Democracia novamente de luto ...
Publicado em 10/01/2012

São Paulo (SP) - 7 de setembro. O Embaixador do
Brasil, na Inglaterra, compareceu à solenidade na Câmara Alta
do Parlamento daquele país, que tinha por objetivo homenagear a maior
nação sul-americana, no dia de comemoração da sua independência.
Ocupando a tribuna, um Lorde, usando de criatividade, fez ver aos seus
pares que o Brasil é um país que possui uma das mais
democráticas constituições do mundo. Para ilustrar sua declaração, leu,
em inglês, o inciso LXXIII, do artigo 5º., da Carta Magna brasileira:
"Qualquer cidadão é parte legítima para propor ação popular que
vise a anular ato lesivo ao patrimônio público ou de entidade de que o
Estado participe, à moralidade administrativa, ao meio ambiente e ao
patrimônio histórico e cultural, ficando o autor, salvo comprovada
má-fé, isento de custas judiciais e do ônus da sucumbência".
Após a leitura, arrematou: "viram ? Lá no Brasil, um simples cidadão,
em nome do bem-estar social, pode propor a anulação judicial de um ato,
como aqueles que nós praticamos dentro deste nobre legislativo". Os
membros do parlamento entreolharam-se admirados e, de
imediato, levantaram-se, irrompendo em forte e prolongada salva de
palmas. Terminada a solenidade, o Embaixador brasileiro, orgulhoso,
participou de festivo coquetel.
Gostaram da historinha ? Pois se gostaram, não se iludam. Tudo não
passa, como diz a sabedoria popular, de "coisa pra inglês ver". Trata-se
de solene engodo. Nem pensem em ingressar em juízo, principalmente para
anular uma lei, de efeito concreto, por mais contundentes que sejam as
provas das irregularidades cometidas pelos parlamentares.
Sob o manto do corporativismo, o Poder Judiciário não vai interferir
na atividade dos Poderes Legislativo e Executivo e estes não vão
interferir na atividade do Poder Judiciário. Assim, eles continuarão
cada vez mais harmônicos e menos independentes entre si. Faço esta
afirmação de ciência própria, obtida na condução de caso legal como
advogado, de natureza pessoal, sem envolvimento de qualquer cliente e do
perigo de quebra de sigilo profissional.
Nunca divulguei pela imprensa detalhes relativos a causas pendentes,
sendo esta a primeira vez que o faço, em
caráter extraordinário. Resumindo, ingressei em Juízo, na Comarca de
Mairiporã, Estado de São Paulo, com ação popular, visando anulação de
ato administrativo municipal, que teve por objeto a alteração do nome de
uma rua. Antes da propositura da demanda, um amigo, advogado e
político experiente, alertou-me sobre os enormes riscos de a minha
iniciativa ser abortada liminarmente.
Confesso que duvidei, tão sólidos e irrefutáveis eram, como
ainda são, meus argumentos e provas. Não deu outra ! Com total descaso e
fazendo vistas grossas, em Primeira Instância, o Ministério Público
Estadual, contrariando sua obrigação legal, e a magistrada encarregada
do despacho inicial, dando de ombros às graves denuncias contidas e
provadas na minha petição vestibular, ignoraram-na da forma mais
chocante, só não a rasgando e jogando-a na cesta de lixo, por falta de
previsão no código processual.
Diferente não foi o tratamento na Instância Superior, em julgamento
de recurso de apelação, por uma Câmara de Direito Público do Tribunal de
Justiça do Estado de São Paulo. Fica a sensação de que, nas duas
Instâncias, ninguém se deu ao trabalho de ler as alegações da parte, em
face da flagrante dissonância dos fundamentos invocados nas decisões.
Porém, não é bem assim. Desembargadores, juizes e membros do Ministério
Público, diretamente, ou através das respectivas assessorias, lêem tudo
quanto se escreve nos processos, levando-o em conta apenas quando não
lhes causem desconforto recíproco, ou nas suas relações com outros
Poderes.
A Justiça também adora ser badalada nos meios de comunicação. Quando
se cuida de garantir a realização de "marchas da maconha", com a
presença de ruidosos adeptos da descriminalização da droga, o Poder
Judiciário não pensa duas vezes em paralisar a cidade de São Paulo.
Aqui prevalece a força do "bando", assim entendidos movimentos
organizados para defesa de supostos direitos. Uma só andorinha não faz
verão.
Chegou a hora de fundar uma associação para resgatar os direitos de
cidadania, imolados pelos nossos tribunais, compostos por magistrados
engajados em entidades politizadas, apenas para preservar
seus interesses pessoais. Prova está na recente crise provocada por
essas entidades, contra o corajoso trabalho da Corregedora do CNJ,
Ministra Eliana Calmon.
Este desabafo não constitui lamento de quem "injustamente" perdeu uma
ação qualquer para a parte contrária, mas de quem "ilegalmente" perdeu
uma ação de cidadania para o Poder Judiciário, com a colaboração do
Ministério Público Estadual.
Obs.: Na foto, esquife da ação popular sendo carregado por sugestivos cidadãos-eleitores, um deles o autor do texto.
Romeu Prisco - São Paulo Paulistano,
advogado e ator, dedica-se, atualmente, à arte de escrever artigos,
crônicas, contos e poemas, publicados em espaços literários e
jornalísticos, impressos e virtuais. Define-se como um sonhador, que
ainda acredita nos seus sonhos.
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