Exame dos mapas eleitorais revela: áreas da cidade que eram
redutos anti-mudanças podem estar se arejando, graças a novos
movimentos, como cicloativismo, e crítica à especulação imobiliária.
O voto paulistano tem uma geografia que parece se repetir eleição
após eleição. Os mapas da geografia do voto mostram um desenho que se
repete há décadas: direita e centro (azul) no miolo mais rico da cidade,
e a esquerda (vermelho) nas periferias, como vemos no mapa abaixo do 1o
turno das eleições municipais deste ano.
O azul mais intenso corresponde ao lugar que historicamente concentra
renda, poder e qualidades urbanísticas em São Paulo, como já demonstrou
o prof. Flavio Villaça, da FAU USP, em inúmeros artigos e livros. Mais
de 40% dos habitantes desta região pertencem ao grupo que possui renda
familiar de mais de 20 salários mínimos (veja mapa abaixo).
O vetor sudoeste é, historicamente, hegemonizado pelo PSDB, marcado
por um profundo sentimento anti-PT e por uma atitude conservadora em
relação à cidade. Para os moradores desta região, a ideia de
redistribuição de oportunidades ou de inversão de prioridades que marcou
o discurso do PT em seus primórdios não tem nenhum apelo.
A leitura do mapa do 1º turno destas eleições, em tese, diria que nos
bairros mais ricos predominou o voto no Serra e, nos mais pobres, no
Haddad. Não haveria, portanto, nenhuma novidade no cenário. Será? Uma
observação mais atenta aponta sutilezas que matizam esta leitura
binária. Em primeiro lugar, no chamado centro expandido, embora
predomine o voto no PSDB, Haddad foi o 2º colocado, com votação mais
expressiva, em alguns distritos, do que Marta Suplicy alcançou no pleito
de 2008, quando o PT perdeu para a coligação DEM/PSDB (veja mapa
abaixo).
Em segundo lugar, historicamente, na cidade de São Paulo, três — e
não duas — forças político-partidárias marcam a geografia eleitoral: o
PT, o PSDB e o malufismo, herdeiro do janismo. O voto no Russomano,
entretanto, não é herdeiro do malufismo como afirmam alguns. Além disso,
redutos históricos do malufismo como o Tatuapé ou a Vila Maria se
dividiram quase igualmente entre os três primeiros candidatos (clique aqui para
ver o mapa detalhado) e Russomano não ganhou em nenhum distrito da
capital. Na chamada extrema periferia, Haddad dividiu a hegemonia dos
votos com Russomano, e não com Serra. E, obviamente, não podemos
configurar o candidato do PRB como “de esquerda”… Então como podemos
interpretar este cenário?
Se permanece verdadeira a polarização azul x vermelho, o sutil
crescimento de Haddad no centro expandido poderia apontar para uma
espécie de descontentamento com o modelo de cidade, inclusive na área
historicamente mais privilegiada por este modelo? Não seriam os inúmeros
movimentos — de cicloativistas, de preservação de bairros, de ocupação
de espaços públicos, além de outros tantos que surgem no interior desta
região, sinais deste desejo de mudança? Por outro lado, no que já foi
uma “periferia consolidada” de outros tempos, onde a renda cresceu e as
demandas de urbanidade se sofisticaram, os apelos do malufismo parecem
perder eco. Finalmente, se realmente existem mudanças no cenário, estas
estariam ocorrendo no campo da política ou indicariam possíveis
reconfigurações da cidade?
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