Diretor-executivo do Fundo
Baobá para Equidade Racial analisa os 10 anos da Lei Federal
10.639/2003, que obriga o estudo da história e culturas
afro-brasileira, africana e indígena na educação básica
Por Felipe Rousselet
Neste mês de fevereiro, a Lei Federal
10.639/2003, de autoria da ex-deputada federal Esther Grossi (PT), que
determina a obrigatoriedade do estudo da história e culturas
afro-brasileira, africana e indígena na educação básica, completa dez
anos. Embora sua aplicação seja limitada, a lei já produziu bons
resultados, entre eles o Prêmio Educar Para a Igualdade Racial, uma iniciativa que premia professores que incentivam o estudo da cultura afro-brasileira e africana no Brasil.
A reportagem da Revista Fórum
entrevistou o professor Athayde Motta, diretor-executivo do Fundo Baobá
para Equidade Racial, entidade doadora cujas causas são o
fortalecimento das organizações civis afro-brasileiras e o avanço da
filantropia para a justiça social no Brasil, para saber sua opinião
sobre os dez anos da lei, sua aplicação e a situação do racismo hoje no
Brasil.
Fórum – Qual a importância da
Lei Federal 10.639/2003, que determina a obrigatoriedade do estudo da
história e culturas afro-brasileira, africana e indígena na educação
básica? Após dez anos de aprovação, ela já gerou resultados concretos na
formação dos jovens?
Athayde Motta - A aprovação desta lei
tem várias facetas importantes. Em primeiro lugar, ela não existiria sem
a atuação das organizações da sociedade civil afro-brasileiras, cuja
atuação é desconhecida e desvalorizada. Em segundo lugar, essas
organizações não trabalham por causas como essa por necessidade de
atenção simplesmente, mas porque as culturas afro-brasileira, africana e
indígena são uma grande parte de nossa História e não saber mais sobre
isso nos torna um país com conhecimentos limitados.
Finalmente, ela ajuda a transformar
mentes e corações quando se percebe que o sistema escolar brasileiro é
fundamental na reprodução do racismo.
Fórum – Como o senhor avalia a aplicação da lei? Ela está realmente sendo respeitada pelas redes de ensino?
Motta - O maior problema na implantação
da Lei é que todos achavam que sabiam tudo sobre este tema, e na verdade
não sabemos nada ou muito pouco. O nível de desinformação, pesquisa, e
produção científica é sofrível. O investimento que isto pede é algo que
as escolas não querem e muitas não podem bancar.
Fórum – Qual a importância desta
lei para aceitação pela sociedade de políticas afirmativas, como, por
exemplo, cotas em universidades?
Motta - Não há relação direta entre uma e
outra. Obviamente, em 20 ou 30 anos é possível que o meio acadêmico não
seja o setor mais resistente da sociedade às cotas. Em 30 anos, também
poderemos ter uma geração de estudiosos sobre as culturas africana,
afro-brasileira e indígena que utilizem conceitos e teorias
contemporâneas e não ideias impregnadas de uma patologia cultural que
sempre inferiorizam negros e indígenas.
Neste momento, a lei é fundamental para
que as escolas sejam espaços de aprendizagem livres e de formação de
cidadãos sem preconceitos. A lei também é fundamental para que as crianças negras não tenham suas oportunidades negadas desde o ensino fundamental.
Fórum – Para o senhor, qual a situação do racismo hoje no país? Na última década, ele aumentou ou regrediu?
Motta - Ele se tornou mais presente no
cotidiano da sociedade, pois as organizações afro-brasileiras
conseguiram transformá-la em um assunto relevante. Saber sobre ele não
significa que mudanças ocorrerão em seguida. Brasileiros sentem que
estão perdendo um patrimônio se deixarem de acreditar na democracia
racial para construir uma sociedade igualitária de fato.
Além disso, o equilíbrio da sociedade
estará em risco se houver uma mudança muito grande. Por exemplo, brancos
não serão mortos, ofendidos ou humilhados. Apenas não poderão permitir
que isto aconteça com os negros. A questão é de perda de poder, que é
algo sempre complexo.
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