro da democracia naqueles ditos "anos de chumbo"
referem-se a pessoas que teriam sofrido nas mãos da resistência à
ditadura o mesmo que ela praticou contra presos políticos que
queriam libertar o país.
Essa mentira pode ser
facilmente desmascarada.
Há centenas de pessoas que
denunciam os crimes praticados pela ditadura. Há pouco, faleceu um
homem que foi torturado quando era um bebê de colo e que carregou as
sequelas daquilo até a morte. Mas onde estão as "vítimas"
dos "terroristas" de esquerda?
Não há. Ninguém nunca viu
uma manifestação dessas vítimas simplesmente porque quando a
resistência à ditadura matou alguém foi sempre em combate. Nunca
apareceu um agente da ditadura ou mesmo um civil que tivesse sido
torturado ou morto após ser dominado.
A grande mídia, cúmplice
da ditadura – o golpe de 1964 foi tramado na redação do jornal O
Estado de São Paulo –, tenta ajudar a desinformar a sociedade ao
dar o mesmo peso ao discurso das vítimas da ditadura e ao discurso
dos agentes dela.
Isso ocorre porque veículos
como O Globo, Folha de São Paulo e O Estado de São Paulo, entre
outros, poderão ser denunciados pelos crimes que cometeram entre
1964 e 1985 – a Folha chegou a emprestar veículos para o regime
transportar presos políticos.
Aí a razão para a grande
mídia tratar com equidistância "os dois lados", como se
tivesse ocorrido uma guerra civil no país quando o que de fato
ocorreu foi uma ditadura que esmagou não só quem resistiu à bala,
mas quem ousava pensar diferente.
Os que gostam de criticar o
governo hoje e não sabem o que ocorreu durante a ditadura precisam
saber que se criticassem publicamente o então presidente Emílio
Garrastazu Médici (que governou entre 1969 e 1974), por exemplo, no
dia seguinte teriam a polícia política do regime batendo-lhes à
porta.
Essas pessoas não entendem
que entre 1964 e 1985 não se podia criticar o governo ou ter uma
opinião diferente da do governo, pois quem divergisse publicamente
era preso, torturado e até assassinado.
Isso aconteceu com Vladimir
Herzog em 1975, quando era diretor do departamento de telejornalismo
da TV Cultura.
O jornalismo da emissora
fazia críticas ao governo e, assim, Herzog foi preso, torturado e
assassinado no mesmo lugar em que Brilhante Ustra comandou tantas
sevícias, estupros e assassinatos contra quem cometera o crime de
pensar diferente.
Detalhe: Herzog jamais pegou
em armas. Seu "crime" foi dizer coisas que a ditadura não
gostou.
Assim, grande parte dos que,
apesar de não terem cometido crimes durante a ditadura, atuam a
serviço dela até hoje desinformando as pessoas, sabem que estão
mentindo. Outros (poucos), fazem isso por desinformação.
A Comissão da Verdade,
portanto, tem como objetivo principal barrar o discurso dos
defensores da ditadura – tanto dos mal-intencionados como dos
desinformados.
Aliás, há um critério
para diferenciar os defensores da ditadura que mentem daqueles que
apenas não sabem o que dizem: a idade – qualquer um que tenha mais
de cinquenta anos e que desminta os crimes da ditadura, é um
mentiroso.
O que se espera da Comissão
da Verdade e do governo Dilma Rousseff, portanto, é que no ano que
vem provem ao país, usando grandes meios de comunicação, que o
regime militar foi implantado e sustentado por criminosos.
Se tudo o que está sendo
apurado for devidamente difundido, o efeito benfazejo será o de
calar gente como o ministro do STF supracitado ou pessoas que põem
comentários mentirosos na internet ou os fazem em seus meios
sociais.
Envergonhar os defensores da
ditadura perante suas famílias, filhos, netos, amigos, colegas de
trabalho etc. será imprescindível para que este país nunca mais
sofra um golpe igual.
Além disso, a exposição
adequada da desumanidade dos crimes da ditadura deixará qualquer
pessoa decente literalmente perplexa e, assim, poderá permitir que a
Lei da Anistia seja revista e os criminosos sobreviventes paguem por
seus crimes.
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