Sindicato dos Servidores Públicos do Judiciário Estadual na Baixada Santista, Litoral e Vale do Ribeira do Estado de São Paulo
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quarta-feira, 8 de novembro de 2017
quinta-feira, 5 de outubro de 2017
SINTRAJUS REIVINDICA AO GOVERNADOR A GARANTIA DO ORÇAMENTO DO TJSP.
Na tarde de hoje, 5 de outubro, aproveitando a ocasião da visita de Geraldo Alckmin (PSDB) para cumprimento de sua agenda na Baixada Santista, a Assojubs e o Sintrajus, visando defender os interesses da categoria, tiveram um breve encontro com o governador do Estado e entregaram um ofício solicitando que o Executivo não efetue o habitual corte de verbas na peça orçamentária para o exercício de 2018 encaminhada pelo Judiciário. O documento protocolado junto à assessoria do governador descreve que o corte feito pelo Executivo prejudica os pagamentos devidos pelo Judiciário aos servidores. Entre os pontos elencados que afetam os servidores estão a data-base, a Lei 1273/15, nível universitário aos oficiais de justiça, a ser implementada em 2018, e o Projeto de Lei Complementar (PLC) 30/2013, que representa o pagamento de 2% ao ano para a recomposição das perdas acumuladas dos servidores. A Assojubs foi representada por Michel Iorio Gonçalves, presidente da associação e coordenador geral do Sintrajus, e por Claudia Damião, 1ª secretária da associação e diretora do sindicato.
sexta-feira, 25 de agosto de 2017
Assine pelo Iamspe!!!

O abaixo-assinado pode ser entregue nas sedes da Assojubs ou para algum diretor da executiva ou regional da CCM Iamspe.http://www.assojubs.org.br/site/wp-content/uploads/2017/08/10.8.17_abaixo_assinado_ccm.pdf
terça-feira, 13 de junho de 2017
Visita á Comarca de Praia Grande

Presentes também ao ato Adelson Pereira Gaspar, tesoureiro da Assojubs e do Sintrajus, e Regina Helena Assis, secretária geral da associação e do sindicato. Ao final dos esclarecimentos foi feito o corte do bolo preparado para fazer alusão ao débito referente ao complemento de 3,5% da reposição salarial de 7,08%, a data-base de 2016, que a gestão de Paulo Dimas de Bellis Mascaretti, presidente do TJ-SP, tem com a categoria.
Visitas ás Comarcas Caraguatatuba, Ubatuba, São Sebastião e Ilha Bela

Nova greve geralJá há uma nova data para a realização de outra greve geral no país. A data definida é 30 de junho. Continuar e ampliar a mobilização contra a retirada de direitos!
Reunião das Entidades

Em agosto, há a data indicativa de uma nova Assembleia Geral para o dia 11, a partir das 13 horas, na Praça João Mendes, em São Paulo.
Em relação à luta dos trabalhadores, as deliberações foram:
- De 13 a 29/6 - Reuniões e atos nas comarcas e prédios pela Campanha Salarial 2017 e greve geral;
- Dia 20/06 - Ato pelo Iamspe (Instituto de Assistência Médica ao Servidor Público Estadual) na Capital, às 9 horas, em frente ao Hospital do Servidor Público Estadual (FSPE), e no Interior e Baixada Santista em frente aos Ceama (Centro de Assistência Médico-Ambulatorial);
- Dia 20/6 - Esquenta da greve geral com manifestação nas comarcas e panfletagens;
- Dia 30/6 – Greve geral contra as reformas da Previdência, trabalhista e a terceirização total e irrestrita.
Presentes
Além da Assojubs e Sintrajus, presentes à discussão a Assetj, Apatej, Assojuris, Aecoesp, Aojesp, Assejurd, Fespesp, AASPTJ-SP, Sindjesp, CGOJ e Exefe.
Além da Assojubs e Sintrajus, presentes à discussão a Assetj, Apatej, Assojuris, Aecoesp, Aojesp, Assejurd, Fespesp, AASPTJ-SP, Sindjesp, CGOJ e Exefe.
Texto: Camila Marques
quarta-feira, 7 de junho de 2017
Onde foi parar o nosso dinheiro

Não há nenhuma razão
técnica para esta catástrofe em câmara lenta. Produzimos o suficiente
para todos, cerca de R$ 11 mil de bens e serviços por mês por família de
quatro pessoas, número que vale tanto para o mundo como para o Brasil:
estamos exatamente na média mundial...
Por desgraça, em economia a gente tem de fazer as contas. E
no Brasil recente as contas não batem. As pessoas tendem a ter certa
alergia aos números. Mas não há como entender as pragas que nos assolam
sem se dar conta dos números. Francamente, eles não são complicados,
apenas a escala é maior. Temos de contar em bilhões quando em casa
contamos em milhares.
Para já, não estamos sozinhos na desgraça. É só olhar o
que acontece nos Estados Unidos. Michael Moore resume de maneira genial:
“É a equação norte-americana. Desinforme a população e torne-a
ignorante e estúpida. A ignorância leva ao medo, o medo leva ao ódio.
Trump conhecia muito bem essa parte da equação. E o ódio leva à
violência” (Guardian, 21 abr. 2017). Estamos falando da erosão geral da
governança. É só olhar o caos gerado no Brasil, na Argentina, na
Venezuela, na Turquia, na França, na África, no Oriente Médio, nas
Filipinas. Ressurgem atitudes que achávamos enterradas na Idade Média. O
mundo volta a se cobrir de muros e arames farpados.
No centro dos desafios estão duas macrotendências que
formatam a nossa sociedade. No plano do meio ambiente, estamos
destruindo literalmente a vida no planeta. O aquecimento global, a
contaminação das águas, a destruição da cobertura florestal, a
liquidação das espécies – perdemos 52% da fauna do planeta em apenas
quarenta anos, entre 1970 e 2010 (WWF, 2016). Estamos indo ladeira
abaixo em ritmo vertiginoso, com mais tecnologias descontroladas e 7,4
bilhões de habitantes tentando agarrar o que podem no quadro do caos que
temos chamado educadamente de “mercados”.
A segunda tendência estruturante é obviamente a
desigualdade. No planeta, oito famílias dispõem de mais riqueza do que a
metade mais pobre da população mundial, e o 1% mais rico tem mais do
que os 99% restantes. Não há economia que possa funcionar assim. Os 28
maiores grupos financeiros do mundo manejam em média US$ 1,8 trilhão. O
Brasil, sétima potência econômica mundial, tem um PIB de US$ 1,7
trilhão. O poder efetivo, que detém a autoridade sobre a alocação dos
nossos recursos, simplesmente se deslocou, e com isso se desloca a
capacidade de resgatar o controle e restaurar os equilíbrios. Não é
apenas uma questão de justiça social: a própria economia deixa de
funcionar. Desde a crise de 2008, o mundo vive no marasmo.
Não há nenhuma razão técnica para esta catástrofe em
câmara lenta. Produzimos o suficiente para todos, cerca de R$ 11 mil de
bens e serviços por mês por família de quatro pessoas, número que vale
tanto para o mundo como para o Brasil: estamos exatamente na média
mundial. Temos todos os estudos necessários e propostas sistematizadas
sobre o que fazer e como, desde a Agenda 2030 aprovada em Nova York até
as medidas ambientais aprovadas em Paris. Sabemos o que fazer e quanto
custa tanto para enfrentar a mudança climática como para assegurar o
acesso a um rendimento mínimo digno para todos e a inclusão produtiva. O
que se perdeu foi a capacidade de colocar em prática as políticas, ou
seja, a governança do processo, a própria capacidade de decidir sobre o
processo decisório. Nosso problema não é econômico, é político.
Para onde migrou o poder? Essencialmente para os grandes
grupos de intermediação financeira. Como escreve Joseph Stiglitz na sua
proposta de “reescrever as regras”, “conforme a desigualdade aumenta, o
sistema político se torna crescentemente atropelado (over-run) pelos
interesses corporativos, e as políticas públicas requeridas para
assegurar uma real igualdade de oportunidades tornam-se cada vez mais
difíceis de implementar”.1 Ou seja, o problema não é político no sentido
de que apenas elegemos a pessoa ou o partido errados, mas no sentido de
que o processo decisório se tornou disfuncional.
Temos uma economia globalizada e uma política fragmentada
em duzentos governos nacionais. Temos tecnologias impressionantes e um
sistema de patentes, copyrights e royalties que trava o acesso ou as
torna inoperantes. Temos, em particular, um sistema financeiro global,
as famosas Sifis (Systemically Important Financial Institutions), que
não prestam mais contas a ninguém. E manejam o acesso aos recursos
necessários para viabilizar as novas políticas ambientais e sociais, e
para financiar, inclusive, as atividades produtivas.
Esse último aspecto é essencial. O sistema financeiro não
só trava as iniciativas necessárias para assegurar os equilíbrios
ambientais e sociais, como também drena os recursos das empresas
efetivamente produtoras de bens e serviços que geram empregos. A revista
The Economist, na sua edição prospectiva para 2017, constata que “a
taxa de distribuição dos dividendos subiu de menos de 40% em 2011 para
mais de 70% em 2016. Em consequência, não é surpreendente neste contexto
que a parte do investimento industrial relativa ao PIB tenha continuado
a se reduzir. As empresas buscam transferir os fundos para seus
acionistas em vez de reinvesti-los em suas operações. Assim, não é a
liquidez que faz falta para investir. Estima-se que as empresas
entesouraram mais de US$ 7 trilhões em liquidez no mundo – uma forma de
inércia que vai se perpetuar em 2017 e para além”.2 Em outros termos: o
capital financeiro drena o produtivo. Generaliza-se o capitalismo
improdutivo no planeta. O rentismo não é só brasileiro. Voltamos ao
século retrasado, em que as “famílias de bem” viviam de rendas.
Como passamos de um capitalismo em que a remuneração e a
fortuna mantinham certa proporcionalidade com a contribuição produtiva
para o presente sistema, que, em vez de remunerar produtores, remunera
rentistas? Em poucas décadas, essencialmente desde os anos 1980, a parte
dos intermediários financeiros no lucro corporativo norte-americano
subiu de 10% para 42%. Epstein e Montecino, do Roosevelt Institute,
fizeram as contas e constataram que o sistema financeiro, no seu
conjunto, hoje mais drena a economia em vez de financiar suas
atividades. Ou seja, não é apenas improdutivo; ele tem uma contribuição
líquida negativa para a economia.
“Um sistema financeiro saudável é aquele que canaliza
recursos financeiros para investimento produtivo; ajuda as famílias a
poupar para poder financiar grandes despesas, como educação superior e
aposentadorias; fornece produtos como seguros para ajudar a reduzir
riscos; cria suficiente quantidade de liquidez útil; gera um mecanismo
eficiente de pagamentos e inovações financeiras para fazer todas essas
coisas úteis de forma mais barata e efetiva. Todas essas funções são
cruciais para uma economia de mercado estável e produtiva. Mas, depois
de décadas de desregulação, o sistema financeiro atual dos Estados
Unidos tornou-se altamente especulativo, falhando de maneira bastante
espetacular em realizar essas tarefas críticas.”
3. O conceito de custo líquido do sistema financeiro é muito
útil, pois envolve a questão da produtividade sistêmica das finanças de
um país. Para o Brasil, considerando os custos da crise iniciada em
2013, da qual o sistema financeiro foi a causa principal, poderíamos
igualmente calcular o custo sistêmico. No caso norte-americano, os
autores consideram que “precisamos incorporar os custos das crises
financeiras associadas com a especulação excessiva e as atividades
econômicas destrutivas, que são agora bem compreendidas, no sentido de
terem sido essenciais na crise econômica recente”.
O capitalismo financeiro atual mudou as regras do jogo e
deslocou o centro do poder. O fato de bancos e economistas do mercado
utilizarem o conceito de “investimento” tanto para compra de papéis
financeiros como para investimento produtivo dificulta a compreensão. Em
inglês se distingue claramente o mecanismo produtivo que gera a renda
(income) e a aplicação financeira improdutiva que gera “renta” (rent).
Em francês é igualmente clara a diferença de revenu e rente,
respectivamente. De forma mais explícita, na literatura inglesa
utiliza-se o conceito de unearned income, rendimento auferido não por
contribuição produtiva, mas por apropriação do trabalho dos outros.
Muitos (como Michael Hudson) já utilizam o conceito de capitalismo
parasitário. A diferença é que nos Estados Unidos se reconhece o papel
dos bancos na crise de 2008 e no marasmo que continua, enquanto aqui se
atribui a crise atual ao ridículo déficit fiscal, de menos de 2% do PIB.
Qualquer que seja o nome, vale a pena ver como essa
deformação se manifesta no Brasil e como travou a economia. Em termos
resumidos, a economia, para funcionar, depende de quatro motores: as
exportações, a demanda das famílias, o investimento e a produção
empresariais, e o investimento público em infraestruturas e políticas
sociais.
No Brasil, as exportações não constituem nem de longe o
principal motor. Os cerca de US$ 185 bilhões de exportações,
representando como ordem de grandeza R$ 600 bilhões, mal chegam a 10% do
PIB. Não somos como alguns países asiáticos onde o motor do comércio
externo é essencial. Com uma população de 204 milhões habitantes e um
PIB de R$ 6 trilhões, somos uma economia vinculada ao mercado interno.
Se as dinâmicas internas não funcionam, o setor externo pouco poderá
resolver. E, na fase atual de marasmo mundial, o setor externo não é
alternativa.
A dinâmica principal tem de vir da demanda das famílias e
das atividades empresariais. Aqui, o volume de recursos extraídos da
economia por meio dos juros é absolutamente escandaloso e sem paralelo
no mundo. Segundo o Banco Central, em janeiro de 2017 o montante de
crédito em mãos de pessoas físicas e de pessoas jurídicas, ou seja, o
estoque de dívidas das famílias e das empresas, era de R$ 3,1 trilhões, o
que representa uma relação crédito sobre PIB de 48,7%. O montante da
dívida não é particularmente elevado em comparação com outros países
onde frequentemente ultrapassa os 100% do PIB.
O escândalo está nos
juros.
Fazendo a média entre os diversos tipos de crédito, o
Banco Central apresenta o juro médio de 32,8%. Ou seja, o juro extraído
do estoque de R$ 3,1 trilhões de dívida é de R$ 1 trilhão por ano.
Trata-se do montante que famílias e empresas pagam aos intermediários
financeiros e que deixa de se transformar em consumo das famílias ou em
investimento pelo setor privado da economia. Isso representa 16% do PIB,
valor apropriado pelo próprio sistema de intermediação financeira. Os
32,8% que cobra o sistema financeiro no Brasil podem ser comparados com a
zona do euro, onde os juros se situam essencialmente entre 2% e 4% ao
ano. Reitero: ao ano. E os bancos na Europa vão bem, obrigado.
Particularmente importante são os cerca de R$ 800 bilhões que as
famílias utilizaram de crédito livre em 2016, tipicamente para compras a
prazo, pagando juros de 73%: são R$ 500 bilhões de capacidade de compra
imobilizados em juros, 8,3% do PIB que passam para os intermediários
financeiros em vez de serem utilizados para compras. Estranguladas pelos
juros, as famílias não só param de comprar, mas também utilizam a
liberação do FGTS para pagar juros, mais recursos apropriados por
intermediários financeiros.
O dreno sobre a capacidade de compra das famílias tem
efeito direto sobre as empresas, que não têm para quem vender. O
resultado é um efeito em cadeia: diminuem a produção, cortam
investimentos, reduzem o emprego, o que encurta ainda mais a demanda das
famílias. Além disso, como as empresas, no crédito livre, pagam 29% de
juros (ordem de grandeza de 2% ao ano na Europa), elas não têm como
recorrer aos bancos para atravessar a crise. E finalmente têm a opção de
deixar de lado a produção de bens e serviços para colocar seu dinheiro
em títulos da dívida pública, que rendem ao mês o que no resto do mundo
rendem ao ano. As atividades empresariais produtoras de bens e serviços
entram em crise de vez.
4
O quarto motor da economia, o investimento público em
infraestruturas e em políticas sociais, foi igualmente travado pelos
elevados juros (Selic) sobre a dívida pública. Em 2015 foram R$ 400
bilhões pagos em juros, 7% do PIB, montante que poderia ter se
transformado em dinamização da economia, mas foi apropriado
essencialmente por intermediários financeiros. Somando os 16% tirados
das famílias e das empresas e os 7% tirados dos nossos impostos, temos
um dreno de 23%. Que parte disso volta para a economia real? Não temos
esse número aqui. Nos Estados Unidos, a estimativa é que o dinheiro
passa a rodar essencialmente na ciranda financeira, porque as aplicações
financeiras rendem mais do que os investimentos produtivos. O sistema
fica sistemicamente disfuncional.
Viva o rentismo.
O prego no caixão vem do sistema tributário. No Brasil,
56% dos tributos consistem em impostos indiretos, embutidos nos
produtos, o que significa que a progressividade dos impostos é
liquidada. Somadas a fragilidade do imposto sobre lucros e dividendos, a
evasão de impostos, que atingiu R$ 571 bilhões em 2015, e a sólida
presença brasileira em paraísos fiscais, temos um estoque acumulado de
US$ 520 bilhões, segundo o Tax Justice Network. A conclusão é óbvia: o
sistema está travado não pelo ridículo déficit gerado pelas políticas
públicas, e sim pelo conjunto de drenos que o sistema financeiro gerou
no país.
5 Bem-vindo ao capitalismo improdutivo.
*Ladislau Dowbor é doutor em Ciências Econômicas pela
Escola Central de Planejamento e Estatística de Varsóvia, Polônia, e
professor titular da PUC-SP.
{Le Monde Diplomatique Brasil – edição 118 – maio de 2017}
1 Joseph Stiglitz, Rewriting the Rules of the American
Economy. An Agenda for Growth and Shared Prosperity [Reescrevendo as
regras da economia norte-americana. Uma agenda para crescimento e
prosperidade compartilhada], Nova York, 2016, p.178.
2 The Economist, edição francesa, “Le monde en 2017”, p.51.
3 Gerald Epstein e Juan Antonio Montecino, Overcharged:
the high cost of high finance [Sobrecarregado: o alto custo da alta
finança], The Roosevelt Institute, jul. 2016, p.1 e 16. Disponível em:
<http://rooseveltinstitute.org/overcharged-high-cost-high-finance/>.
4 Os dados detalhados e a tabela original do Banco Central
podem ser encontrados em
<http://dowbor.org/2017/03/o-escandalo-dos-juros.html/>; ver
também a manchete da edição dominical de O Estado de S. Paulo de 18 de
dezembro de 2016: “Crise de crédito tira R$ 1 trilhão da economia e
piora recessão”.
5 Sindicato Nacional dos Procuradores da Fazenda Nacional
(Sinprofaz), Sonegação no Brasil. Uma estimativa do desvio da
arrecadação do exercício de 2016, Brasília, mar. 2017, p.27.
quarta-feira, 31 de maio de 2017
NEOLIBERALISMO, projeto político

David Harvey provoca: cada fase do capitalismo gera uma forma de resistência que a espelha. Por isso, distintas gerações da esquerda não deveriam se estranhar
Fonte - blog OutrasPalavras
Entrevista a por Bjarke Skærlund Risager, na Jacobin | Tradução: Inês Castilho
Autor de numerosas outras obras, o geógrafo britânico David Harvey publicou em 2005 o livro Uma Breve História do Neoliberalismo
[1], que marcou época pela análise desse novo modo de dominação
capitalista. A entrevista que reproduzimos aqui foi realizada pela Jacobin.
Um excerto de sua Breve História do Neoliberalismo, portanto do Estado neoliberal, pode ser lido em Contretemps. Podemos igualmente consultar este artigo [em francês] de Razmi Keucheyan, que lembra a trajetória e originalidade intelectual do geógrafo marxista estadunidense.
Neoliberalismo é um termo maciçamente utilizado em nossos
dias. Mas aquilo que as pessoas projetam nele é bastante turvo. Em seu
uso mais sistemático, ele se refere a uma teoria, uma paleta de ideias,
uma estratégia política ou um período histórico. Você poderia começar
dando sua interpretação de neoliberalismo?
Sempre disse que o neoliberalismo era um projeto político lançado
pela classe capitalista quando ela se sentiu muito ameaçada, política e
economicamente, do fim dos anos 1960 até os anos 1970. Eles queriam
desesperadamente apresentar um projeto político que reduzisse a força da
classe operária.
A classe capitalista ficou então verdadeiramente com medo e se
perguntou o que fazer. Ela não era onisciente, mas sabia que havia um
certo número de frentes nas quais devia lutar: o front ideológico, o
front político e acima de tudo a necessidade de reduzir por todos os
meios possíveis o poder da classe trabalhadora. É a partir de lá que
emergiu o projeto político que chamarei de neoliberalismo.
Poderia nos dizer um pouco mais a propósito dos fronts político e ideológico, assim como os ataques contra o mundo do trabalho?
No front ideológico, isso consistia em seguir o conselho de um cara
chamado Lewis Powell, que havia escrito um memorando dizendo que as
coisas haviam ido longe demais e que o capital precisava de um projeto
coletivo. Essa nota ajudou a mobilizar a Câmara de Comércio e a Távola
Redonda dos negócios. As idéias tinham então sua importância. Essa gente
pensava que era impossível organizar as universidades porque elas eram
muito progressistas; e o movimento estudantil, forte demais. De repente,
eles montaram todos esses grupos de reflexão, think tanks como o
Instituto Manhattan, as fundações Ohlin ou Heritage. Esses grupos
levaram adiante as idéias de Friedrich Hayek, de Milton Friedman e da
economia da oferta.
O plano era que esses think tanks fizessem pesquisas sérias […] que
seriam publicadas de maneira independente, influenciariam a imprensa e
fariam pouco a pouco o cerco das universidades. Esse processo tomou um
tempo. Penso que eles estão agora num ponto em que não têm mais
necessidade de coisas como a fundação Heritage. As universidades foram
amplamente penetradas pelos projetos neoliberais que as cercam.
No que diz respeito ao trabalho, o desafio consistia em tornar
competitivo o custo do trabalho local em relação ao custo do trabalho
globalizado. Uma solução teria sido demandar mão de obra imigrante. Nos
anos 1960, por exemplo, os alemães apelaram aos turcos, os franceses aos
magrebinos e os ingleses aos trabalhadores originários de suas antigas
colônias. Mas isso havia criado muito descontentamento e agitação
social.
Desta vez, os capitalistas escolheram outra via: exportar o capital
de onde havia uma força de trabalho mais cara. Mas para que a
globalização funcionasse, era preciso reduzir as tarifas e reforçar o
capital financeiro, pois esta é a forma de capital mais móvel. O capital
financeiro e o fato de tornar as moedas flutuantes tornaram-se
essenciais para conter a classe operária. Ao mesmo tempo, os projetos de
privatização e de desregulação criaram desemprego. Portanto, desemprego
no interior do país e deslocalizações para fora, assim como um terceiro
componente, as mudanças tecnológicas, a desindustrialização por meio da
automação e da robotização. Esta foi a estratégia para triturar a
classe operária.
Depois da publicação, em 2005, da Breve história do neoliberalismo,
muito foi escrito sobre esse conceito. Parece haver principalmente dois
campos: os pesquisadores que estão mais interessados na história
intelectual do neoliberalismo e as pessoas que são sobretudo preocupadas
com o “neoliberalismo realmente existente”. Onde você se situa?
Existe uma tendência nas ciências sociais, à qual eu tento resistir,
que consiste em procurar uma fórmula mágica para explicar um fenômeno.
Há assim uma série de pessoas dizendo que o neoliberalismo é uma
ideologia e que escrevem uma história idealizada sobre ela. Um exemplo é
o conceito de Foucault de “governabilidade” [designando uma presumível
racionalidade própria à função de governar – nota do tradutor] que vê
tendências neoliberais já presentes no século XVIII. Mas se vocês tomam o
neoliberalismo unicamente como uma ideia ou um pacote de práticas
limitadas de “governabilidade”, encontrarão numerosos precursores.
O que falta aqui é a maneira como a classe capitalista desenvolveu
seus esforços durante os anos 1970 e o início dos anos 1980. Penso que é
justo dizer que nessa época, ao menos no mundo anglo-saxão, ela se
unificou de modo suficiente. Os capitalistas se colocaram de acordo
sobre muitas coisas, como a necessidade de forças políticas que
realmente os representem.
Esse período caracteriza-se por uma grande ofensiva em várias
frentes, ideológicas e políticas, e a única maneira de explicá-la é
reconhecer o alto nível de solidariedade da classe capitalista. O
capital reorganizou seu poder numa tentativa desesperada de reencontrar
sua prosperidade econômica e sua influência, que havia sido seriamente
enfraquecido do fim dos anos 1960 até os anos 1970.
Houve várias crises desde 2007. Como o conceito e a história do neoliberalismo podem nos ajudar a compreendê-las?
Houve muito poucas crises econômicas entre 1945 e 1973. Nesse
período, atravessamos problemas sérios mas não grandes crises. A virada
para as políticas neoliberais operou-se no decorrer dos anos 1970 no
quadro de uma crise severa, e todo o sistema sofreu depois uma série de
outras crise. Bem entendido, estas produzem, a cada vez, todas as
condições para crises futuras.
Entre 1982 e 1985, houve também a crise da dívida no México, no
Brasil, no Equador e, no fundo, de todos os países em desenvolvimento,
inclusive a Polônia. Em 1987-1988, vimos nos Estados Unidos uma grande
crise de empresas de poupança e empréstimo; depois uma enorme crise em
1990 na Suécia, onde todos os bancos tiveram de ser nacionalizados; e
por certo a Indonésia e o Sudeste asiático em 1997-1998, antes que a
crise se espalhasse para a Rússia e depois para o Brasil e a Argentina
em 2001-2002. Houve enfim problemas nos Estados Unidos em 2001, que
foram tirando dinheiro na Bolsa de Valores para injetar no mercado
imobiliário. Em 2007-2008, o mercado imobiliário implodiu, e isso foi
uma grande crise. Você pode olhar um mapa do mundo e visualizar as
crises percorrendo o planeta.
O conceito de neoliberalismo é útil para compreender esses fenômenos.
Uma das grandes mudanças do neoliberalismo, em 1982, foi livrar o Banco
Mundial e o FMI todos seus keynesianos. Eles foram substituídos por
teóricos neoclássicos da oferta e a primeira coisa que estes decidiram é
que doravante o FMI seguiria, em face de todas as crises, uma política
de ajuste estrutural.
Em 1982, o México viveu uma crise da dívida. O FMI disse “nós vamos
salvá-los”. De fato, eles salvaram os bancos de investimento
novaiorquinos e impuseram políticas de austeridade. Como resultado das
políticas de ajuste estrutural do FMI, a população mexicana sofreu uma
perda de poder de compra da ordem de 25% nos quatro anos que se seguiram
a 1982. Depois, o México sofreu quatro outros ajustes estruturais.
Numerosos países conheceram mais de um. Essa prática tornou-se clássica.
O que fazem hoje na Grécia? É quase uma cópia do que fizeram no
México em 1982. E é também o que se passou nos Estados Unidos em
2007-2008. Eles resgataram os bancos e fizeram a população pagar a conta
através das políticas de austeridade.
Haverá qualquer coisa, nas crises recentes e no modo como
elas foram geradas pelas classes dirigentes, que o faria hoje rever sua
teoria do neoliberalismo?
Bem, não creio que a solidariedade da classe capitalista seja hoje o
que era então. Em nível geopolítico, os Estados Unidos não estão mais na
posição de conduzir a dança como faziam nos anos 1970.
Penso que assistimos a uma regionalização das estruturas globais de
poder no seio do sistema dos Estados, com hegemonias regionais como a da
Alemanha na Europa, do Brasil na América Latina ou da China no Leste da
Ásia. Evidentemente, os Estados Unidos conservam uma posição dominante,
mas os tempos mudaram. Trump pode comparecer ao G20 e dizer “devemos
fazer isso”, e Angela Merkel lhe responder “não o faremos”, o que era
inimaginável nos anos 1970. A situação geopolítica está, portanto,
regionalizada, e há mais autonomia. Penso que é em parte um resultado do
fim da guerra fria. Países como a Alemanha não dependem mais da
proteção dos Estados Unidos.
Aliás, isso que chamamos “a nova classe capitalista” de Bill Gates,
da Amazon e do Vale do Silício têm uma política que difere da dos
gigantes tradicionais do petróleo e da energia. O resultado é que cada
um tenta seguir seu próprio caminho, o que leva a conflitos entre por
exemplo a energia e as finanças, a energia e o Vale do Silício etc.
Existem sérias divergências sobre temas tais como as mudanças
climáticas, por exemplo.
Um outro aspecto que me parece crucial é que o impulso neoliberal dos
anos 1970 não foi imposto sem fortes resistências. Houve importantes
reações da classe trabalhadora, dos partidos comunistas na Europa etc.
Mas eu diria que ao final dos anos 1980 a batalha havia sido perdida. E
como a classe trabalhadora não tem mais o poder de que dispunha àquela
época, a solidariedade no seio da classe dirigente não é mais também
necessária. Não há mais uma séria ameaça vindo de baixo. A classe
dirigente se vira muito bem e não tem muita coisa a mudar.
Se a classe capitalista se arranja bem, em contrapartida o
capitalismo vai bastante mal. As taxas de lucro se recuperaram, mas as
taxas de reinvestimento são extremamente baixas. Por isso, um monte de
dinheiro não retorna para a produção mas é dedicado à conquista de
terras ou à compra de ativos.
Falemos um pouco mais das resistências. Em seu trabalho, você
insiste no fato, aparentemente paradoxal, de que a ofensiva neoliberal
se desenvolveu paralelamente a um declínio na luta de classes, pelo
menos no Norte, em favor de “novos movimentos sociais” pela liberdade
individual. Poderia explicar como o neoliberalismo gerou certas formas
de resistência?
Aqui está uma questão a meditar: o que faz com que cada modo de
produção dominante, com sua configuração politica particular, crie um
modo de oposição que se constitui em seu reflexo? À época da organização
fordista da produção, o reflexo era um movimento sindical centralizado e
partidos políticos baseados no centralismo democrático. À época
neoliberal, a organização da produção para uma acumulação flexível
produziu uma esquerda que é também, na verdade, seu reflexo: trabalho em
redes decentralizadas, não hierarquizados. Penso que é muito
interessante. E até certo ponto, o reflexo do espelho valida o que
tentava destruir. O movimento sindical, assim, sustentou o fordismo.
Penso que neste momento muita gente à esquerda, sendo muitos
autônomos e anarquistas, reforçam na verdade o neoliberalismo em seu
jogo final. Muita gente de esquerda não quer saber dessa afirmação. Mas a
pergunta que se coloca é, evidentemente: haverá um meio de se organizar
que não seja no espelho do neoliberalismo? Podemos quebrar esse espelho
e organizar qualquer outra coisa, que não jogue o jogo do
neoliberalismo?
A resistência ao neoliberalismo pode assumir diversas formas. No meu
trabalho, ressalto o fato de que o lugar de realização do valor é também
um ponto de tensão. O valor é produzido no processo do trabalho, e é um aspecto muito importante da luta de classes. Mas o valor se realiza no mercado através da venda,
e uma boa parte da política tem aí seu lugar. Uma grande parte da
resistência à acumulação do capital se exprime não somente no lugar de
produção, mas também através do consumo, na esfera da realização do
valor.
Tome a indústria de automóveis: grandes fábricas podiam antes
empregar cerca de 25 mil pessoas, e hoje empregam 5 mil porque a
tecnologia reduziu a necessidade de trabalhadores. O trabalho
encontra-se assim cada vez mais deslocado da esfera da produção para a
esfera da vida na cidade. O principal centro de insatisfação, no quadro
das dinâmicas capitalistas, desloca-se para a esfera de realização do
valor, para as políticas que têm impacto na vida cotidiana na cidade. Os
trabalhadores evidentemente preocupam-se com um monte de coisas. Se nos
encontramos em Shenzhen, na China, as lutas no quadro do processo de
trabalho são dominantes. E nos Estados Unidos teríamos apoiado a greve
de Verizon [2] por exemplo.
Mas em vários pontos, o que domina são as lutas em torno da qualidade
da vida cotidiana. Vejam as grandes lutas dos dez a quinze últimos
anos. Um conflito como o do Parque Gezi, em Istambul, não foi uma luta
trabalhista. O descontentamento tinha a ver com a política cotidiana, a
falta de democracia e o modo de tomar decisões. Nos levantes ocorridos
das cidades brasileiras, em 2013, foram também os problemas da vida
cotidiana os detonadores: os transportes e as despesas suntuosas para a
construção de grandes estádios em detrimento de escolas, hospitais e
moradias acessíveis. Os levantes a que assistimos em Londres, em Paris
ou em Estocolmo não estavam ligados ao processo de trabalho, mas à vida
cotidiana.
Nesse terreno, a política é muito diferente daquela que é
implementada no local de produção. Na produção, o conflito opõe
claramente o capital ao trabalho. As lutas pela qualidade de vida são
menos claras em termos de configuração de classe. As políticas
claramente de classe, que procedem em geral de uma compreensão do
processo de produção, tornam-se teoricamente mais vagas à medida que se
tornam mais concretas. Elas expressam uma disputa entre classes, mas não
no sentido convencional.
Você acha que se fala demais de neoliberalismo e não o
suficiente de capitalismo? Quando é mais apropriado usar um ou outro
desses termos, e quais são os riscos de confundi-las?
Muitos liberais clássicos dizem que o neoliberalismo foi longe demais
em termos de desigualdade de renda, que todas essas privatizações foram
longe demais e que há numerosos bens comuns a proteger, como o meio
ambiente. Há também modos de falar do capitalismo, como quando falamos
de uma economia de partilha, que na verdade acaba por ser extremamente
capitalista e exploradora.
Há a noção de capitalismo ético, que significa apenas ser
razoavelmente honesto ao invés de roubar. Algumas pessoas pensam que é
possível uma reforma da ordem neoliberal em direção a uma outra forma de
capitalismo. Penso que talvez haja uma forma de capitalismo melhor que
essa que existe hoje – mas não tão melhor. Os problemas fundamentais
tornaram-se agora tão profundos que, sem um vasto movimento
anticapitalista, será de fato impossível chegar até eles. Gostaria então
de colocar as questões atuais em termos de anticapitalismo, em vez de
antineoliberalismo. E quando ouço as pessoas falarem sobre
neoliberalismo, me parece que o perigo é acreditar que não é o próprio
capitalismo, de uma forma ou de outra, que está em questão.
[1] Publicado pela Oxford University Press. https://www.amazon.com.br/Brief-History-Neoliberalism-David-Harvey/dp/0199283273
[2] Sete semanas de greve nessa gigante das telecomunicações possibilitaram obter 10,5% de aumento de salários em três anos para 36 mil assalariados e a contratação de 1.400 pessoas até 2019.
David Harvey
David Harvey é professor inglês de
geografia e antropologia na Universidade da Cidade de Nova York (CUNY).
Um dos estudiosos mais importantes da área de ciências humanas, autor de
diversos livros sobre o desenvolvimento da geografia moderna, retoma o
marxismo e o conceito de classes sociais como crítica ao capitalismo
global. Foi um dos principais formadores do conceito de direito à
cidade. Veja seus livros em nossa livraria.
sexta-feira, 26 de maio de 2017
segunda-feira, 15 de maio de 2017
Por que trabalharemos até morrer?
REFORMA DA PREVIDÊNCIA
Devido às características do
mercado de trabalho brasileiro, a capacidade de contribuição dos
trabalhadores é bastante limitada. Consideremos apenas o alto nível de
informalidade, a rotatividade elevada e a baixa remuneração. Isso
implica que, ao chegar aos 65 anos, parte das pessoas não terá atingido
os 25 anos de contribuição exigidos e não poderá se aposentar
"Como se a única alternativa para o nosso envelhecimento fosse trabalhar mais. Como se o prolongamento das nossas vidas não fosse algo a se comemorar, mas um fardo insustentável que temos que pagar... "
"Como se a única alternativa para o nosso envelhecimento fosse trabalhar mais. Como se o prolongamento das nossas vidas não fosse algo a se comemorar, mas um fardo insustentável que temos que pagar... "

Fica cada vez mais claro para todos que as reformas trabalhista e
previdenciária propostas pelo governo Temer se apoiam em justificativas
rasas, numa estratégia midiática agressiva e numa violência policial
desmedida e antidemocrática.
A postura do governo é consequência de um fato evidente: não há
nenhum apoio social às reformas. Nem ao governo. Num país que tenta
entender e lidar com a recente polarização na superfície da esfera
político-partidária, pesquisas de diversos vieses mostram importantes
pontos de convergência. Coxinhas, mortadelas e outros quitutes do nosso
variado espectro político-gastronômico ampliam cada dia mais a rejeição a Temer.
As pesquisas indicam ainda que o tema da Previdência, juntamente com a
corrupção, tem sido determinante no aumento da rejeição ao governo.
É nítido, também, que o governo intensifica a sua estratégia midiática para propagar o slogan falso e ameaçador de que é preciso reformar a Previdência hoje para que ela não acabe no futuro. E faz isso abandonando abertamente qualquer tipo de pudor e recheando o noticiário de absurdos éticos,
como encontros casuais no cabeleireiro com empresários da comunicação,
intermediação de amigos comuns para decidir sobre questões de interesse
público, jantares opulentos para conquistar apoio e outros expedientes.
Lembremos ainda da crescente verba pública destinada à publicidade, as
amigáveis entrevistas dadas por ministros em programas de TV e a
cobertura pasteurizada e parcial das notícias relativas à reforma.
É claro, também, como toda e qualquer forma de resistência vem sendo
sistematicamente repreendida pelas forças policiais de todo o país. Os
episódios ocorridos durante a greve geral do dia 28 de abril são apenas
amostras do papel que a polícia tem desempenhado – desde muito antes do golpeachment, é sempre necessário lembrar – na contenção da resistência às reformas impopulares.
No Rio de Janeiro, por exemplo, a polícia iniciou a agressão aos manifestantes antes mesmo que o ato tivesse início. Em Goiânia, um policial quebrou um cassetete no rosto de um cidadão durante a manifestação. Dias antes, Rafael Braga foi condenado a onze anos de prisão por uma acusação forjada.
Esses episódios são lembretes pontuais de que a violência e o racismo
da polícia e do judiciário não são casos isolados que podem ser
resolvidos apenas administrativamente, pelo “afastamento dos
envolvidos”, pela “abertura de inquérito”, pela “apuração dos fatos” ou
por outras declarações de boa intenção por parte dessas instituições.
Enquanto isso, um economista influente
reduz a complexa reforma trabalhista a uma trivialidade qualquer,
desdenha do “esperneio” da maioria da população, ao mesmo tempo que
elogia a restrição do debate público ao uso de gás lacrimogêneo.
A postura do governo demonstra que não há espaço aberto para debater
questões relativas aos direitos sociais que estão sendo retirados da
população. Apesar das justificativas rasas apresentadas na propaganda, a
reforma se apoia em argumentos meramente orçamentários. A questão
parece reduzir-se à ideia de que a Previdência é um luxo que o Brasil
não pode mais pagar. Isso se soma à ideia de que os cortes de gastos
sociais serão suficientes para reverter a crise que o Brasil enfrenta.
O debate dentro da ordem
Independentemente das sofisticadas teorias econômicas que elaboram e
divergem sobre a política econômica, o gasto público e o ciclo atual
vivido pelo país, chama a atenção a má qualidade do material apresentado
pelo governo para defender a reforma previdenciária. Veja-se, por
exemplo, as projeções grosseiras feitas pelo governo para 2060, que foi
analisada e contraposta por um estudo recente.
Os propositores da reforma apoiam-se no senso comum a respeito do
tema. Na percepção geral e entre quem estuda o tema, há grande consenso
de que a Previdência precisa ser reformada. As políticas públicas são
formuladas em contextos históricos específicos e podem deixar de
responder às transformações sociais posteriores.
Por essa razão, muitos países do mundo estão rediscutindo seus
regimes previdenciários para dar respostas a questões como a
desigualdade entre beneficiários, o envelhecimento populacional, o
aumento da expectativa de vida e as mudanças no mercado de trabalho.
Mas reformar a Previdência não implica necessariamente reduzir
direitos. Se houver o interesse em mantê-los, é preciso pensar em como
garanti-los na prática: não apenas definindo suas regras de acesso, mas
também sua estrutura de financiamento. A sociedade deve decidir quem é
que paga a conta.
Mais do que isso, para nós, coloca-se o desafio de pensar num sistema
adequado à realidade brasileira. Não apenas copiando parâmetros e
tendências de outros países, mas considerando nossas desigualdades
sociais e regionais, a realidade do nosso mercado de trabalho, nossa
estrutura tributária, entre outros elementos. No contexto atual, isso
passa por contrapor os argumentos do governo sobre esses temas, como tem
sido o esforço de muitos especialistas.
O governo, ainda que ilegítimo, optou por cumprir os ritos formais da
nossa democracia representativa no encaminhamento da reforma. Note-se,
por exemplo, a realização de audiências públicas sobre o tema, em que
importantes contrapontos e denúncias foram apresentados. Como era previsível, esta fase encerrou-se com alguns recuos do governo em pontos marginais da proposta, sem que o essencial fosse revertido.
Assim conclui-se formalmente a participação direta da sociedade nas
mudanças, deixando claros os limites da ordem estabelecida. A partir de
agora, o destino da reforma depende da articulação parlamentar –
amplamente favorável ao governo – e da capacidade de enfrentamento e
resistência nas ruas.
A velhice que nos espera
Entre as lacunas deixadas pelo material que o governo apresenta, a
que mais chama a atenção é a ausência completa de alternativas aos
direitos sociais que serão retirados. O texto demonstra a falta de
preocupação com as consequências esperadas da reforma e uma profunda
insensibilidade com a situação que grande parte da população deve
enfrentar quando envelhecer.
As mudanças propostas dificultam o acesso à aposentadoria.
Consideremos apenas as quatro principais: 1) a imposição da idade mínima
de 65 anos; 2) o aumento da carência mínima de 15 para 25 anos; 3) as
mudanças na aposentadoria rural; e 4) as mudanças no BPC.
A imposição da idade mínima de 65 anos para homens e 62 anos para mulheres extingue a Aposentadoria por Tempo de Contribuição.
Hoje, essa modalidade abrange um terço dos 30 milhões de aposentados
brasileiros. Ela afeta principalmente aquelas pessoas que conseguem, ao
longo da vida de trabalho, contribuir por 35 ou 30 anos e que hoje
conseguem se aposentar em torno dos 55 anos. Além disso, as mudanças na
regra de cálculo dos benefícios impõem um fator previdenciário que deve
reduzir ainda mais o valor dos benefícios.
Atualmente, quase 70% dos beneficiários do INSS recebe apenas um
salário mínimo. Para o governo, esses são os “privilegiados” do mercado
de trabalho brasileiro e a reforma teria o grande mérito de promover a igualdade
entre os trabalhadores, já que todos se aposentarão com a mesma idade
mínima. Num país onde as pessoas entram no mercado de trabalho, em
média, antes dos 17 anos, isso significa prolongar a vida de trabalho de
todos. Em vez de melhorar as condições dos mais prejudicados pelo
sistema, fazemos a opção de nivelar os direitos por baixo. Mas essa não é
a mudança que terá o maior impacto sobre a população idosa.
O aumento da carência mínima afeta a maior parte dos trabalhadores brasileiros, que se enquadram na modalidade de Aposentadoria por Idade,
cerca de dois terços dos aposentados hoje. Com as regras atuais, os
trabalhadores que chegarem aos 65 anos podem solicitar a aposentadoria,
desde que tenham contribuído com 180 mensalidades (15 anos) ao longo de
toda a sua vida de trabalho. O governo propõe aumentar essa exigência
para 300 mensalidades (25 anos).
Na prática, essa mudança deve impedir que um grande contingente de
pessoas se aposente. Devido às características do mercado de trabalho
brasileiro, a capacidade de contribuição dos trabalhadores é bastante
limitada. Consideremos apenas o alto nível de informalidade, a
rotatividade elevada e a baixa remuneração. Isso implica que, ao chegar
aos 65 anos, parte das pessoas não terá atingido os 25 anos de
contribuição exigidos e não poderá se aposentar.
As desigualdades, portanto, podem se manter ou se acentuar, pois
aqueles que têm uma inserção mais precária no mercado de trabalho
tenderão a prolongar sua vida de trabalho ou, eventualmente, não
conseguirão se aposentar de forma alguma. Isso significa, na prática,
dificultar o acesso ao direito de aposentar-se para uma população que
começa a trabalhar muito cedo, trabalha por muito tempo, com muita
intensidade e chegará à velhice totalmente desamparada. Se somarmos a
isso os efeitos da reforma trabalhista, as condições de acesso à
aposentadoria deverão ser ainda mais prejudicadas.
O desprezo pelos direitos sociais fica mais explícito quando se trata das mudanças propostas para a Aposentadoria Rural.
Esse direito foi inicialmente pensado para atender a um grupo grande de
trabalhadores, que executa um trabalho socialmente necessário e árduo e
que, por não ter um rendimento constante na sua atividade, tinha baixa
capacidade de contribuir nos moldes dos trabalhadores urbanos
assalariados. Por isso, sua contribuição é feita no momento da venda de
sua produção e, ao atingir a velhice, aqueles trabalhadores que
comprovarem ter trabalhado por quinze anos em atividade rural têm o
direito de solicitar uma aposentadoria no valor de um salário mínimo. A proposta do Governo
para essa modalidade é igualar as regras de acesso ao do trabalhador
urbano, exigindo contribuições mensais por longos períodos de tempo, sem
considerar a irregularidade da renda das famílias atingidas pela
mudança. Na prática, a mudança inviabiliza a aposentadoria de um grande
contingente de pessoas que atualmente trabalham nessas condições.
Por fim, aqueles que, hoje, não conseguem se aposentar, podem solicitar o Benefício de Prestação Continuada (BPC),
popularmente conhecido como LOAS, que oferece um salário mínimo para
maiores de 65 anos ou deficientes físicos cuja renda domiciliar per capita
não ultrapassa um quarto do salário mínimo. O governo propôs – e recuou
levemente – que a idade para acessar o BPC subisse para 70 anos e, além
disso, que o valor dos benefícios deixasse de acompanhar a valorização
do salário mínimo.
A seletividade e o “déficit”
O aspecto mais perverso das reformas previdenciárias talvez seja o fato de que, nos termos em que se coloca a questão, elas nunca
resolverão os problemas para os quais supostamente são realizadas. Isso
fica explícito no debate sobre o déficit da Previdência.
Desde que respeitemos a Constituição Federal, é evidente que as
contribuições e tributos que arrecadamos para financiar a seguridade são
mais do que suficientes para pagar os benefícios. Na prática, é o INSS
quem transfere recursos para que o governo gaste com outras finalidades.
Mesmo considerando os gastos previdenciários totais, que incluem
servidores públicos, fica claro que os maiores responsáveis pelo tal
“rombo” na Previdência são precisamente as categorias que não serão
afetadas por essas reformas. É preciso parar de referir-se aos
aposentados do setor público como uma grande massa homogênea de
privilegiados, uma vez que a maior parte deles é composta por pessoas
com remunerações baixas e médias: professores, enfermeiros, assistentes
sociais, policiais, escriturários em geral e outras ocupações. Esses
serão afetados pelas reformas.
Por outro lado, um grupo pequeno de funcionários de alto escalão, do
Poder Judiciário, das Forças Armadas, recebe benefícios suficientes para
pagar dezenas de salários mínimos. Além disso, conseguirão
provavelmente aposentar-se mais cedo que a maioria.
Vida que segue?
Portanto, não é possível aceitar os argumentos apresentados pelo
governo sem nenhum questionamento sobre a seletividade das reformas, à
falsa ideia de que não há alternativas de financiamento – por exemplo, o
imposto sobre grandes fortunas –, e de que o Brasil deve acompanhar os
“parâmetros internacionais”, desconsiderando a sua realidade.
Não faltam propostas e discussões sobre como a Previdência Social – e
cada um dos direitos sociais por ela garantidos – poderia ou deveria
ser. Poderíamos ainda pensar, de forma radical, em como explorar as
muitas possibilidades de combinação entre o trabalho e o tempo livre,
considerando os avanços que nos permitem produzir cada vez mais riqueza e
viver vidas cada vez mais longas.
Porém, o que está colocado nesse momento é a retração dessas
possibilidades, como se não houvesse alternativas a seguir. Como se a
única alternativa para o nosso envelhecimento fosse trabalhar mais. Como
se o prolongamento das nossas vidas não fosse algo a se comemorar, mas
um fardo insustentável que temos que pagar. Que pelo menos possamos
envelhecer resistindo de todas as formas possíveis.
*Lucas Salvador Andrietta é economista, mestre em Economia Social e de Trabalho pela Unicamp e doutorando pela mesma instituição.
Fonte - Le Monde Diplomatique Brasil
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