Dotado de enorme orçamento, banco resiste a financiar projetos
estratégicos para avanço do país. Prefere emprestar a mega-empresas,
inclusive estrangeiras…
Por Mauro Santayana, em seu blog
Como vimos no ano passado, o maior desafio que o Brasil irá enfrentar
nos próximos anos será o de elevar o crescimento médio do PIB ao menos
para nível comparável aos outros países da América Latina. Embora o
câmbio seja frequentemente citado como um problema — multiplicamos o
crédito para o mercado interno, mas as importações já representam 20%
dos bens de consumo brasileiros — não é só a valorização do real que
está afetando o nosso crescimento. O problema mais grave é o da taxa de
investimentos com relação ao PIB, extremamente baixa comparada aos outros países do BRICS, e uma das menores do mundo.
No grupo de 20 países “emergentes”, classificados pela Standard &
Poors, o Brasil só investe mais que o Egito e as Filipinas. Na América
do Sul, países como o Chile, o Peru e a Colômbia alcançam taxas de
investimento próximas de 25%, e, nos BRICS, China e Índia investiram
aproximadamente 47% e 32% de seus respectivos PIBs em 2010, enquanto nós
só investimos 19,5% naquele ano, número que caiu para 18,4% em 2012.
A China e a Índia, além da iniciativa privada, contam com o Estado
como investidor direto na economia, enquanto o Brasil entregou à
iniciativa privada a responsabilidade pela expansão da atividade
produtiva.
Aqui, o Estado não pode, como se faz na China e na Índia, investir
diretamente em meios de produção. A presença do Estado na produção, em
nosso país, é assunto tabu. E boa parte da mídia propaga e defende o
dogma de que o Estado é, naturalmente, perdulário e ineficiente, que ele
já é em nosso país intervencionista em excesso, e que a “mão invisível”
do mercado é que cria a riqueza e possibilita o desenvolvimento.
Ao contrário do bordão, a China e a Índia crescem, todos os anos, com
os índices mais altos do mundo, porque ali o Estado está presente em
todas as áreas da economia e reinveste diretamente parte de seus
recursos em atividades produtivas, distribuidoras e multiplicadoras. É
assim que a China se prepara para ser o país mais desenvolvido do
planeta.
Essa estratégia não é exclusiva de países como a Índia e a China —
que já compraram grandes indústrias estrangeiras, como a Volvo e a Land
Rover. Na Europa, grandes conglomerados estatais dominam a economia, com
participação acionária direta em áreas que incluem a indústria
aeroespacial, naval, de administração de aeroportos e ferrovias.
Nos Estados Unidos, onde o Exército controla a geração hidrelétrica,
também ocorre o mesmo, como é o caso do transporte ferroviário de
passageiros, a cargo da estatal federal Amtrak,
que administra mais de 220 mil quilômetros de linhas. Podem
contra-argumentar que a empresa, criada pelo republicano Nixon, é
deficitária, e seu prejuízo é coberto pela União. Mas a sua importância
para a economia norte-americana como um todo compensa, com vantagens, o
subsídio do Tesouro.
Enquanto isso ocorre nesses grandes países, no Brasil, o dinheiro
público é usado para financiar empresas teoricamente “privadas” — muitas
delas multinacionais estatais controladas por governos estrangeiros —
em vez de obrigá-las a buscar dinheiro fora para investir efetivamente
aqui dentro.
O BNDES vem aplicando bilhões de reais na “expansão” de empresas como
a Vivo, que, além de não trazer dinheiro, remete seus lucros para o
exterior, drenando da economia nacional recursos que poderiam ser
empregados na expansão do nível de investimento. Melhor seria que o
BNDES entrasse diretamente no mercado, em associação com empresas
privadas nacionais, obrigando as empresas de fora a trazer recursos
efetivos de suas respectivas matrizes do que agir como mero agente
financiador de “investimentos” alheios. Se todo mundo — inclusive os
estrangeiros — montar prioritariamente com os recursos do tesouro, via
BNDES, recursos que não são elásticos, na hora de montar um negócio no
Brasil, nunca sairemos do nível medíocre de investimento em que estamos
patinando agora.
O Brasil, com o seu imenso mercado interno, não pode continuar se
submetendo à chantagem de certos setores da “iniciativa privada”,
exercida mediante grandes meios de comunicação nacionais e
internacionais, como The Economist, e dos “analistas” e “colunistas” do “mercado”.
Enquanto China e Índia cobram caro a entrada de capital estrangeiro
em seus mercados (a Argélia, por exemplo, acaba de exigir participação
de 51% na nova fábrica da Renault que está se instalando em seu
território), o governo brasileiro cede a pressões imperativas de
estatais estrangeiras na concessão de aeroportos e ainda financia sua
entrada e expansão em nosso mercado interno a juros subsidiados.
O PIB aqui não cresce, porque o governo delegou apenas à iniciativa
“privada” a iniciativa de expandir o investimento. Esse investimento tem
sido praticamente nulo em muitos grandes negócios, nos quais não entra
dinheiro novo, já que os recursos para novas montadoras de automóveis,
rodovias, ferrovias, portos, estaleiros, indústria de defesa, acabam
saindo, majoritariamente, do de financiamento público nacional.
É fácil, aos estrangeiros, fazer cortesia com o chapéu alheio e posar
de grandes investidores, com a cumplicidade dos grandes meios de
comunicação, quando, em muitos casos, de cada dez reais, oito estão
saindo do bolso do contribuinte.
Dessa forma, dificilmente atingiremos a modesta meta de alcançar 25%
do PIB em investimentos em 2016. O governo precisa entrar diretamente no
jogo, transformando o BNDES em investidor direto na economia, — como
fazem a Alemanha, a Espanha e a França, com suas grandes holdings
estatais. Com os recursos das reservas internacionais, do Tesouro, e do
próprio BNDES, bem administrados, se poderia estabelecer a meta de
investir, apenas por parte do Estado, ao menos 15% do PIB, para daqui a
uma década, patamar que se poderia complementar, a partir desse nível,
pelas aplicações da iniciativa privada.
Quem não tiver competência — e recursos — que não se estabeleça no
mercado nacional. Dinheiro, lá fora, existe. Só a China conta com 4
trilhões de dólares em reservas internacionais e em seu fundo soberano. A
diferença entre investir 47% DO PIB ao ano OU 18%, é deixar que o
Estado trabalhe livre e planejadamente para cumprir, ao lado dos outros
agentes econômicos, o seu papel na expansão da atividade econômica. O
que ele não pode fazer, como está fazendo cada vez mais em nosso país, é
bancar, praticamente, todos os riscos sozinho.
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