Foto: Rosilene Miliotti
Por
Silvana Bahia
O
que fazer com latinhas de refrigerante, sacolas plásticas, óleo de
cozinha usado e garrafas pet? Existem diversos destinos para esses
materiais depois de usados, mas na Maré, precisamente na Vila do
Pinheiro, os recicláveis podem ser trocados por livros na Livraria
Ecológica. Inaugurada em novembro de 2010, em oito meses de
funcionamento, a livraria já distribuiu mais de 90 mil livros.
Aberta
de segunda a sexta de 9h às 17h, a livraria caiu no gosto dos
moradores da Maré e de pessoas de diferentes lugares da cidade, como
contou Demésio Batista, idealizador e coordenador do projeto. "Vem
gente de toda parte da Maré, mas tem muita gente de fora também.
Vem gente de tudo quanto é lugar, Parque União, Salsa e Merengue,
Nova Holanda, Bonsucesso, Olaria, Ramos. Recentemente, um rapaz viu o
nosso blog e veio trocar livros. Ele é professor de arquitetura e
mora na Zona Sul, trouxe as latinhas e saiu daqui feliz da vida”,
disse Demésio, que há quinze anos monta bibliotecas em espaços
populares.
A
ideia de montar uma livraria surgiu do trabalho no projeto Fábrica
de Bibliotecas, que teve início no Grajaú. As bibliotecas eram
montadas, mas não havia manutenção adequada. "Montamos
bibliotecas em muitos lugares, mas uma vez abrimos uma em Vila Isabel
e, durante três meses, só 18 pessoas foram lá. Percebemos que
abrir a biblioteca por abrir não era legal”, conta Demésio.
Incentivar
à leitura foi o objetivo principal para construção da Livraria
Ecológica. A proposta é fazer com que as pessoas se aproximem dos
livros. "O projeto tem a meta de formar leitores primeiro e
depois montar a biblioteca. Aqui, futuramente, vai ser uma
biblioteca, onde as pessoas poderão ficar para ler os livros ou
levá-los. Nós pensamos: ‘se as pessoas não vão à biblioteca, a
biblioteca vai até as pessoas’”.
Depois
de trocados pelos livros, os materiais recicláveis tem destino
certo. As latinhas são vendidas e o dinheiro é usado para abastecer
o carro que busca doações em qualquer parte do Rio de Janeiro. As
garrafas pet e as sacolas plásticas são doadas para uma instituição
na Nova Brasília que as transformam em instrumentos musicais e
móveis, estimulando assim o trabalho em rede.
A
Livraria Ecológica também promove feiras de livros nas escolas
municipais, por meio da parceria com o Centro Integrado de Estudos e
Programas de Desenvolvimento Sustentável - CIEDS Bairro Educador. A
ideia é que a livraria se torne itinerante, alcançando um número
cada vez maior de pessoas. A primeira cliente da livraria foi dona
Marli Faria, moradora da Vila do Pinheiro desde que a favela existe.
Ela trabalhou durante dez anos alfabetizando alunos através de um
projeto promovido pela Igreja Católica. "Sou professora e
sempre gostei muito de ler, assim que abriu comecei a frequentar a
livraria. Acho uma iniciativa ótima, principalmente para as crianças
que abraçaram o projeto”, comentou dona Marli, que já trocou mais
de 20 livros.
Crianças
e adolescentes são os que mais trocam livros
O
público que frequenta a livraria é de todas as idades, mas, sem
dúvida, as crianças e os adolescentes são os maiores
frequentadores. Na hora da saída das escolas na Maré a livraria
fica lotada. Demésio acredita que a troca estimula e valoriza o
contato com os livros. "Se as pessoas entrassem aqui e levassem
o livro sem trocar nada não daria certo, porque elas não teriam
aquele prazer de comprar o livro. Por ser uma troca as pessoas dão
mais valor. É como se o material reciclável fosse uma moeda. Tem
criança que chega aqui com a bolsa cheia de latinhas e troca tudo”,
contou.
Logo
na inauguração do projeto, o interesse de dois adolescentes em
especial chamou a atenção de Demésio pela quantidade de livros
trocados por eles. O que o coordenador do projeto descobriu depois é
que os dois estavam montando uma pequena livraria infantil em casa,
que é aberta depois da escola, onde há inclusive rodas de leitura.
Patrícia
Valéria Guimarães, professora em duas escolas na Maré, considera
que a iniciativa contribui de forma decisiva para a formação das
crianças e jovens. "Eles correm atrás das latinhas para trocar
por livros. Inclusive os pais já comentaram que estão muito felizes
porque as crianças estão lendo mais”, comentou a professora.
Rosinaldo
Sales, morador da Maré há mais de 40 anos, descobriu a livraria
andando pela favela. Estudante do curso de Direito, disse que a
Livraria Ecológica é essencial para seus estudos. "Tem livros
aqui que custariam de 80 a 100 reais nas livrarias e aqui eu consigo
trocar por uma pet”, afirma o estudante. Os interessados em doar
para a Livraria Ecológica podem entrar em contato através dos
telefones: 8683342 / 99395332 ou pelo email ipam.mare@yahoo.com.br.
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